A União Europeia (UE) continua a saga de aplicação de sanções à Federação Russa – vamos já na sexta ronda! – e, se dúvidas houvesse, podemos verificar como elas se constituem como mais uma arma de guerra. O objectivo das sanções económicas e políticas não é o cessar-fogo e a paz mas sim a escalada de confrontação cujo efeito só pode resultar em mais guerra e mais sofrimento.
Os trabalhadores e os povos sentem na pele o ricochete de tais sanções que acabam por afectar todos, equivalendo, na prática, a auto-sanções que a UE impõe aos seus Estados-Membros, à sua economia, às suas micro, pequenas e médias empresas, aos trabalhadores e aos povos.
O caso do gás é paradigmático. Ainda que a dependência da UE relativamente ao gás russo seja de 45%, com níveis variáveis entre Estados-Membros, insiste-se em sanções, onde se inclui a redução de dependência ou mesmo o embargo ao gás russo.
Face aos níveis de stock de armazenamento de gás natural que, em 2021, sofreram as maiores quedas da última década e perante a escalada do conflito no Leste da Europa, agravado pelas sanções, a Comissão Europeia (CE) apresentou uma proposta legislativa que pretende fixar em 80% o nível mínimo de reservas de gás em instalações subterrâneas de cada Estado até 1 de novembro de 2022, e em 90% para os anos seguintes. Também visa certificar todo o gás que entra na UE (para assegurar que, por portas travessas, não venha da Rússia).
A actual situação ilustra bem a importância da segurança do abastecimento energético que, pelo seu carácter essencial, não deve ficar dependente de contingências de mercado que, como está à vista, a ameaçam. Evidencia igualmente a necessidade do controlo público do sector energético (incluindo a produção, a distribuição, as respectivas infraestruturas, redes e reservatórios), revertendo o caminho de privatização e liberalização que tem sido imposto pelas políticas estruturais da UE.
Se assim não for, o que é que acontece? Terão de ser os Estados a compensar as «falhas de mercado». Ou seja, quando o mercado não é atractivo para os capitalistas do sector comprarem gás natural (porque está caro e não permite lucros astronómicos) e a segurança do abastecimento é posta em causa, então os Estados que apoiem financeiramente o enchimento das reservas. Como na proposta legislativa apresentada pela CE, esta não se propõe a suportar com fundos da UE o armazenamento obrigatório, terão de ser os Estados a pagar por este armazenamento obrigatório que, é como quem diz, o povo! E pagará, duplamente: a conta final da energia, que indubitavelmente aumentará, e as compras do gás que os capitalistas não querem fazer.
Se a culpa é do mercado, que o controlo público ponha mão nisto! E que se acabe com as sanções, que atingem sempre os trabalhadores e os povos!