Do país mais rico do mundo, no ano da graça do Senhor de 2021, chegam notícias de que há trabalhadores da multibilionária Amazon que são forçados a urinar em garrafas.
E do Alabama, onde 1100 mineiros da Warrior Met Coal cumprem hoje uma semana de greve ininterrupta contra o corte dos seus rendimentos, chega-nos o «plano de continuidade» do CEO, que responde pelo nome de Walter J. Scheller III e cujo salário anual ascende a 4 milhões de dólares, para manter a mina a funcionar durante a greve recorrendo a mercenários armados e à contratação de fura-greves.
E da fronteira com o México, chegam-nos as primeiras fotografias – ilegais, note-se – de dezenas de crianças, também elas ilegais, presas em gaiolas onde não há sequer uma cadeira. Na sede da democracia global proíbe-se a comunicação social de aceder a estes locais, onde crianças e fotografias podem ser ilegais.
E da prisão estadual de Lancaster, na democrática e liberal Califórnia, chegam-nos notícias da morte de Romaine Chip Fitzgerald, preso político há 51 anos como castigo pela sua militância revolucionária no Partido Pantera Negra.
E do Texas, para rematar porque já vai longo o rol, chega uma lei que proíbe o aborto depois das seis semanas (sem quaisquer excepções, da violação, o incesto passando pelo perigo de vida para a mulher) com as particularidades de, por um lado, criminalizar todos os que «ajudem» os médicos ou as mulheres a interromper uma gravidez, como motoristas, psicólogos ou amigos e, por outro lado, admitir que qualquer texano possa processar um médico ou uma mulher suspeitos de interromperem uma gravidez.
E da mais elementar noção de dignidade humana chega-nos a teimosa dúvida sobre se será possível aceitar qualquer lição moral dos que, no que à civilização diz respeito, com tantos meios, são capazes de tão pouco.