As causas e os pretextos

Manuel Rodrigues

O primeiro-ministro considerou, a semana passada, que a «nova guerra», no Médio Oriente, veio agravar um contexto global, já de si «muito agreste».

A olhar o modo como o Governo, pelas suas próprias opções, e fazendo-se porta-voz dos grupos económicos e dos seus centros de propaganda, tem vindo a justificar o aumento do custo de vida, estamos na presença de um novo pretexto para, na actual situação económica e social, justificar mais um agravamento do custo de vida com as previsíveis consequências conhecidas para os trabalhadores e para o povo.

Não se quer com isto dizer que a pandemia e a guerra na Ucrânia (a guerra e as sanções) não tenham tido peso no agravamento da situação económica nacional e internacional. Tiveram, certamente!

Mas o que o Governo não consegue explicar é o carácter selectivo do impacto que tiveram quer a pandemia quer a guerra, determinando o agravamento do custo de vida para a imensa maioria do povo português, enquanto os grupos económicos e as multinacionais, no mesmo período e perante a mesma situação, arrecadaram lucros assombrosos, de que são exemplo os 11 milhões de euros de lucros por dia arrecadados pelos cinco maiores bancos ou os 25 milhões, também por dia, embolsados pelos principais grupos económicos, no primeiro semestre de 2023.

Não será, antes, uma situação em que se tem vindo a aproveitar a pandemia e a guerra como pretextos para aprofundar a exploração, a fazer lembrar as acutilantes palavras de Almeida Garrett perante as brutais desigualdades sociais do seu tempo: «e eu pergunto aos economistas, aos moralistas, se já calcularam o número de indivíduos que é forçoso condenar à miséria, ao trabalho desproporcionado, à desmoralização, à infância, à ignorância crapulosa, à desgraça invencível, à penúria absoluta, para produzir um rico?»

Não será que, usando os mesmos pretextos, já nos estão a preparar para novo agravamento, para uns, e novos lucros, para outros?...




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