- Nº 2504 (2021/11/25)

É preciso não terem vergonha!

Opinião

Para o PCP, um projecto de desenvolvimento credível e sustentado para o País deve assentar, numa época em que se desenvolvem novas tecnologias (num quadro de envelhecimento da população e de uma acentuada quebra demográfica), sobretudo no desenvolvimento e enriquecimento humano, deve apostar de forma inequívoca na educação e formação. Não foi esta a opção de sucessivos governos da política de direita.

Não é estranho, por isso, que a evolução da epidemia tenha tornado mais visíveis os problemas, alguns deles estruturais, com que a escola pública se vem confrontando há muito, nomeadamente a falta de profissionais – docentes, auxiliares de acção educativa, assistentes e outros técnicos superiores, nomeadamente psicólogos –, excesso de alunos por turma, insuficientes apoios aos alunos com necessidades educativas especiais, falta de condições de trabalho e de aprendizagem em parte das escolas e mega-agrupamentos difíceis de gerir.

Os dois últimos anos lectivos, marcados pelo confinamento e a substituição do ensino presencial pelo ensino à distância, durante períodos significativos, aprofundaram um conjunto de problemas, cujas consequências na qualidade das aprendizagens foram desastrosas, independentemente do esforço realizado por professores e alunos.

Perante esta situação, teria sido do mais elementar sentido de responsabilidade que o Governo, em conjunto com toda a comunidade educativa, elaborasse um verdadeiro plano de recuperação das aprendizagens que, entre outros elementos, integrasse a contratação dos profissionais em falta, dotasse as escolas dos meios necessários à melhoria da qualidade do ensino, reduzisse o número de alunos por turma sem a qual não é possível desenvolver o programa do ano em curso e fazer a recuperação do que ficou para trás e desse resposta a um problema que, ao longo dos últimos dois anos, foi sistematicamente evidenciado pela Escola Nacional de Saúde Pública, que é a degradação da saúde mental das crianças e jovens devido ao confinamento.

Ainda ontem, o INEM divulgou um estudo preocupante, que conclui existir um aumento de mais de 50% no número de jovens com problemas psicológicos.

Nada disto foi tido em conta. O Governo, numa atitude arrogante, apresentou com grande alarido uma espécie de plano em que desconsiderou quase tudo o que era verdadeiramente importante e reclamado pela comunidade educativa, não dotando as escolas dos meios humanos e materiais necessários. Um plano que coloca as escolas num quadro de insegurança e incerteza, a aguardarem a eventual elegibilidade de projectos elaborados para o efeito, face à disponibilidade dos fundos europeus.

Em resultado desta inoperância, temos as escolas sem os apoios prometidos, o que fará com que muitas crianças e jovens fiquem de facto para trás, aumentando desta forma as desigualdades à saída da escola que já identificamos à entrada.

Problemas graves

Um dos problemas estruturais que a curto prazo podem pôr em causa a existência de uma Escola Pública de qualidade é a falta de professores. Nos últimos anos, o PCP fez muitos alertas para o problema, mas também nesta matéria o Governo nada fez para o resolver, vindo agora com uma proposta que não vai resolver o problema de fundo e levanta muitas dúvidas quanto à qualidade futura do processo ensino/aprendizagem. Recrutar outros profissionais sem habilitação própria, não vai resolver as necessidades de cerca de 40 mil professores até final da década e muito menos será garantia de melhoria da qualidade do processo ensino/aprendizagem.

O que resolve é garantir a milhares de jovens potenciais professores uma carreira dignificada e condições de trabalho, para que façam a opção da docência, ao contrário do que acontece hoje.

Ouvir Nuno Crato, ministro da Educação do governo PSD/CDS de Passos Coelho, e Tiago BrandãoRodrigues, ministro actual, dizerem hoje que faltam professores, depois de terem negado a realidade durante anos, só pode ser interpretado como uma grande falta de vergonha.


Jorge Pires