Crimes, encenações e a escalada do conflito

Todos os actos criminosos, incluindo em cenário de guerra, são injustificados e merecem a mais viva condenação, ocorram na Ucrânia ou no Iraque, no Afeganistão ou na Síria, na Líbia ou em qualquer outro país.

Não houve qualquer investigação séria aos acontecimentos de Bucha

O dramatismo das imagens que nos chegam desde o fim-de-semana da localidade de Bucha, próxima de Kiev, não deixa ninguém indiferente. A divulgação, feita por meios de comunicação ucranianos (desde há semanas concentrados e sob forte controlo do governo), levou vários países, desde logo os EUA, a acusarem a Federação Russa de «crimes de guerra».

A Rússia, que garante estar-se perante uma «encenação» e uma «provocação» das forças ucranianas, tentou por duas vezes que a questão fosse debatida numa reunião de emergência do Conselho de Segurança das Nações Unidas logo na segunda-feira, dia 4. Mas a presidência britânica desse órgão rejeitou ambas as solicitações, deixando para o dia seguinte a discussão do caso de Bucha.

Nessa reunião, tal como fizera na véspera, em conferência de imprensa, o representante da Federação Russa, Vassily Nebenzia, apresentou um conjunto de elementos que sustentam a tese da «provocação»: entre eles, estão as declarações do edil da cidade, que no dia 31 saudou a retirada russa e não se referiu a quaisquer cadáveres; a reportagem de um jornalista, no dia 1, também sem qualquer informação nesse sentido; e ainda diversos vídeos publicados pelos próprios militares ucranianos.

O que é certo é que não houve, até ao momento, qualquer investigação séria e independente que permita o cabal apuramento do que efectivamente ocorreu em Bucha. E enquanto ela não existir, há sérios riscos da verdade permanecer obscurecida pela propaganda.

Trágicas encenações

Não seria inédita a encenação de um massacre, ou de um acontecimento da mesma natureza, para promover uma acção ou escalada militar.

O exemplo mais famoso, e hoje indesmentível, ocorreu em 2003, quando EUA e Reino Unido justificaram a agressão ao Iraque com a alegada posse, por este Estado, de armas de destruição massiva. O pretexto revelou-se falso, tal como afirmavam milhões por todo o mundo, mas nem por isso o Secretário de Estado norte-americano de então, Colin Powel, deixou de apresentar pretensas provas da sua existência no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Entretanto, a guerra do Iraque viria a provocar para cima de 600 mil mortos entre a população iraquiana.

Já em Outubro de 1990, uma jovem kuwaitiana tinha «denunciado» perante uma comissão do Congresso norte-americano supostas atrocidades cometidas por soldados iraquianos numa maternidade do Kuwait. Estas declarações provocaram uma onda de comoção generalizada, abrindo caminho à Operação Tempestade no Deserto, como ficou conhecida a primeira guerra do Golfo. Porém, como se demonstraria mais tarde, o testemunho era falso.

Também a agressão à Jugoslávia esteve rodeada de manipulações: o massacre de Racak, que constituiu a «gota de água» para o início dos bombardeamentos da NATO, não existiu, como confirmou a coordenadora da autópsia às vítimas, a finlandesa Helena Ranta. O mesmo concluiu o general alemão Heinz Loquai. O jornalista Carlos Santos Pereira e o major-general Carlos Branco concordam na ideia que nas guerras que dilaceraram a antiga Jugoslávia ao longo da década de 90 do século XX, só se pode falar de genocídio na Krajina, contra os sérvios.

Quanto aos crimes de guerra, ocorreram nestas e noutras agressões dos EUA e da NATO: a utilização de munições com urânio empobrecido na Jugoslávia e fósforo branco em Faluja, no Iraque; o napalm e o Agente Laranja, no Vietname, e a bomba atómica sobre Hiroxima e Nagasáqui; os bombardeamentos massivos sobre cidades iraquianas e vietnamitas. Nenhum responsável militar e político norte-americano foi julgado por qualquer destes crimes.


Laboratórios militares dos EUA na Ucrânia

A Duma Estatal (câmara baixa do parlamento) e o Conselho da Federação (senado) da Rússia decidiram iniciar uma investigação sobre o programa militar norte-americano desenvolvido em laboratórios biológicos na Ucrânia, sob a direcção do Pentágono.

O presidente da Duma, Viacheslav Volodin, acusou de estarem envolvidos no financiamento dessas actividades um fundo de investimento dirigido por Hunter Biden, filho do presidente dos EUA, e uma fundação de George Soros, «conhecido organizador de revoluções coloridas» e que tem apelado à «mudança de regime» na Rússia.

A subsecretária de Estado de Assuntos Políticos dos EUA, Victoria Nuland, falando perante o Comité de Relações Exteriores do Senado norte-americano, admitiu a existência de instalações na Ucrânia onde se realizam investigações biológicas e confirmou que Washington procura evitar que tais laboratórios fiquem sob controlo das forças russas.

Contudo, provas de uma limpeza de emergência, por parte de Kiev, de traços do programa biológico militar implementado na Ucrânia, sob a égide dos EUA, foram já reveladas. Segundo o porta-voz do Ministério da Defesa russo, major-general Ígor Konashénkov, trabalhadores dos laboratórios biológicos ucranianos revelaram a destruição – logo a 24 de Fevereiro, quando começou a intervenção militar russa – de agentes patogénicos especialmente perigosos, entre eles de peste, antrax, tularemia e cólera.

Por seu lado, o chefe das Forças de Defesa da Radiação Química e Biológica da Rússia, Ígor Kirílov, assegurou que 30 laboratórios ucranianos, em 14 locais do país, participaram em actividades biológicas-militares em grande escala, no quadro de um acordo de cooperação entre os EUA e a Ucrânia. Para a Rússia, é necessário pedir esclarecimentos a Washington sobre os verdadeiros fins destes laboratórios, no quadro de uma investigação internacional.

Também a China pediu «uma avaliação justa, objectiva e profissional das alegações da Rússia».

O porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Zhao Lijian, afirmou que os EUA ainda não deram uma «resposta construtiva» às acusações de Moscovo e pediu à comunidade internacional para as levar seriamente em consideração.

O embaixador da China nas Nações Unidas, Zhang Jun, disse recentemente que os laboratórios dos EUA na Ucrânia são apenas a ponta do iceberg. E revelou que o Pentágono controla 336 laboratórios biológicos em 30 países em todo o mundo.



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