Onde está a UE?

Anabela Fino

Dá pelo nome de «De­cla­ração con­junta sobre a saúde da mu­lher e o re­forço da fa­mília» o do­cu­mento subs­crito por 32 dos 194 es­tados que in­te­gram a Or­ga­ni­zação Mun­dial da Saúde, mas é na ver­dade uma de­cla­ração de guerra aos di­reitos das mu­lheres e um ina­cei­tável re­tro­cesso ci­vi­li­za­ci­onal.

Os pro­mo­tores da ini­ci­a­tiva e da ce­ri­mónia de as­si­na­tura vir­tual da Ge­neva Con­sensus De­cla­ra­tion (De­cla­ração de Con­senso de Ge­nebra) foram os EUA, através dos se­cre­tá­rios de Es­tado Mike Pompeo e da Saúde, Alex Azar, que ti­veram a «honra» de ter como co­pa­tro­ci­na­dores os go­vernos do Brasil, Egipto, Hun­gria, In­do­nésia e Uganda. É um do­cu­mento his­tó­rico, dizem, por de­clarar de forma inequí­voca que «não existe o di­reito in­ter­na­ci­onal ao aborto», e pre­tendem apre­sentá-lo na As­sem­bleia Mun­dial da Saúde pre­vista para Maio de 2021.

Face a mais esta ofen­siva re­ac­ci­o­nária, ma­chista, cas­tra­dora do di­reito das mu­lheres a dispor li­vre­mente do seu pró­prio corpo e aten­ta­tória da saúde pú­blica, pro­mo­vida pela ad­mi­nis­tração Trump e um pu­nhado de países do­mi­nados pelas forças mais re­tró­gradas, cabe per­guntar onde está a re­acção da União Eu­ro­peia. Sempre tão ex­pe­dita a con­denar, cri­ticar e impor san­ções em nome dos di­reitos hu­manos quando se trata de países que ousam agir fora dos pa­râ­me­tros da Casa Branca, a UE nada diz pe­rante uma ofen­siva co­or­de­nada in­ter­na­ci­o­nal­mente, em que ex­tre­mistas ca­tó­licos e is­lâ­micos se juntam para, no seio da ONU, ten­tarem fazer re­tro­ceder os di­reitos da mu­lher e da co­mu­ni­dade LGBT em nome do «bem-estar da mu­lher», «da pre­ser­vação da vida hu­mana» e da fa­mília tra­di­ci­onal.

O es­can­da­loso si­lêncio da UE torna-a cúm­plice de Trump, mas as ma­ni­fes­ta­ções que estão a ocorrer na Po­lónia ga­rantem que as mu­lheres, essas, ja­mais se ca­larão.




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