- Nº 2487 (2021/07/29)

Afeganistão, que perspectivas?

Opinião

A imprensa internacional está cheia de interrogações e especulações sobre o Afeganistão. 20 anos passados sobre o desencadeamento de uma brutal guerra de agressão que marcou uma nova etapa da sua estratégia agressiva, os EUA e a NATO veêm-se forçados a retirar deste país o grosso do seu poderoso dispositivo militar deixando atrás de si um tenebroso rasto de violência e crime. Centenas de milhares de mortos, Bagram e outros sinistros centros de tortura, campos de concentração com destaque para a base de Guantánamo com milhares de presos sem julgamento, violação do espaço aéreo de vários países para o transporte secreto de prisioneiros, um país destruído e rapidamente transformado no maior produtor de ópio do mundo. Nada disto deve ser esquecido, como esquecido não deve ser que Osama bin Laden e a Al-Quaeda foram uma criação dos EUA e da Arábia Saudita, do mesmo modo que o Daesh e seus sucedâneos são instrumentos da acção de desestabilização e subversão do imperialismo. Tudo isto em nome da «guerra» ao «fundamentalismo islâmico» terrorista, da «defesa dos direitos humanos» e da «democracia», do «direito e dever de ingerência humanitária».

Ao contrário do que afirmam colunistas encartados, sempre cegos perante as fraquezas e derrotas dos seus amos, não se trata simplesmente de uma opção dos EUA visando concentrar forças contra o seu alvo principal, a República Popular da China cuja evolução à data da invasão ainda suscitava no grande capital esperanças no seu afastamento do caminho do socialismo e consequente submissão ao dictat do imperialismo, o que não aconteceu, e é evidente que no processo de desinvestimento militar dos EUA há muito cálculo quanto à possibilidade de uma solução de poder no Afeganistão hostil à China. Porém o que mais importa realçar é que estamos perante mais uma importante derrota do imperialismo.

Os povos não são uma folha em branco onde o imperialismo escreve o que quer, mesmo quando, como sucede no Afeganistão, se apresentam fragmentados em diferentes etnias e susceptíveis de instrumentalização por ideologias e concepções obscurantistas e reaccionárias. Essa a lição principal independente da incerteza do que está para diante. No imediato há muita poeira no ar, é cedo para ajuizar. Mas não há dúvida de que a médio e longo prazo as forças patrióticas e progressistas acabarão por se impor. E não se diga que tomamos os desejos por realidades. Não. É o processo de evolução mundial que o ensina e na própria história do Afeganistão encontramos motivos de confiança no futuro. Desde logo num proverbial passado de invencibilidade, nomeadamente frente aos exércitos da Rússia czarista e do imperialismo britânico. Mas sobretudo porque este país já conheceu com a revolução de Abril de 1978 uma revolução popular laica e orientada para o socialismo protagonizada pelo Partido Democrático Popular do Afeganistão. Uma revolução que foi derrotada pela ingerência do imperialismo com a mobilização da pior reacção feudal mas que no curto período da sua existência realizou profundas transformações progressistas reclamadas pela sociedade, transformações que tarde ou cedo acabarão por se impor.

 

Albano Nunes