Migrações, trabalho e direitos

Seyne Torres

A quem in­te­ressa haver mi­lhares de tra­ba­lha­dores imi­grantes sem di­reitos?

Fre­epik

A Con­venção In­ter­na­ci­onal para a Pro­tecção dos Di­reitos de Todos os Tra­ba­lha­dores Mi­grantes e dos Mem­bros das suas Fa­mí­lias foi apro­vada a 18 de De­zembro de 1990, pela As­sem­bleia Geral das Na­ções Unidas. Dez anos de­pois, as Na­ções Unidas pro­cla­maram o dia 18 de De­zembro como Dia In­ter­na­ci­onal das Mi­gra­ções.

Esta Con­venção propõe a pro­tecção da dig­ni­dade a todos os tra­ba­lha­dores mi­grantes e aos mem­bros das suas fa­mí­lias sem qual­quer dis­tinção e aplica-se a todo o pro­cesso mi­gra­tório. Con­tudo, até hoje só 59 Es­tados ra­ti­fi­caram esta Con­venção, sendo que Por­tugal ainda não a ra­ti­ficou.

Para o PCP é im­por­tante as­si­nalar este dia, ainda mais quando nos de­pa­ramos com forças xe­nó­fobas e ra­cistas na As­sem­bleia da Re­pú­blica, mas também em go­vernos e par­la­mentos de vá­rios países. A luta pela pro­tecção dos di­reitos dos tra­ba­lha­dores mi­grantes e suas fa­mí­lias as­sume uma nova di­mensão e ac­tu­a­li­dade.

As causas para o au­mento dos fluxos mi­gra­tó­rios en­contra-se di­rec­ta­mente li­gada às po­lí­ticas ne­o­li­be­rais e mi­li­ta­ristas, que de­sen­ca­deiam guerras, saque dos re­cursos na­tu­rais, eco­nó­micos e hu­manos dos países de origem dos imi­grantes. Estes fogem da fome, po­breza e de­si­gual­dades so­ciais e pro­curam tra­balho, se­gu­rança e es­ta­bi­li­dade para si e suas fa­mí­lias.

Hoje Por­tugal é si­mul­ta­ne­a­mente um país de emi­gração e imi­gração. Entre os por­tu­gueses que saem do país à pro­cura de me­lhores con­di­ções de vida – tra­balho, me­lhores sa­lá­rios –, há mi­lhares de es­tran­geiros que chegam a Por­tugal à pro­cura do que os seus países não lhes con­se­guem ga­rantir – me­lhores con­di­ções de vida. A de­mo­grafia na­ci­onal al­terou-se, ad­quiriu di­ver­si­dade e com­ple­xi­dade.

É nesta di­ver­si­dade e com­ple­xi­dade que as forças po­pu­listas e de ex­trema-di­reita usam os imi­grantes como arma de ar­re­messo, res­pon­sa­bi­li­zando-os pela de­gra­dação da si­tu­ação eco­nó­mica e so­cial dos por­tu­gueses.

Desde a ideia de imi­gração des­con­tro­lada, fa­ci­li­tismo da ad­mi­nis­tração nos pro­cessos de en­trada, au­mento da cri­mi­na­li­dade, au­mento do de­sem­prego... Dados fa­cil­mente con­tra­ri­ados pelos úl­timos re­la­tó­rios do Ob­ser­va­tório das Mi­gra­ções ou pelo o Ins­ti­tuto Na­ci­onal de Es­ta­tís­tica.

Os imi­grantes con­tri­buíram com 1800 mi­lhões de euros para a Se­gu­rança So­cial (dados de 2022) e até Agosto do cor­rente ano esse nú­mero já as­cendia os 1700 mi­lhões de euros. Se olharmos para os úl­timos oito anos, o peso das con­tri­bui­ções destes tra­ba­lha­dores para a Se­gu­rança So­cial au­mentou de 3% para 13%, sendo que entre aquilo que foi o seu con­tri­buto para o Es­tado Por­tu­guês e aquilo que dele re­ce­beram, existe um saldo po­si­tivo de 968 mi­lhões de euros.

Os mi­lhares de pro­cessos (mais de 300 mil para re­gu­la­ri­zação) que tran­si­taram do SEF para a AIMA (Agência para a In­te­gração, Mi­gra­ções e Asilo), con­ti­nuam pen­dentes e pre­cisam com ur­gência de re­so­lução. São mi­lhares de imi­grantes que tra­ba­lham e des­contam para a Se­gu­rança So­cial, mas com di­reitos li­mi­tados: no acesso à saúde, nas pres­ta­ções so­ciais, a um con­trato de tra­balho, à ha­bi­tação. Têm a vida li­mi­tada, pre­cária e com­ple­ta­mente à merçê da ex­plo­ração la­boral e sa­la­rial. A quem in­te­ressa estes mi­lhares de tra­ba­lha­dores imi­grantes sem di­reitos?

Para dar res­posta a este grave pro­blema, o PCP apre­sentou no Or­ça­mento do Es­tado para 2024, uma pro­posta de do­tação or­ça­mental para a cri­ação de Equipas de Re­gu­la­ri­zação dos pro­cessos pen­dentes tran­si­tados para a AIMA. Esta pro­posta foi chum­bada com o voto do PS.

Tal como Por­tugal não pode ig­norar que a pro­tecção dos di­reitos dos tra­ba­lha­dores mi­grantes é, desde logo, uma res­pon­sa­bi­li­dade em re­lação aos mi­lhões de emi­grantes es­pa­lhados pelo mundo, a mesma exi­gência deve-se co­locar na forma como aco­lhemos os imi­grantes.




Mais artigos de: Argumentos

A Tocha Invisível

Os Carrascos Também Morrem (Hangmen Also Die!, 1943) é um filme antifascista feito nos Estados Unidos, dois anos depois de o país ter entrado na Segunda Guerra Mundial. Pertence ao conjunto de obras que tentavam convencer o povo americano sobre a justeza desta participação. No meio destas...