Quanto custa questionar?

Pedro Massano

Por que morre a indignação com os algarismos dos lucros e se agitam fantasmas com os dos salários?

José Araújo

A vida está pela hora da morte mas a classe dominante quer que só se façam as perguntas que lhe interessam e dá de imediato as respostas que lhe convém.

É urgente aumentar os salários? Para quem a existência depende da venda da sua força de trabalho e treme de medo do meio do mês, da conta da luz, do supermercado, da renda ou do crédito, não será difícil responder. O salário é o preço da força de trabalho que vendemos e será sempre no capitalismo (rosa ou de botas cardadas) o mínimo indispensável para que a força de trabalho se reproduza e possa voltar a ser vendida para os capitalistas continuarem a amealhar a mais-valia. O salário é o preço do nosso sangue? É. Quanto maior é o salário, menor é o lucro imediato e a acumulação capitalista? Sim. As fortunas são feitas a partir da riqueza criada pelo trabalho? Quanto vale a vida de quem trabalha e produz a riqueza?

Os grandes interesses e os seus fiéis propagandistas, pagos a peso de ouro, questionam em horário nobre: «15% de subida de salários, temos ou não temos dinheiro para uma subida deste género?». E prontamente respondem: «Em 3 letras: NÃO!». Assim, seco e sem contraditório.

Assim sentenciaram de irrealista a reivindicação que anima os trabalhadores de todos os sectores, que, apesar da ofensiva, erguem o rosto porque sabem que é possível conquistar aumentos significativos do salário, de 15%, não inferiores a 150 euros, como defende o PCP. Esta consciência tira o sono ao capital? Tira, e, por isso, querem desmobilizar a luta e o voto na CDU.

«Isso custa, por ano, uns 15 mil milhões de euros que seriam pagos quase todos por empresas privadas e também pelo Estado. Parece-me mesmo uma proposta alucinante.», continuava a dizer-se na caixa mágica. O valor não é muito exacto, mas também não andará muito longe da realidade. Partamos dele. É muito dinheiro? Depende. Aparenta ser, sobretudo, porque vivemos com salários de três algarismos, na melhor das hipóteses de quatro. Aumentar salários em 2024, para recuperar o que os trabalhadores suportaram com três anos de inflação «alucinante», como propomos, custaria, no total, um número com 11 algarismos. Um «alucinante eleitoralismo», dizem eles. Será?

Com quantos algarismos se escreve o lucro depois de impostos de todas as empresas portuguesas, sem as seguradoras, em 2022? Também 11! Gasta-se tinta, mas escreve-se assim: 45 239 000 000 euros. Não é alucinante? Não há dinheiro?! Por que morre a indignação com os algarismos dos lucros e se agitam fantasmas com os dos salários? Foram os trabalhadores que criaram a riqueza, não precisam de calculadora para saber que estão a ser roubados. Dos lucros de 2023 a conta ainda não está feita, mas ninguém duvida que serão maiores. O total de lucros é mais que o triplo de 15 mil milhões. É assim tão irrealista que 1/3 da riqueza criada fique nos bolsos dos trabalhadores?

Questionemos quanto custa ao País os baixos salários; a fome; as famílias a dormir na rua; a emigração dos jovens, dos quadros mais qualificados; a destruição dos serviços públicos. Quanto custa não ver os filhos crescer? Quanto custa o cansaço? Quanto custa a exclusão da imensa maioria da cultura e do conhecimento? Custa demasiado caro. E só tem servido para enriquecer os grupos económicos e as multinacionais e apresentar a Bruxelas um excedente orçamental.

Quanto lhes custará que os trabalhadores organizados ponham fim a tudo isto? Quando será? Como será? A nossa luta dará as respostas!




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