1971 – Albúm Construção, de Chico Buarque

O ano che­gava ao fim e os ti­ranos bra­si­leiros ainda fa­ziam planos para dez mil anos quando o país foi aba­lado pelo ter­ra­moto mu­sical cha­mado Cons­trução. A canção que dá tí­tulo ao álbum, pun­gente e emo­ci­o­nante, é um li­belo de acu­sação à di­ta­dura mi­litar e às re­la­ções de ex­plo­ração e opressão no mundo do tra­balho na so­ci­e­dade ca­pi­ta­lista. Du­rante cerca de sete mi­nutos, num ge­nial jogo de pa­la­vras, des­creve a vida de um ope­rário da cons­trução civil, que vai morrer na con­tramão atra­pa­lhando o trá­fego, atra­pa­lhando o sá­bado. É o homem má­quina, des­car­tável, do pre­tenso mi­lagre bra­si­leiro: «Por esse pão pra comer, por esse chão pra dormir / A cer­tidão pra nascer e a concessão pra sorrir / Por me deixar res­pirar, por me deixar existir / Deus lhe pague / Pela ca­chaça de graça que a gente tem que en­golir / Pela fu­maça e des­graça que a gente tem que tossir / Pelos an­daimes pin­gentes que a gente tem que cair / Deus lhe pague». Con­si­de­rado um dos discos mais im­por­tantes da mú­sica po­pular bra­si­leira, Cons­trução marca o re­gresso de Chico Bu­arque do exílio, mais ma­duro e cons­ci­ente da re­a­li­dade do país. O disco, em que par­ti­cipam o ma­estro Tom Jobim e Vi­ní­cius de Mo­raes, in­clui ainda can­ções icó­nicas como Co­ti­diano, De­sa­lento, Aca­lanto e Samba de Orly.