O busílis

Manuel Gouveia

Em Portugal a notícia não registou grande relevo, mas em Espanha a polémica está acesa. A estória é simples: um comboio é apanhado por um incêndio, e enquanto o único trabalhador a bordo – a maquinista – tenta salvar o comboio e os passageiros, o que lhe exigiu inverter a marcha, e antes, percorrer todo o comboio para alcançar a cabine de condução oposta, um conjunto de passageiros foge para a linha, onde muitos deles ficam queimados.

Os passageiros que foram para a linha acusam a maquinista de incompetência, a maquinista acusa esses passageiros de se terem amotinado às ordens de uma passageira que era polícia, e inclusive de terem accionado o sinal de emergência travando o comboio quando este, finalmente, conseguiu iniciar a marcha invertida que o salvou e aos passageiros, incluindo aos que voltou a recolher.

Perante o acidente, a polémica desatou-se com um país inteiro discutindo o comportamento daquela trabalhadora, analisando as declarações contraditórias dos passageiros, com o debate inquinado pelos habituais comentadeiros, que procuram mais o sangue que a verdade. Entretanto, a análise da caixa negra do comboio, onde ficam registadas todas as comunicações e interacções no comboio, veio dar razão à maquinista, que assim está mais próxima de sair deste folhetim como heroína e não como vilã.

Mas algures no início deste relato está o busílis. É naquela parte que diz «o único trabalhador a bordo». A discussão dessa questão não será – seguramente – tão interessante como o restante folhetim, que aqui se resumiu. Mas há uma razão para haver um único trabalhador a bordo: a paulatina imposição, primeiro através da UE depois por acção sucessiva dos vários governos nacionais, do agente único.

Contra o alerta e a luta dos ferroviários e, em Portugal, do Partido. Mas obedecendo à prioridade aos lucros e à liberalização da ferrovia.




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