«Novos recursos próprios»: a quem interessam?

João Ferreira

A questão dos «novos re­cursos pró­prios» tem mar­cado a dis­cussão sobre o Quadro Fi­nan­ceiro Plu­ri­a­nual 2021-2027, que de­ter­mi­nará em termos ge­rais os pró­ximos sete or­ça­mentos anuais da UE. Do que se trata? Trata-se de pos­sí­veis novas fontes de fi­nan­ci­a­mento do or­ça­mento da UE, além das ac­tu­al­mente exis­tentes que são: as con­tri­bui­ções na­ci­o­nais de cada Es­tado-Membro (porção mai­o­ri­tária), parte das re­ceitas do IVA e grande parte das re­ceitas adu­a­neiras co­bradas na UE. As novas fontes de fi­nan­ci­a­mento podem passar por novas taxas e/​ou im­postos a aplicar sobre o sector di­gital, sobre plás­ticos, sobre tran­sa­ções fi­nan­ceiras, ou sobre li­cenças de emissão de car­bono, entre ou­tras, es­tando ge­ne­ri­ca­mente as­so­ci­adas à cri­ação de «im­postos eu­ro­peus».

As de­ci­sões en­tre­tanto to­madas sobre o «fundo de re­cu­pe­ração» vi­eram animar, ainda mais, esta dis­cussão. Porquê? Porque o fundo assim de­sig­nado será cons­ti­tuído a partir de fi­nan­ci­a­mento ob­tido pela Co­missão Eu­ro­peia nos mer­cados fi­nan­ceiros (dí­vida), que terá como ga­rantia o or­ça­mento da UE. O que for agora to­mado de em­prés­timo co­me­çará a ser pago pelo or­ça­mento da UE a partir de 2028. A con­sequência será, nessa al­tura, uma re­dução das verbas a re­ceber pelos Es­tados-Mem­bros. Isto a menos que o or­ça­mento au­mente, pelo menos, na porção cor­res­pon­dente às amor­ti­za­ções dos em­prés­timos.

Há muito que se exige um au­mento subs­tan­cial do or­ça­mento da UE, em es­pe­cial na sua com­po­nente de­di­cada à tão pro­pa­lada (mas nunca efec­ti­vada) «co­esão eco­nó­mica, so­cial e ter­ri­to­rial». Por uma razão sim­ples: estes re­cursos sempre foram in­su­fi­ci­entes para con­cre­tizar a pro­me­tida con­ver­gência eco­nó­mica e so­cial no pro­gresso, anu­lando ou mi­ti­gando os efeitos as­si­mé­tricos da in­te­gração – do mer­cado único e do euro – e a di­ver­gência que esta induz.

A questão que se co­loca é: de onde devem provir os re­cursos para re­forçar o or­ça­mento da UE? Para as­se­gurar a função re­dis­tri­bu­tiva que o or­ça­mento deve ter, a fim de pro­mover de forma efec­tiva a con­ver­gência eco­nó­mica e so­cial, ele de­verá ser cons­ti­tuído fun­da­men­tal­mente a partir de con­tri­bui­ções na­ci­o­nais, que te­nham em conta o Ren­di­mento Na­ci­onal Bruto (RNB) de cada país, ga­ran­tindo que quem mais be­ne­ficia da in­te­gração (do mer­cado único e da moeda única) con­tribui pro­por­ci­o­nal­mente mais para o or­ça­mento.

Há muito que faz sen­tido ins­taurar novas formas de ta­xação do grande ca­pital, seja no sector di­gital, seja nou­tros sec­tores. Tal po­derá acon­se­lhar al­guma forma de co­o­pe­ração entre Es­tados, desde logo para evitar e com­bater fe­nó­menos como a fuga e a elisão fis­cais. Mas os re­cursos assim ar­re­ca­dados devem cons­ti­tuir re­ceitas de cada um dos Es­tados, de acordo com o prin­cípio de que os lu­cros são ta­xados onde são ge­rados, e não re­verter para a UE. Tal be­ne­fi­ci­aria, ainda mais, os países com maior RNB, que já hoje não pagam o que de­viam pagar.

Ade­mais, a po­lí­tica fiscal toca no âmago da so­be­rania dos Es­tados. Qual­quer li­mi­tação, am­pu­tação ou trans­fe­rência de so­be­rania neste do­mínio para as ins­tân­cias su­pra­na­ci­o­nais da UE, in­cluindo pela cri­ação dos de­no­mi­nados «im­postos eu­ro­peus», dei­xaria países como Por­tugal ainda mais de­pen­dentes e vul­ne­rá­veis.




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