Não se chame jornalismo a isto

Vasco Cardoso

Não é pelo tom muitas vezes apa­lha­çado com que brinda os lei­tores do Pú­blico e os te­les­pec­ta­dores dos pro­gramas onde marca pre­sença que João Mi­guel Ta­vares é tão aca­ri­nhado pelos donos dos prin­ci­pais ór­gãos de co­mu­ni­cação so­cial. Para estes a sua grande «qua­li­dade» não é o seu dis­cu­tível sen­tido de humor ou a ca­pa­ci­dade de fixar au­di­ên­cias e atrair lei­tores, mas antes a sua dis­po­ni­bi­li­dade para am­pliar a voz do dono e o seu en­caixe em todo o tipo de ope­ra­ções ide­o­ló­gicas às quais em­prega a sua visão re­ac­ci­o­nária e, não poucas vezes, fas­ci­zante.

O an­ti­co­mu­nismo ocupa nos es­critos e in­ter­ven­ções de JMT um lugar es­pe­cial e que lhe ga­rante o sus­tento. Os cri­té­rios de­on­to­ló­gicos com os quais um «pro­fis­si­onal» deste ca­libre de­veria estar com­pro­me­tido são fa­cil­mente aban­do­nados se o ob­jec­tivo for atacar o PCP. Exem­plos são muitos. In­cluindo o que tra­zemos aqui e que foi es­crito na úl­tima pá­gina do Pú­blico: «En­cerrar cen­trais a carvão e cen­trais nu­cle­ares para, em nome do amor ao am­bi­ente, ficar to­tal­mente de­pen­dente do humor do re­gime russo é uma lou­cura que só um mi­li­tante do PCP pode ainda aplaudir.»

Trata-se de uma ca­lúnia, de uma afir­mação de­li­be­ra­da­mente men­ti­rosa cons­truída apenas para ali­mentar o pre­con­ceito an­ti­co­mu­nista. JMT sabe, ou de­veria saber, que o PCP foi a única força po­lí­tica que con­testou a an­te­ci­pação do en­cer­ra­mento das cen­trais a carvão (e da re­fi­naria de Ma­to­si­nhos). Ques­ti­onou o Go­verno e a Co­missão Eu­ro­peia, deu ex­pressão às opi­niões dos tra­ba­lha­dores destas cen­trais, an­te­cipou os pe­rigos de uma de­cisão pre­ci­pi­tada como esta e apre­sentou pro­postas no plano am­bi­ental mais am­plas e pro­fundas do que aquelas que, apa­ren­te­mente, o en­cer­ra­mento destas uni­dades per­mi­tiria. Não foi pela ce­gueira ide­o­ló­gica do PCP que as cen­trais en­cer­raram e, muito menos, por pre­o­cu­pa­ções am­bi­en­tais (como o Go­verno afirmou), mas antes pelos in­te­resses do grande ca­pital que viram nestes en­cer­ra­mentos uma opor­tu­ni­dade de ne­gócio e pelas im­po­si­ções da UE que, em nome de uma «tran­sição verde», apro­funda as re­la­ções de de­pen­dência dos países da pe­ri­feria face às grandes po­tên­cias.

Até po­demos ad­mitir, enfim, que al­guém como JMT es­colha esta forma de ga­nhar a vida, não po­demos é chamar-lhe jor­na­lismo.




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