A guerra no Sudão, tragédia «esquecida»

Carlos Lopes Pereira

O presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, voltou a defender o cessar-fogo no Sudão e reiterou o apoio de Pretória ao diálogo entre as partes em conflito naquele país.

O cessar-fogo imediato aliviará o sofrimento e a catástrofe humanitária que enfrenta o povo sudanês, em especial as mulheres e as crianças, declarou o estadista. E anunciou a intenção de se reunir com o presidente do Conselho Soberano de Transição do Sudão, general Abdel Fattah al-Burhan, no quadro dos esforços de mediação do conflito.

Estes louváveis esforços sul-africanos não são novos. Em 2022, a África do Sul liderou uma iniciativa africana de paz visando contribuir para o termo da guerra na Ucrânia. Mais recentemente, junto do Tribunal Internacional de Justiça, em Haia, acusou Israel de estar a promover um genocídio contra o povo palestiniano, na Faixa de Gaza. Também em África, os sul-africanos mantêm-se activos na procura de soluções pacíficas para vários conflitos, o mais recente dos quais na região dos Grandes Lagos, opondo a República Democrática do Congo ao Ruanda.

No Sudão, a guerra civil travada entre o exército, chefiado por Al-Burhan, e as milícias lideradas pelo também general Mohammed Hamdane Dagalo – cada uma dessas facções com os seus apoios internacionais mais ou menos explícitos –, devasta o país desde meados de Abril de 2023, há quase um ano.

O Programa Alimentar Mundial (PAM), agência humanitária das Nações Unidas, preveniu que a guerra sudanesa «poderia criar a maior crise de fome no mundo», num país que vive já a mais importante crise de deslocação forçada de população do planeta. Os combates «ameaçam milhões de vidas, a paz e a estabilidade de toda a região», alertou nesta semana a directora executiva do PAM, Cindy McCain. Disse que há 20 anos a região sudanesa do Darfur «conheceu a mais grave crise de fome do mundo e o mundo juntou esforços para responder», mas que agora «os sudaneses são esquecidos».

Segundo relatos da imprensa africana, os bombardeamentos de populações com a utilização de aviões, drones e artilharia pesada, a destruição de infraestruturas civis, «terríveis violações e abusos», pilhagens, deslocações à força e aldeias incendiadas tornaram-se o quotidiano dos cerca de 48 milhões de habitantes. Se esta violência não cessar, «a guerra no Sudão poderá criar a maior crise de fome no mundo», avisa o PAM. E avança com dados impressionantes: actualmente, menos de cinco por cento dos sudaneses têm acesso a uma refeição completa por dia; e, segundo médicos no terreno, no campo de deslocados de Zamzam, no Darfur, morre uma criança de duas em duas horas. Mais: no Sudão do Sul, onde 600 mil pessoas se refugiaram para fugir à guerra, uma em cada cinco crianças nos centros de acolhimento transitório, na fronteira, sofre de malnutrição.

Ainda segundo o PAM, no Sudão vivem em insegurança alimentar aguda 18 milhões de pessoas, das quais cinco milhões atingiram o último patamar antes da fome e mal podem ser ajudadas pelos trabalhadores das organizações humanitárias, que têm dificuldades em deslocar-se e sofrem de falta de financiamento.

Perante tamanhas tragédias, no Sudão como na Palestina, em todos os lugares onde se travam sangrentos confrontos – que beneficiam sobretudo os senhores do «partido da guerra» e os fabricantes de armas –, é urgente ampliar e fortalecer a luta dos povos pela paz.




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