A distribuição e a exibição digital na sala de cinema

Marta Pinho Alve

O des­gaste das có­pias ana­ló­gicas em exi­bição era acen­tuado

Na vi­ragem para o sé­culo XXI, a pro­jecção di­gital co­meçou a ser tes­tada nas salas de ci­nema. Star Wars: Epi­sódio I – A Ameaça Fan­tasma, de Ge­orge Lucas, es­treado em 1999, é fre­quen­te­mente apon­tado como o pri­meiro filme co­mer­cial a ter sido dis­tri­buído e exi­bido di­gi­tal­mente nos EUA.

Na sequência de esta e de ou­tras ex­pe­ri­ên­cias si­mi­lares, a in­dús­tria ci­ne­ma­to­grá­fica or­ga­nizou-se, em 2002, com vista à re­gu­la­men­tação da dis­tri­buição e exi­bição di­gital, cri­ando para o efeito um co­mité cons­ti­tuído pelos sete mai­ores es­tú­dios de Hollywood, de­sig­nado Di­gital Ci­nema Ini­ti­a­tives (DCI). Em 2005, foi apre­sen­tado o Di­gital Ci­nema System Spe­ci­fi­ca­tion, do­cu­mento que con­tinha as es­pe­ci­fi­ca­ções do pa­drão es­ta­be­le­cido pela DCI. O texto de­finiu, a partir da sua pri­meira versão (a que se su­ce­deram ou­tras), vá­rias es­pe­ci­fi­ca­ções téc­nicas para sete ca­te­go­rias dis­tintas: mas­te­ri­zação, com­pressão, em­pa­co­ta­mento, trans­porte, equi­pa­mentos e pro­jeção. Aí foi de­fi­nido o pa­drão 2K, a re­so­lução mí­nima para exi­bição de filmes em sala, subs­ti­tuído, pos­te­ri­or­mente, pelo 4K. Estes pa­drões foram de­pois usados para de­signar a re­so­lução de equi­pa­mentos de re­gisto.

Na­quele âm­bito, foi também criado o Di­gital Ci­nema Pac­kage (DCP), o for­mato para ar­ma­ze­na­mento e dis­tri­buição do filme di­gital na sala de ci­nema. Ela­bo­rado a partir do Di­gital Ci­nema Dis­tri­bu­tion Master (DCDM), o fi­cheiro ma­triz do filme sem com­pressão, também de­fi­nido pelo DCI, o DCP con­sistia num disco rí­gido com uma versão com­pri­mida dos fi­cheiros de imagem, som e le­gendas re­la­tivos ao filme. O seu con­teúdo apenas podia ser ace­dido de­pois de co­piado para um pro­jector ou ser­vidor e após efec­tuada a sua des­com­pressão, através de uma pas­sword ce­dida pelo dis­tri­buidor. A exi­bição do mesmo es­tava de­pen­dente de pro­jec­tores cer­ti­fi­cados pelo re­fe­rido co­mité́.

Hoje, a tran­sição da pro­jecção ana­ló­gica para a di­gital está con­su­mada.

Criar e en­viar uma cópia di­gital de um filme para uma sala de ci­nema custa apro­xi­ma­da­mente 10% do valor que era des­pen­dido, no mesmo pro­cesso, com filmes em pe­lí­cula. O des­gaste das có­pias ana­ló­gicas em exi­bição era acen­tuado, porque im­pli­cava a sua re­no­vação fre­quente, e o trans­porte ne­ces­si­tava de cui­dados es­pe­ciais, de­vido à di­mensão e fra­gi­li­dade dos ma­te­riais, pre­o­cu­pa­ções que dei­xaram de se co­locar com o di­gital. En­quanto uma cópia ana­ló­gica ne­ces­si­tava de ser subs­ti­tuída após cerca de trinta exi­bi­ções, de­vido à de­gra­dação da sua qua­li­dade, uma cópia di­gital pode ser apre­sen­tada in­con­tá­veis vezes, cor­res­pon­dendo sempre a sua qua­li­dade à do pri­meiro vi­si­o­na­mento. Quanto ao trans­porte, as có­pias di­gi­tais dos filmes para exi­bição co­me­çaram por ser en­vi­adas para as salas de ci­nema através do DCP, acon­di­ci­o­nado numa mala de pe­quenas di­men­sões, o que im­pli­cava um trans­porte mais sim­ples e menos dis­pen­dioso do que o exi­gido para trans­portar as seis ou sete latas ha­bi­tuais con­tendo a pe­lí­cula de um filme ana­ló­gico.

Pouco tempo de­pois, os filmes pas­saram a chegar às salas me­di­ante pro­cessos ainda mais sim­pli­fi­cados. O pro­ce­di­mento mais comum passa pelo ar­ma­ze­na­mento dos filmes num ser­vidor cen­tral dos dis­tri­bui­dores e o acesso aos mesmos por cada um dos pro­jec­c­tores das vá­rias salas, via sa­té­lite.

Tendo estes as­pectos em con­si­de­ração, em Ja­neiro de 2014, o es­túdio de Hollywood Pa­ra­mount Pic­tures anun­ciou o fim da dis­tri­buição em pe­lí­cula – o filme de 2013, O Lobo de Wall Street, de Martin Scor­sese, tornou-se, assim, no pri­meiro da in­dús­tria ci­ne­ma­to­grá­fica es­tado-uni­dense a ser lan­çado ex­clu­si­va­mente em di­gital. A Twen­tieth Cen­tury Fox anun­ciou, em 2012, a sua in­tenção de, a partir de 2014, não dis­tri­buir mais ne­nhum dos seus filmes em pe­lí­cula de 35 mm, à qual se se­guiram os res­tantes mega-estúdios de Hollywood.




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