- Nº 2499 (2021/10/21)

Creches gratuitas para todas as crianças

Opinião

As crianças e as famílias em Portugal precisam urgentemente de creches gratuitas e da criação de uma rede pública de creches. É a resposta necessária num país em que faltam vagas de creche, em que os custos são muito elevados e que é o mais envelhecido da Europa, com um grave défice demográfico. É uma solução que não pode ser adiada e a que o Orçamento do Estado tem que responder.


As creches devem ter como função conjugar as necessidades essenciais dos bebés, garantindo segurança aos pais a partir do final da licença de parentalidade, mas assumindo igualmente uma função pedagógica de qualidade, com um valor intrínseco, que vise o crescimento e desenvolvimento integral das crianças, em complementaridade com o papel das famílias.

Todas as fases de crescimento de uma criança têm em Portugal uma resposta pública e gratuita, à excepção da dos 0 aos 3 anos. Para esta faixa etária, existem creches do sector social e cooperativo, privadas e algumas associadas a empresas e locais de trabalho, bem como amas da Segurança Social. As 25 creches que existiam geridas directamente pela Segurança Social foram privatizadas em 2012, pelo governo PSD-CDS.

As vagas que existem em creche, mesmo somando as de IPSS e privadas, não são suficientes para o número de crianças que existem. Mesmo considerando que nem todas famílias querem ou precisam que o seu bebé frequente uma creche logo aos quatro meses, a verdade é que existem cerca de metade das vagas em creche das que seriam necessárias.

Caso se encontre vaga, o custo é também um obstáculo. Segundo a Associação de Creches e Pequenos Estabelecimentos de Ensino Particular, a mensalidade de uma creche privada, com alimentação, ronda os 300 euros, chegando aos 400 ou 450 euros nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto.

Nas creches de IPSS, o cálculo da mensalidade é feito com base em critérios estabelecidos no plano nacional, considerando os rendimentos do agregado familiar e parte das despesas que têm. Por proposta do PCP, tem sido possível evoluir para garantir creche gratuita aos bebés das famílias de mais baixos rendimentos. Desde Setembro de 2020 que as crianças do primeiro escalão da comparticipação familiar, bem como os segundos filhos do segundo escalão, têm creche gratuita, caso estejam numa IPSS ou numa ama da Segurança Social. Em Setembro deste ano, a gratuitidade foi alargada a todos os bebés do segundo escalão, abrangendo, de acordo com o Governo, cerca de 35 mil crianças.

Num país em que a maioria dos homens e das mulheres em idade fértil gostariam de ter mais filhos do que têm, e que apontam a sua situação financeira e laboral como razões para adiar ou não cumprir esse projecto de vida, dar-lhes a segurança de que todos os bebés têm acesso a creche gratuita pode encorajar a decisão de ter um filho, ou mais filhos.

A par da garantia da gratuitidade, é necessário investir decisivamente numa rede pública de creches de acesso universal e gratuito, que garanta vaga a todas as crianças e assegure altos padrões de qualidade pedagógica. As creches não são e não podem ser o sítio onde se deixam os bebés para ir trabalhar. Com educadores e outros profissionais valorizados, as creches podem e devem ser um espaço que assegure a todas as crianças o direito a um desenvolvimento integral. É uma resposta indispensável que contribui para resolver vários problemas do país e que o Orçamento do Estado tem todas as condições para dar.

Crianças e pais com direitos,
Portugal com futuro

Para inverter a quebra demográfica e o envelhecimento do País, é necessário valorizar salários, combater a precariedade e os horários selvagens, reduzir o horário de trabalho para as 35 horas. Decidir ter filhos não pode ser factor de aumento do risco de pobreza, e é necessário que as famílias tenham tempo para viver e acompanhar as suas crianças.

É preciso garantir estabilidade na habitação, repor a universalidade dos abonos de família e valorizá-los, alargar a gratuitidade dos transportes públicos até aos 18 anos, garantir que todas as crianças têm acesso a serviços públicos de qualidade.

Estas são respostas indispensáveis a problemas centrais do País: o défice demográfico e o cumprimento dos direitos das crianças.


Margarida Botelho