Escola de Abril é pública, gratuita, democrática e de qualidade

«O apelo que aqui deixamos, a cada um de vós, é o de que continue a sonhar, para, com uma imensa alegria, transformar o presente que temos numa vida melhor, transformar o sonho em vida», afirmou no sábado, em Setúbal, o Secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, dirigindo-se às centenas de jovens que durante todo o dia debateram os problemas e as propostas para afirmar a escola de Abril: pública, gratuita, democrática e de qualidade.

Haverá uma verdadeira igualdade com abandono escolar por motivos financeiros, propinas e exames nacionais?

Vieram de todo o País e trouxeram, nas mochilas e sacolas, a «alegria de ser estudante», e de «construir o sonho», comprometendo-se, em cada intervenção, a «unir, mobilizar e transformar» para «defender a escola pública».

Em cada intervenção, reclamavam o que é dos estudantes, não apenas porque consideram justo, mas porque está plasmado na Constituição da República, que consagra, no seu artigo 73.º, que «todos têm direito à educação» e que cabe ao Estado promover a sua democratização e garantir todas as condições para que ela contribua para a «igualdade de oportunidades, a superação das desigualdades económicas, sociais e culturais» ou a participação democrática na vida colectiva.

Estes são alguns princípios da Escola de Abril que a Juventude Comunista Portuguesa defende e que esteve em debate na cidade do Sado, no passado sábado, tanto no 15.º Encontro Nacional do Ensino Secundário (ENES) como na 17.ª Conferência Nacional do Ensino Superior (CNES). Recorrendo a exemplos concretos e a vivos testemunhos pessoais, puseram em evidência os obstáculos ao cumprimento daqueles princípios com que todos os dias se confrontam nas suas escolas, institutos politécnicos e universidades.

Poder-se-á falar em igualdade quando há jovens a abandonar os estudos por não conseguirem pagar as propinas ou um quarto para viver? Quando há 13 mil camas em residências públicas para um universo de 115 mil estudantes deslocados? Ou quando um exame de duas horas pode deitar por terra anos de trabalho e nem todos podem pagar explicações e manuais de preparação? Quando há tão poucos transportes públicos que é preciso sair de casa de madrugada e só chegar para jantar? Quando não há professores de Língua Gestual Portuguesa ou materiais pedagógicos em Braille? Quando faltam psicólogos?

É democrática uma escola onde se proíbe reuniões gerais de alunos e reduz drasticamente a participação dos estudantes nos órgãos de gestão? É possível falar em ensino de qualidade quando há estudantes privados de professores durante meses? Quando não há laboratórios, chove nas salas de aula e a abertura do pavilhão desportivo implica o encerramento da biblioteca porque é um mesmo funcionário a assegurar os dois espaços? Contribuirá a escola para a formação integral, o pensamento crítico e a criatividade quando se desvaloriza a avaliação contínua, excluindo do debate e da reflexão questões tão relevantes quanto a paz ou a educação sexual e limitando a duas (uma em Lisboa e outra no Porto) o número de escolas artísticas?

Nas duas reuniões foram aprovadas propostas consistentes para inverter o desinvestimento e a elitização que hoje marcam a educação em Portugal e conquistar efetivamente a Escola de Abril que a Constituição consagra (ver textos nestas páginas).

 

Mais respostas e menos tricas

Terminadas as reuniões, os jovens concentraram-se no Cinema Charlot, onde se realizou a sessão de encerramento com o Secretário-geral do Partido. E foi aí que ouviram Paulo Raimundo expressar, em nome da direcção do PCP, o orgulho por saber «que os jovens comunistas estão, cada dia que passa, mais fortes, mais ligados às massas juvenis». E assim é, acrescentou, porque «são jovens com as mesmas vontades e com os mesmos gostos da juventude, porque são diversos, irreverentes, inconformados e determinados como a juventude o é».

Se a JCP cresce e avança, afirmou ainda o Secretário-geral, «é por tudo isto, mas é também, e acima de tudo, pela justeza das vossas posições, pela coerência com que defendem os nossos princípios, pela capacidade de diálogo, envolvimento, participação». A presença, ali, de muitos jovens que não pertencem à JCP, mas que com ela debatem e lutam, é disso testemunho.

Lembrando que o debate preparatório do 15.º ENES e da 17.ª CNES se iniciou em Dezembro, Paulo Raimundo destacou o «valioso processo democrático» e valorizou as «diferentes ideias e propostas, umas mais originais e criativas, outras até contraditórias, que ali surgiram». A democracia dá gozo, afirmou, «mas também dá muito trabalho».

Partindo da avaliação ali feita sobre o estado da educação em Portugal, o dirigente comunista desafiou o Governo a concentrar-se na sua resolução e a deixar-se de «tricas», «teatros», «berrarias» e «manobras». Palavras e declarações à parte, acusou, sobre estas questões é bem pouco o que diferencia PS, PSD, CDS, Chega e IL.

Terminada a sessão, os jovens desfilaram pelas ruas de Setúbal afirmando as suas causas e as suas lutas: obras nas escolas, fim dos exames nacionais, das propinas e do regime fundacional, mais democracia, acção social e transportes públicos.

 

A JCP propõe

Nos ensinos Básico e Secundário

• Construção, requalificação e modernização das escolas públicas.

Contratação dos funcionários em falta e revisão dos rácios que não correspondem às necessidades reais.

Fim dos exames nacionais no 9.º, 11.º e 12.º anos e aposta numa avaliação justa e contínua, que atenda às particularidades de cada aluno e valorize o papel do professor na aprendizagem.

Dignificação da via profissionalizante nas escolas secundárias, com redução da carga horária, subsídios a horas e por inteiro e fim dos estágios não remunerados.

Valorização das Associações de Estudantes e dos seus direitos, bem como a participação dos estudantes na gestão das escolas, eliminando a figura do director e implementando um modelo realmente democrático.

Devolver a responsabilidade das cantinas às escolas, garantindo os meios humanos e materiais necessários ao seu bom funcionamento e à qualidade das refeições.

Fim de todas as barreiras ao acesso aos mais elevados graus de ensino, das propinas ao numerus clausus.

Redução do número de alunos por turma.

Valorização da carreira docente e contratação de mais professores.

Revogação do Estatuto do Aluno, que nada mais faz do que limitar os direitos democráticos dos estudantes.

Reversão dos processos de municipalização.

Garantir condições a todas as escolas para incluir alunos com necessidades educativas especiais, nomeadamente invisuais e com dificuldades auditivas, contratando professores que leccionem Língua Gestual Portuguesa e Braille.

Valorização do Ensino Artístico através da construção de mais escolas, da diminuição da carga horária e da eliminação dos custos acrescidos a ele associados.

Garantir a todos os estudantes a gratuitidade do passe escolar e uma rede de transportes públicos que supra as suas necessidades.

Ajustar programas e áreas curriculares para que a escola vise a formação integral do indivíduo e estimule o pensamento crítico e criativo dos estudantes, no quadro de um amplo debate visando a aprovação de uma profunda reorganização curricular e consequente adequação de programas, horários e objectivos.

 

No Ensino Superior

Reforço do financiamento público, contrariando a responsabilização dos estudantes e suas famílias e a desresponsabilização do Estado.

Fim das propinas, taxas e emolumentos em todos os ciclos de estudo.

Aumento da dotação financeira para os serviços de Acção Social Escolar, que permita o alargamento das bolsas e aumento do seu valor, a construção e reabilitação de residências públicas, o alargamento a curto prazo do complemento de alojamento a todos os estudantes deslocados, o aumento do número de cantinas, a fixação do valor máximo – e acessível – da refeição social e gratuitidade para os estudantes bolseiros, reforço da rede de psicólogos (1 por 500 estudantes), reforço do complemento de deslocação e seu alargamento, reposição total do desconto do Passe Sub-23.

Revisão do actual Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior (RJIES) e fim do Regime Fundacional, em defesa de uma verdadeira gestão democrática.

Saída do sistema de Ensino Superior português do Processo de Bolonha.

Defesa da participação activa dos estudantes na democracia e associativismo nas suas instituições de ensino (desporto, cultura, lazer, movimento associativo, grupos formais e informais).

Sistema unitário para o Ensino Superior público, desmantelando a desigualdade entre o Ensino Superior Universitário e Politécnico, entre instituições ou unidades orgânicas.

Garantir um sistema de Ensino Superior público completo e abrangente, que responda às necessidades do País e garanta a proximidade e o acesso dos estudantes às instituições, enquanto meio para o desenvolvimento e rejuvenescimento das várias regiões.