Salvar o SNS e garantir a todos o direito à Saúde

«De­fender o Ser­viço Na­ci­onal de Saúde (SNS) é uma exi­gência do pre­sente e do fu­turo», da «de­mo­cracia e da jus­tiça so­cial. O PCP cá es­tará para travar esta ba­talha», as­se­gurou, na quinta-feira, 7, Je­ró­nimo de Sousa. Numa tri­buna pú­blica em Odi­velas, o Se­cre­tário-geral do Par­tido apelou à «luta con­ver­gente» dos pro­fis­si­o­nais e das po­pu­la­ções para «salvar» e «de­fender» uma «das mais im­por­tantes con­quistas de Abril».

O sub­fi­nan­ci­a­mento da saúde é uma cons­tante

O Centro de Saúde de Odi­velas foi o local es­co­lhido pelo PCP para as­si­nalar o Dia Mun­dial da Saúde, com uma sessão – com vá­rias de­zenas de utentes, in­te­grada na Acção Na­ci­onal que está a re­a­lizar em todo o País em de­fesa do SNS.

Como se deu a co­nhecer, na­quele con­celho, às portas de Lisboa, o nú­mero de utentes sem mé­dico de fa­mília passou de 29 376 (19 por cento), em No­vembro de 2021, para 35 147 (23,7 por cento), em Fe­ve­reiro deste ano. Ou seja, um em cada quatro utentes não tem di­reito a mé­dico de fa­mília. Além de «mi­lhares de utentes sem mé­dico de fa­mília», Eva Bom, utente na­quele Centro de Saúde, alertou para a«falta de ser­viços de ur­gência». «O CATUS está fe­chado aos dias de se­mana, fun­ci­o­nando entre as 10h00 e as 16h00 ao fim-de-se­mana, o que faz com que os seus utentes não te­nham al­ter­na­tiva senão ir às ur­gên­cias dos hos­pi­tais», in­formou. Outra das ne­ces­si­dades avan­çadas por Eva Bom passa por mais es­pe­ci­a­li­dades mé­dicas nos cen­tros de saúde, como «saúde oral, mental, gi­ne­co­logia, pe­di­a­tria, otor­rino e of­tal­mo­logia».

Fer­nanda San­ches, do Mo­vi­mento Mais Saúde, re­feriu al­gumas lutas tra­vadas pelos utentes, como a cons­trução do Centro de Saúde de Odi­velas.«Edi­fí­cios ainda fazem. Con­tratar mé­dicos, en­fer­meiros e pes­soal au­xi­liar é que não», cri­ticou. Deu ainda conta de uma tri­buna pú­blica re­a­li­zada na­quele dia, 7, pro­mo­vida pela Co­missão de Utentes da Saúde da Pon­tinha, para exigir um novo centro de saúde na fre­guesia, com mais con­di­ções e mais mé­dicos de fa­mília.

Enfra­que­ci­mento do SNS

A en­cerrar a sessão, o Se­cre­tário-geral do PCP acusou os su­ces­sivos go­vernos, di­ri­gidos pelo PS e pelo PSD, de terem apli­cado po­lí­ticas que le­varam ao en­fra­que­ci­mento do SNS, abrindo ca­minho aos grupos eco­nó­micos pri­vados. «Os grupos eco­nó­micos pri­vados na saúde sus­tentam o seu lucro à custa das ca­rên­cias de res­posta dos ser­viços pú­blicos e da trans­fe­rência di­recta de re­cursos do or­ça­mento do SNS e de ou­tras en­ti­dades pú­blicas. Só para os hos­pi­tais pri­vados as trans­fe­rên­cias do Es­tado au­men­taram 300 por cento nos úl­timos 20 anos», acusou.

En­tre­tanto, as con­di­ções de fun­ci­o­na­mento do SNS têm vindo a de­gradar-se. «Faltam pro­fis­si­o­nais de saúde, desde mé­dicos e en­fer­meiros a ou­tros téc­nicos, ad­mi­nis­tra­tivos e au­xi­li­ares. As suas car­reiras são des­pre­zadas, os seus di­reitos des­res­pei­tados e as re­mu­ne­ração são baixas. O sub­fi­nan­ci­a­mento da saúde é uma cons­tante. Au­menta a des­co­or­de­nação e a de­sor­ga­ni­zação nos ser­viços de saúde. O in­ves­ti­mento é mí­nimo e, por isso, con­tinua a haver ins­ta­la­ções de­gra­dadas, falta de equi­pa­mentos e de ma­te­riais», des­creveu Je­ró­nimo de Sousa.

Re­la­ti­va­mente aos cui­dados pri­má­rios de saúde, o di­ri­gente co­mu­nista dis­cordou com o facto de haver «utentes e pro­fis­si­o­nais de pri­meira e de se­gunda ca­te­goria, con­so­ante in­te­grem Uni­dades de Saúde Fa­mi­liar ou uni­dades de for­mato con­ven­ci­onal». «Não podem con­ti­nuar a faltar nos cen­tros de saúde ins­tru­mentos mí­nimos de di­ag­nós­tico, como um sim­ples raio-x ou meios para a re­a­li­zação de aná­lises clí­nicas», apontou, fri­sando ser pre­ciso que «se con­cre­tize a atri­buição de mé­dico e en­fer­meiro de fa­mília a todos os utentes, a toda a po­pu­lação, o que hoje não acon­tece em re­lação a mais de um mi­lhão de pes­soas», que «o aten­di­mento seja fácil e rá­pido» e que «seja pos­sível te­le­fonar e ser aten­dido».

Também nos hos­pi­tais são ne­ces­sá­rios «mais pro­fis­si­o­nais, mais in­ves­ti­mento em equi­pa­mentos e nos edi­fí­cios», para «re­cu­perar as listas de es­pera nas con­sultas, nos exames, nas ci­rur­gias e nos tra­ta­mentos» e «in­verter a de­sas­trosa po­lí­tica de re­dução de camas de in­ter­na­mento nos hos­pi­tais pú­blicos – mais de quatro mil nos úl­timos anos – que im­pede uma me­lhor res­posta à re­a­li­zação de ci­rur­gias e di­fi­culta o tra­balho dos ser­viços de ur­gência». «Não é por acaso que, ao mesmo tempo, as camas dos hos­pi­tais pri­vados te­nham au­men­tado quase na mesma quan­ti­dade», ob­servou.

 

Mé­dicos e en­fer­meiros de fa­mília para todos

 O PCP en­tregou na As­sem­bleia da Re­pú­blica (AR), no pas­sado dia 6, três «im­por­tantes» pro­jectos de lei que têm como ob­jec­tivo «pre­servar os mé­dicos e en­fer­meiros que todos os dias vão aban­do­nando o SNS» e atrair «muitos dos que saíram e so­bre­tudo os que se vão for­mando», anun­ciou Je­ró­nimo de Sousa.

Os di­plomas con­tem­plam a «im­ple­men­tação do re­gime de de­di­cação ex­clu­siva, com ca­rácter op­ci­onal, com o au­mento em 50 por cento da re­mu­ne­ração base e 25 por cento da con­tagem de tempo para a pro­gressão na car­reira, ga­ran­tindo desta forma uma re­mu­ne­ração digna, pro­gressão efec­tiva e con­di­ções de tra­balho», o «alar­ga­mento de in­cen­tivos para a fi­xação de pro­fis­si­o­nais de saúde em áreas ca­ren­ci­adas» e a «con­tagem de todos os pontos para efeitos de des­con­ge­la­mento das car­reiras que abrange todos os tra­ba­lha­dores da Ad­mi­nis­tração Pú­blica».

«Estes ins­tru­mentos, para além de me­lhores ins­ta­la­ções e equi­pa­mentos, são de­ter­mi­nantes para que ve­nhamos a ter, efec­ti­va­mente, um mé­dico e um en­fer­meiro de fa­mília para todos os ci­da­dãos, pro­messa su­ces­si­va­mente não cum­prida por vá­rios go­vernos», des­tacou o Se­cre­tário-geral do Par­tido, as­se­gu­rando: «Só com mais pro­fis­si­o­nais de saúde va­lo­ri­zados e mo­ti­vados po­demos salvar o SNS».

Os co­mu­nistaspro­põem igual­mente a «aqui­sição ime­diata dos equi­pa­mentos ne­ces­sá­rios aos hos­pi­tais e cen­tros de saúde, entre os quais apa­re­lhos de raio-x, ecó­grafos, TAC ou res­so­nân­cias mag­né­ticas». «Uma grande parte das trans­fe­rên­cias fi­nan­ceiras do SNS para os pri­vados são mo­ti­vadas por falta de ca­pa­ci­dade pró­pria para re­a­lizar um con­junto de exames que, com maior efi­ci­ência, mais con­forto para os utentes e me­nores gastos, po­de­riam ser re­a­li­zados nos ser­viços pú­blicos», atestou, re­for­çando que «muitas destas aqui­si­ções es­tavam in­cluídas no Orça­mento do Es­tado para 2021, por exi­gência do PCP, e não foram, no fun­da­mental, con­cre­ti­zadas pelo governo do PS».

Outra das exi­gên­cias passa pela con­cre­ti­zação dos in­ves­ti­mentos na cons­trução de hos­pi­tais e de cen­tros de saúde há muito pre­vistos e adi­ados.

Des­res­pon­sa­bi­li­zação do Es­tado

Na sua in­ter­venção, o Se­cre­tário-geral do PCP qua­li­ficou de «muito ne­ga­tivo» o pro­cesso de trans­fe­rência para os mu­ni­cí­pios de res­pon­sa­bi­li­dades na área da saúde, «com re­cursos muito in­fe­ri­ores aos ne­ces­sá­rios, que vai tra­duzir-se numa ainda maior des­res­pon­sa­bi­li­zação do Es­tado e em con­di­ções di­fe­ren­ci­adas de acesso aos cui­dados, em fun­ções das de­ci­sões ou dos re­cursos mu­ni­ci­pais, des­res­pei­tando a uni­ver­sa­li­dade que a Cons­ti­tuição da Re­pú­blica es­ta­be­lece como prin­cípio». Com Je­ró­nimo de Sousa es­ti­veram Jorge Pires e Ri­cardo Costa, ambos da Co­missão Po­lí­tica do PCP.

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  •  Au­men­taram os utentes sem mé­dico de fa­mília. Pas­saram de 700 mil, em 2019, para um mi­lhão e 200 mil, em 2022;
  •  Mantêm-se as listas de es­pera para ci­rur­gias, tra­ta­mentos e con­sultas;
  •  Foram eli­mi­nadas quatro mil camas nos hos­pi­tais pú­blicos, en­quanto os pri­vados au­men­taram cerca de três mil;
  • Na úl­tima dé­cada pré-pan­demia (2010/​2019) au­men­taram 40 por cento os gastos di­rectos da po­pu­lação em saúde, ao mesmo tempo que di­mi­nuiu a des­pesa pú­blica em saúde e au­mentou a trans­fe­rência de verbas pú­blicas para os grupos pri­vados do sector.