Assegurar as receitas necessárias ao cumprimento das funções do Estado, procedendo simultaneamente a um alívio fiscal sobre rendimentos mais baixos e intermédios, eis o sentido geral das mais recentes alterações ao OE 2022 propostas pelo PCP.
São ao todo 14 as propostas em matéria fiscal apresentadas pelo Grupo Parlamentar comunista e cujo conteúdo foi dado a conhecer na passada sexta-feira, 6, em conferência de imprensa, no Parlamento, pelo deputado Bruno Dias.
Por algumas das medidas terem naturais e justificados impactos orçamentais, entendeu o PCP fazê-las acompanhar de um conjunto de outras alterações destinadas a ter um «impacto positivo na receita, ou na redução de despesas sumptuárias».
Por outras palavras, ao assegurar uma mais adequada tributação do grande capital e dos rendimentos de mais elevado valor, tais propostas garantem um aumento da receita, e, consequentemente, tornam possível a redução de impostos sobre quem trabalha, como salientou aos jornalistas o parlamentar do PCP.
É disso exemplo, desde logo, a proposta que visa eliminar várias isenções no Código do IRC e no estatuto dos Benefícios Fiscais, em ordem a «assegurar que os lucros realizados em Portugal são efectivamente tributados no País». Ainda no âmbito do estatuto dos Benefícios Fiscais, realce para a proposta que põe termo ao regime fiscal da Zona Franca da Madeira.
Os deputados comunistas advogam, por outro lado, o alargamento do englobamento obrigatório a todos os rendimentos, prediais e de capital, para contribuintes do escalão mais elevado de IRS (com rendimentos mensais superiores a 7000 euros), de forma a «terminar com a desigualdade na tributação dos rendimentos consoante a sua origem, e não o seu valor».
Já sobre o Estatuto Fiscal dos Residentes Não Habituais, cuja despesa fiscal ascende a mais de 890 milhões de euros, o PCP defende o fim do mesmo, corrigindo assim o que, «além de constituir uma profunda injustiça fiscal em prejuízo dos contribuintes portugueses, tem trazido graves consequências negativas nos preços da habitação», segundo Bruno Dias.
Aliviar carga sobre o trabalho
Em matéria de redução de impostos sobre os rendimentos do trabalho, importa destacar a proposta que aumenta o mínimo de existência do IRS, ou seja, do limiar abaixo do qual se aplica a isenção do IRS, num valor cerca de 400 euros acima do que é apresentado pelo Governo.
De grande alcance é também a proposta de descongelamento e aumento da dedução específica, isto é, da «parcela abatida ao rendimento global para cálculo das taxas de IRS, actualizando este valor em 5,3%», o que permite uma «recuperação parcial da perda de rendimento real que representa o congelamento desta dedução desde 2010».
Bruno Dias destacou ainda a proposta de actualização dos limites dos escalões de IRS, e, já noutro capítulo, as propostas no sentido da redução dos custos suportados pelos consumidores na banca e nos seguros. É o caso das que visam a proibição das comissões de manutenção de conta, ou o fim dos brutais aumentos das comissões bancárias.
A devolução de parte dos recursos acumulados no Fundo de Garantia Automóvel (FGA), através de uma redução das taxas que são suportadas pelos tomadores de seguros do ramo automóvel, sem pôr em causa o cumprimento das funções daquele organismo, é outra proposta merecedora de realce.
Perante as dificuldades com que os portugueses estão confrontados, com tais propostas, em síntese, como frisou Bruno Dias, o que o PCP faz é apresentar «soluções concretas que resolvem problemas na vida das pessoas e do País».
Propostas para melhorar a vida
As propostas de alteração ao OE 2022 apresentadas pelo PCP no final da semana transacta vêm somar-se a outras por si formalizadas logo que o processo de discussão na especialidade foi aberto. Esse primeiro lote de propostas, recorde-se, visa responder aos problemas mais sentidos pelos trabalhadores e o povo, como o agravamento do custo de vida e a perda do poder de compra, corporizando simultaneamente uma política alternativa capaz de resolver os problemas estruturais do País. Daí a defesa de medidas concretas direccionadas para o aumento das reformas e pensões, para a redução dos preços da alimentação, para a regulação dos preços da energia e assim baixar o preço dos combustíveis, para salvar o SNS do cerco que lhe está a ser movido pelos grupos privados (através nomeadamente da fixação de profissionais de saúde), para a valorização de carreiras e profissões (incluindo a fixação de valores justos para o suplemento de risco das forças e serviços de segurança), a estabilidade e a redução dos preços da habitação.
Mais três novos pacotes de propostas foram entretanto apresentados nos dias seguintes. Num deles, tendo presente a necessidade de garantir o acesso dos cidadãos à Justiça, aponta-se no sentido do reforço do investimento em recursos humanos na Justiça e na Administração Interna.
Num segundo conjunto de propostas, face aos problemas sentidos nos serviços públicos e pelos trabalhadores da Administração Pública, é dada resposta a esses constrangimentos e dificuldades, por via, entre outros pontos, de uma valorização salarial significativa, bem como das carreiras, a par de medidas concretas de combate à precariedade, de reforço da contratação de profissionais, de respeito pelos direitos dos trabalhadores da Administração Pública, tendo em vista a melhoria do serviço público que é prestado à população.
No terceiro pacote de propostas, subjacente à sua apresentação está o propósito de resolver o persistente défice da nossa balança externa agro-alimentar e de assegurar e defender a soberania alimentar nacional. Daí a elaboração de um grupo muito amplo de propostas destinadas a promover a produção nacional e a salvaguardar os rendimentos dos agricultores e pescadores.
Por mais justiça fiscal
A criação do 10.º escalão de IRS, para rendimentos colectáveis superiores a 250 000 euros anuais, consolidando na tabela de IRS a Taxa Adicional de Solidariedade; a criação de uma taxa sobre as transferências para offshores; e a criação de uma contribuição extraordinária sobre os lucros inesperados do sector dos seguros (ganhos resultantes da redução substancial da sinistralidade rodoviária durante a pandemia), constituem outras três importantes importantes alterações preconizadas pelo PCP com vista a garantir maior equidade fiscal.
De enorme alcance são ainda propostas como o fim do regime das Parcerias Público-Privadas (uma despesa anual de mais de 1300 milhões de euros, transferidos do Estado para grupos económicos privados), ou a que visa adoptar um regime que impeça ganhos extraordinários das concessionárias de PPP rodoviárias, devido a pedidos de reposição do equilíbrio financeiro por «redução de tráfego provocada pelas medidas de combate à pandemia».