Álvaro Cunhal regressa a Portugal: «unidos venceremos»

Álvaro Cu­nhal foi re­ce­bido por uma mul­tidão à che­gada a Lisboa

Sobre os acon­te­ci­mentos do 25 de Abril de 1974, a Co­missão Exe­cu­tiva do Co­mité Cen­tral do PCP emitiu, nesse dia, um co­mu­ni­cado su­bli­nhando o ca­rácter ex­tra­or­di­nário dos acon­te­ci­mentos que es­tavam a ocorrer e ape­lando à uni­dade e luta do povo para que a li­qui­dação do fas­cismo e as trans­for­ma­ções de­mo­crá­ticas se con­cre­ti­zassem.

Por sua vez, o Se­cre­ta­riado do Co­mité Cen­tral do PCP, em co­mu­ni­cado de 26 de Abril de 1974, su­bli­nhava: «o PCP de­clara so­le­ne­mente que apoiará ac­ti­va­mente como vi­tó­rias da luta po­pular todas as me­didas con­cretas to­madas para a li­qui­dação do fas­cismo e a real de­mo­cra­ti­zação da vida po­lí­tica por­tu­guesa».

No se­gui­mento do 25 de Abril, por pressão das massas, logo nos pri­meiros dias da Re­vo­lução, ven­cidas re­sis­tên­cias à li­ber­tação de todos os presos po­lí­ticos, são li­ber­tados das pri­sões po­lí­ticas do fas­cismo cen­tenas de presos po­lí­ticos, in­cluindo nu­me­rosos di­ri­gentes e mi­li­tantes do PCP.

A 30 de Abril de 1974, re­gres­sava a Por­tugal Álvaro Cu­nhal, Se­cre­tário-Geral do PCP, que, no Ae­ro­porto de Lisboa, foi ca­lo­ro­sa­mente re­ce­bido e sau­dado pela im­pres­si­o­nante mul­tidão que aguar­dava a sua che­gada.

Re­fe­rindo-se ao 25 de Abril, ele que tinha de­di­cado toda a sua vida à in­ter­venção e à or­ga­ni­zação da luta contra o fas­cismo, vi­vendo a dura vida clan­des­tina e a prisão; ele que tinha dado um de­ter­mi­nante con­tri­buto para a or­ga­ni­zação do PCP; ele que foi um dos prin­ci­pais obreiros do pro­grama do PCP para Re­vo­lução De­mo­crá­tica e Na­ci­onal (apro­vado em 1965, no VI Con­gresso), que es­tava a acon­tecer, di­ri­gindo-se às massas ali con­cen­tradas, pro­feriu o dis­curso que aqui se re­produz.

«Amigos! Ca­ma­radas! No vosso aco­lhi­mento vejo a ex­pressão do apreço pela luta do Par­tido Co­mu­nista Por­tu­guês du­rante de­zenas de anos de ti­rania fas­cista. Nela vejo também a ex­pressão da con­fi­ança dos tra­ba­lha­dores e dos de­mo­cratas por­tu­gueses no papel que o Par­tido Co­mu­nista de­sem­penha no mo­mento ac­tual e tem a de­sem­pe­nhar nas trans­for­ma­ções de­mo­crá­ticas que se im­põem na vida po­lí­tica, so­cial e eco­nó­mica da nossa pá­tria.

A classe ope­rária, as massas tra­ba­lha­doras, a ju­ven­tude, todo o nosso povo, todos os de­mo­cratas e pa­tri­otas, os mi­li­tares, podem estar certos de que, nas novas con­di­ções hoje exis­tentes em Por­tugal, os co­mu­nistas con­ti­nu­arão a dar todas as suas ener­gias, e a vida se ne­ces­sário, na luta pela li­ber­dade, pela paz, pela ver­da­deira in­de­pen­dência na­ci­onal, pelas pro­fundas re­formas de­mo­crá­ticas que estão ao nosso al­cance.

Neste mo­mento é es­sen­cial:

  1. con­so­lidar e tornar ir­re­ver­sí­veis os re­sul­tados al­can­çados pelo Mo­vi­mento das Forças Ar­madas de 25 de Abril e nos cinco dias desde então de­cor­ridos;

  2. al­cançar todas as li­ber­dades de­mo­crá­ticas, in­cluindo a da acção legal dos par­tidos po­lí­ticos, e as­se­gurar o seu exer­cício;

  3. pôr fim ime­diato à guerra co­lo­nial;

  4. al­cançar sa­tis­fação das rei­vin­di­ca­ções mais ime­di­atas das massas tra­ba­lha­doras;

  5. as­se­gurar a re­a­li­zação de elei­ções ver­da­dei­ra­mente li­vres para a As­sem­bleia Cons­ti­tuinte.

São estes os ob­jec­tivos es­sen­ciais na hora pre­sente.

Re­a­fir­mamos que, no en­tender do Par­tido Co­mu­nista Por­tu­guês, a me­lhor ga­rantia para a re­a­li­zação de elei­ções li­vres seria a cons­ti­tuição de um go­verno pro­vi­sório com a re­pre­sen­tação de todas as forças e sec­tores po­lí­ticas de­mo­crá­ticos e li­be­rais. Re­a­fir­mamos que o Par­tido Co­mu­nista Por­tu­guês está pronto a as­sumir as res­pon­sa­bi­li­dades res­pec­tivas.

O mo­mento exige que se re­force na acção diária a uni­dade da classe ope­rária, a uni­dade das massas po­pu­lares – força mo­tora das grandes trans­for­ma­ções so­ciais; que se alargue e re­force na acção diária a uni­dade de todos os de­mo­cratas e pa­tri­otas e se de­sen­volva im­pe­tu­o­sa­mente a sua força or­ga­ni­zada; que se re­force a ali­ança, a co­o­pe­ração, a so­li­da­ri­e­dade re­cí­proca entre as massas po­pu­lares e os ofi­ciais, sar­gentos, sol­dados e ma­ri­nheiros de sen­ti­mentos de­mo­crá­ticos e li­be­rais.

A ali­ança do povo e dos mi­li­tares é, na si­tu­ação es­pe­ci­fica hoje exis­tente, uma con­dição es­sen­cial para o pro­gresso da de­mo­cra­ti­zação da so­ci­e­dade por­tu­guesa.

Pela nossa parte, tudo fa­remos para que se torne ir­re­ver­sível essa ali­ança, sol­dada desde o dia 25 de Abril até hoje.

Ca­ma­radas, os cinco dias pas­sados al­te­raram ra­di­cal­mente a si­tu­ação po­lí­tica no nosso país. Daqui quero saudar o Mo­vi­mento das Forças Ar­madas pela sua de­ci­siva in­ter­venção para o res­ta­be­le­ci­mento das li­ber­dades es­sen­ciais e a Junta de Sal­vação Na­ci­onal, que neste mo­mento de­sem­penha as fun­ções de go­verno.

Daqui quero saudar (e em vós e por vosso in­ter­médio o faço) a classe ope­rária, as massas tra­ba­lha­doras, que nunca se ver­garam à di­ta­dura e hoje par­ti­cipam ac­ti­va­mente na li­qui­dação do Es­tado Fas­cista e no em­pre­en­di­mento de me­didas de­mo­crá­ticas.

Daqui quero saudar todos os an­ti­fas­cistas e an­ti­co­lo­ni­a­listas, todos os de­mo­cratas, nossos ali­ados de longos anos.

Daqui quero saudar todos aqueles que so­freram per­se­gui­ções, foram presos, tor­tu­rados, pas­saram longos anos nas pri­sões e nas se­veras con­di­ções de clan­des­ti­ni­dade (e muitos ainda nela vivem, mas es­pe­ramos que em breve dei­xará de ser ne­ces­sária), todos aqueles lu­ta­dores mo­destos, apa­gados, que con­sa­graram os seus es­forços, as suas ener­gias, à luta contra a ti­rania, à causa da li­ber­dade.

Daqui quero lem­brar aqueles muitos que fi­caram pelo ca­minho, que lu­taram a vida in­teira mas não viram o sol da li­ber­dade, muitos as­sas­si­nados com tor­turas ou a tiro pelo odioso bando da PIDE-DGS, agora dis­sol­vida e ex­tinta.

É ne­ces­sário tudo fazer para que tais dias ne­gros não voltem! Se sou­bermos unir-nos e lutar, não vol­tarão!

As ta­refas que se co­locam ante nós não são fá­ceis. Mas es­tamos ha­bi­tu­ados às di­fi­cul­dades. Unidos, ven­ce­remos!

Amanhã, 1.º de Maio, jor­nada dos tra­ba­lha­dores, a classe ope­rária, as massas po­pu­lares, todos os que de­sejam a li­ber­dade, o fim da guerra, a ver­da­deira in­de­pen­dência da nossa pá­tria, mos­trarão a sua força imensa.

Es­tamos certos que a mos­trarão dando grande exemplo de se­re­ni­dade e de cons­ci­ência cí­vica e re­vo­lu­ci­o­nária.

Amigos! Ca­ma­radas! À classe ope­rária, a todos os tra­ba­lha­dores, a todo o povo por­tu­guês, à ju­ven­tude, às mu­lheres, aos ofi­ciais, sar­gentos e sol­dados, fa­zemos um apelo: unidos como os dedos das mãos, firmes, con­fi­antes, vi­gi­lantes em re­lação à re­acção que pode vir do pas­sado, olhos no fu­turo.

Avante para a con­quista de­fi­ni­tiva da li­ber­dade!

Avante para o fim pronto da guerra co­lo­nial!

Avante para a re­a­li­zação de elei­ções li­vres e a ins­tau­ração em Por­tugal de um re­gime de­mo­crá­tico es­co­lhido pelo pró­prio povo!»

 



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