Democracia e envelhecimento com dignidade

Manuel Loff

O PCP de­fende a aber­tura de 20 mil vagas por ano na rede pú­blica de lares que urge criar

FRE­EPIK

O im­pacto da pan­demia de COVID-19 deixou à mostra de forma par­ti­cu­lar­mente crua as de­fi­ci­ên­cias das po­lí­ticas pú­blicas para com re­for­mados, pen­si­o­nistas e idosos. O agra­va­mento das con­di­ções de saúde dos mais ve­lhos bem como o au­mento da mor­ta­li­dade es­ti­veram cla­ra­mente as­so­ci­ados às di­fi­cul­dades no acesso aos cui­dados de saúde e às fra­gi­li­dades e in­su­fi­ci­ên­cias da rede que temos de equi­pa­mentos e ser­viços de apoio às suas ne­ces­si­dades es­pe­cí­ficas.

Para o PCP, é im­pres­cin­dível a cri­ação de uma ver­da­deira rede pú­blica de equi­pa­mentos de apoio so­cial. Ela não dis­pensa o apro­fun­da­mento do ac­tual mo­delo de co­o­pe­ração com as IPSS, mas o Es­tado não se pode eximir ao dever cons­ti­tu­ci­onal de as­sumir as suas pró­prias res­pon­sa­bi­li­dades eco­nó­micas, so­ciais e cul­tu­rais para com as pes­soas idosas.

Em Por­tugal, é hoje ainda mais di­fícil que antes en­ve­lhecer com dig­ni­dade. Pri­meiro, pelo es­tado de de­gra­dação em que se en­contra o SNS, agra­vado pela re­cusa do Go­verno PS em aceitar as pro­postas que o PCP fez para o re­forço dos meios da po­lí­tica de saúde. De­pois pelo ace­le­rado au­mento do custo de vida, que con­tribui, não apenas para o agra­va­mento da po­breza e do em­po­bre­ci­mento, mas também para o au­mento dos custos de fun­ci­o­na­mento dos equi­pa­mentos e ser­viços de apoio da rede pú­blica. Os Cen­tros de Dia e de Con­vívio das As­so­ci­a­ções de Re­for­mados, Pen­si­o­nistas e Idosos con­frontam-se hoje com di­fi­cul­dades fi­nan­ceiras pelo in­su­fi­ci­ente valor das verbas pro­to­co­ladas pela Se­gu­rança So­cial, que se somam aos dé­fices an­te­ri­ores re­sul­tantes do en­cer­ra­mento das ins­ta­la­ções a que foram obri­gadas nos longos pe­ríodos de con­fi­na­mento. E essa não foi, de forma al­guma, a pior das con­sequên­cias do con­fi­na­mento. Ele foi res­pon­sável por fe­nó­menos mais ou menos ge­ne­ra­li­zados de an­si­e­dade, tris­teza, de­pressão, so­lidão e medo, que ti­veram um pe­sado im­pacto no bem-estar destas pes­soas e que ainda hoje con­di­ci­onam a re­toma dos há­bitos de con­vívio so­cial, de ocu­pação das ac­ti­vi­dades cul­tu­rais e de lazer nestas as­so­ci­a­ções e nestes cen­tros de con­vívio.

Por tudo isto, é hoje im­pres­cin­dível va­lo­rizar o papel destas as­so­ci­a­ções, bem como da rede das uni­ver­si­dades se­ni­ores que con­tri­buem para uma par­ti­ci­pação ac­tiva na de­fesa dos seus di­reitos à apren­di­zagem e à fruição cul­tural. Em termos prá­ticos, isto passa por uma linha de fi­nan­ci­a­mento ex­tra­or­di­nária de apoio às As­so­ci­a­ções de Re­for­mados, Pen­si­o­nistas e Idosos, de­sig­na­da­mente os Cen­tros de Dia e de Con­vívio que, tendo o es­ta­tuto de IPSS, se in­serem no mo­vi­mento as­so­ci­a­tivo es­pe­cí­fico deste grupo so­cial. É jus­ta­mente o que consta do pro­jeto que, no dia 5 de abril, o PCP propôs na As­sem­bleia da Re­pú­blica no sen­tido do re­forço da Rede de Equi­pa­mentos e Ser­viços de Apoio aos Idosos e que a mai­oria PS, jun­ta­mente com o PSD, chumbou.

Nas 13 re­co­men­da­ções que se in­cluíam neste pro­jeto con­densa-se muita da po­lí­tica do PCP para as­se­gurar um en­ve­lhe­ci­mento com dig­ni­dade. Nele pro­cu­rava-se res­ponder, por um lado, à ne­ces­si­dade que todos os es­tudos pre­veem de cri­ação de pelo menos 80 mil vagas em es­tru­turas re­si­den­ciais de apoio a idosos. A nossa pro­posta é que tal se fi­zesse nos pró­ximos quatro anos no âm­bito da rede pú­blica, cri­ando-se 20 mil vagas por ano. Por outro lado, e tendo como ob­jec­tivo pri­meiro a pre­ser­vação da au­to­nomia e da dig­ni­dade, pro­pu­semos o re­forço e a ar­ti­cu­lação das va­lên­cias de Apoio Do­mi­ci­liário, Cen­tros de Vida e de Dia que per­mitam dar res­posta às ne­ces­si­dades es­pe­cí­ficas dos idosos.

Qual­quer po­lí­tica pú­blica para a po­pu­lação idosa que não pres­su­ponha a cri­ação de con­di­ções so­ci­o­e­co­nó­micas dignas não passa de um con­junto de in­ten­ções mais ou menos va­zias. Pelo que se deduz do chumbo deste pro­jeto, é no que con­ti­nu­amos a estar.




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