As três reuniões

Ângelo Alves

EUA, NATO, UE e Grã-Bre­tanha apostam na es­ca­lada do con­flito

Quando estas li­nhas en­con­trarem o leitor es­tarão já a de­correr a ci­meira da NATO, o Con­selho Eu­ropeu e reu­nião do G7. O pre­si­dente dos EUA, Joe Biden, mar­cará pre­sença nas três reu­niões, numa clara de­mons­tração da sua in­tenção de li­derar não só a NATO e o G7, mas também uma União Eu­ro­peia cada vez mais sub­me­tida às ori­en­ta­ções e or­dens de Washington.

Este ar­tigo é re­di­gido antes da re­a­li­zação das reu­niões. Con­tudo, tendo em conta o que se co­nhece da sua pre­pa­ração e das ac­ções, de­ci­sões e de­cla­ra­ções que as pre­ce­deram, pode-se afirmar com con­si­de­rável grau de cer­teza que as pers­pec­tivas di­fi­cil­mente po­de­riam ser mais ne­ga­tivas.

É cada vez mais claro que os EUA, a NATO, a União Eu­ro­peia e a Grã-Bre­tanha, e seus ali­ados, não estão in­te­res­sados em dar uma opor­tu­ni­dade à paz e cons­truir ele­mentos que possam de­ter­minar um cessar-fogo na Ucrânia com a aber­tura de um pro­cesso de ne­go­ci­ação com vista a uma so­lução po­lí­tica da guerra na­quele país. Desde logo pela re­tó­rica in­cen­diária e pro­vo­ca­dora uti­li­zada pela ad­mi­nis­tração norte-ame­ri­cana e seus ali­ados e que, ob­jec­ti­va­mente, apenas con­tri­buem para uma ainda maior es­ca­lada de ir­ra­ci­o­na­li­dade que es­treita ca­nais di­plo­má­ticos e co­loca as re­la­ções com a Fe­de­ração Russa à beira da rup­tura com­pleta.

Mas este é apenas um dos as­pectos. Num mo­mento em que é cada vez mais ur­gente a de­ses­ca­lada, as de­ci­sões dos EUA de levar na sua mala de vi­agem à Eu­ropa mais mil mi­lhões de dó­lares de ar­ma­mento para a Ucrânia, de o Con­gresso norte-ame­ri­cano ter apro­vado uma au­to­ri­zação de des­pesa nesse mesmo sen­tido no valor de quase 14 mil mi­lhões de dó­lares até ao final do ano fiscal e de a União Eu­ro­peia ter au­men­tado em 500 mi­lhões de euros a «ajuda mi­litar» ao re­gime ucra­niano, num total de mil mi­lhões de euros, con­fi­guram, a par com o cerco eco­nó­mico, po­lí­tico, di­plo­má­tico, cul­tural e des­por­tivo, uma pe­ri­gosa es­tra­tégia de pro­longar, in­ten­si­ficar e in­ter­na­ci­o­na­lizar ainda mais a guerra, au­men­tando os riscos de um des­con­trolo da si­tu­ação.

Só o úl­timo pa­cote de trans­fe­rên­cias de ar­ma­mento dos EUA in­clui 800 sis­temas anti-aé­reos, 9000 sis­temas an­ti­tanque, sis­temas de alta pre­cisão e longo al­cance, drones, sis­temas de co­mu­ni­cação e de sa­té­lites e muitos mi­lhares de armas de com­bate. Tal facto é elu­ci­da­tivo da forma como os EUA e a NATO es­ti­veram e estão en­vol­vidos numa guerra que é cada vez mais evi­dente não se tratar «apenas» de um con­flito entre Rússia e Ucrânia.

E a prova disso é que em cima das mesas das reu­niões da NATO, do G7 e do Con­selho Eu­ropeu não es­tarão «só» a es­tra­tégia de ali­mentar a guerra e as va­ri­adas formas de ainda maior en­vol­vi­mento da NATO no con­flito. Por ali pas­sarão al­guns dos prin­ci­pais ob­jec­tivos de fundo do im­pe­ri­a­lismo, como a dis­cussão do novo con­ceito es­tra­té­gico da NATO, ainda mais agres­sivo, a re­no­vada cor­rida ar­ma­men­tista e o ainda maior alar­ga­mento da pre­sença mi­litar da NATO (in­cluindo per­ma­nente) no Leste eu­ropeu. Tais op­ções são re­pli­cadas na nova versão da bús­sola es­tra­té­gica da União Eu­ro­peia, o «seu» con­ceito es­tra­té­gico, que apro­funda rá­pida e pe­ri­go­sa­mente o pilar mi­li­ta­rista e in­ter­ven­ci­o­nista da UE, como braço eu­ropeu da NATO.

As de­cla­ra­ções de Biden, pe­rante a nata do grande ca­pital norte-ame­ri­cano, de que «está a nascer uma nova ordem mun­dial e somos nós que a temos de li­derar» é por­ven­tura a mais elu­ci­da­tiva ex­pressão do que de facto se está a passar na Ucrânia, na Eu­ropa e no mundo.




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