Ferrovia: um retrocesso de 130 anos

João Pimenta Lopes

Dezembro marca o fim do Ano Europeu da Ferrovia. Um ano carregado de propaganda em torno do uso deste tipo de transporte, em nome da descarbonização, da substituição de voos de curta distância (menos de 600km) pelo comboio, do uso da ferrovia para a coesão territorial, para as ligações internacionais.

Pouco se falou das consequências de quatro pacotes ferroviários da UE com vista à liberalização do sector, associadas a décadas de políticas de desinvestimento de sucessivos governos PS e PSD na ferrovia.

Pouco se falou dos milhares de quilómetros de linhas desactivadas, dos milhares de postos de trabalho perdidos, das centenas de estações fechadas, das consequências do desmembramento da CP (em operação, infra-estrutura e manutenção), na perda de capacidade produtiva de material circulante em Portugal e de conhecimento tecnológico.

Foi para assinalar os factos que passaram ao lado da propaganda, que os deputados do PCP no Parlamento Europeu promoveram várias iniciativas em torno da ferrovia no decorrer da última semana, com destaque para a viagem de comboio entre Lisboa e Estrasburgo. Uma viagem que, face à ausência actual de ligações internacionais a partir de Portugal, levou cerca de 57 horas.

O cruzamento da fronteira com Espanha fez-se entre Elvas e Badajoz, após uma viagem de 3 horas numa automotora a diesel da década de 50 com uma velocidade média de 60 km/h. Ligação que, decorrente das imposições de Bruxelas, poderá estar comprometida em 1 de Janeiro do próximo ano, perante a obrigação de formação em espanhol nível B1, aos maquinistas portugueses para operar em Espanha, impondo constrangimentos pela via burocrática (e inseridos numa lógica harmonizadora) que nunca impediram a operação no passado.

As ligações internacionais que se perderam o ano passado (a pretexto da pandemia), a saber o Sud Express e o Lusitânia Comboio Hotel teriam permitido esta ligação a Estrasburgo numa fracção do tempo. Em rigor, o Sud Express – criado em 1887 e que chegou a ligar Lisboa-Londres – com ligação a Hendaya, teria possibilitado fazer uma ligação a Estrasburgo em pouco mais de 22h. O fim desta ligação representa um retrocesso de 130 anos, sem perspectiva temporal de reposição. O governo, empurra para lá da fronteira a responsabilidade, passando ao lado do facto do contrato de serviço público com a CP não prever um tostão para ligações internacionais – porta aberta à entrada de «marcas brancas» de grandes colossos europeus da ferrovia como a alemã DB, a francesa SNCF ou a italiana Trenitalia (os últimos dois já com projectos de operação em Espanha).

Esta é uma denúncia em forma de viagem – do desinvestimento na ferrovia dos governos nacionais e das consequências da liberalização imposta desde Bruxelas e por eles aceite.




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