Prosseguir a luta pela paz, o progresso e a soberania

Gustavo Carneiro

A ordem mun­dial «ba­seada em re­gras», de que falam os EUA, é a das suas re­gras, que já não con­se­guem impor

Há exac­ta­mente 79 anos, a 9 de Maio de 1945, ter­mi­nava na Eu­ropa o mais san­grento dos con­flitos mi­li­tares, a Se­gunda Guerra Mun­dial – que ceifou mais de 50 mi­lhões de vidas e pro­vocou danos ir­re­pa­rá­veis no meio am­bi­ente e no pa­tri­mónio ar­tís­tico e cul­tural de muitos dos países en­vol­vidos. Seria ne­ces­sário es­perar uns meses até à ren­dição do Japão, que ditou o fim das hos­ti­li­dades também na Ásia e no Pa­cí­fico.

São vá­rias as par­ti­cu­la­ri­dades que dis­tin­guem as duas guerras mun­diais. Se a pri­meira (1914-18) foi um tí­pico con­flito inter-im­pe­ri­a­lista por co­ló­nias, mer­cados e fontes de ma­té­rias-primas, e ao mesmo tempo uma forma de deter o mo­vi­mento ope­rário, a se­gunda foi tudo isso e mais: foi também a guerra de todo o im­pe­ri­a­lismo contra o único Es­tado so­ci­a­lista do mundo, a União So­vié­tica.

Neste ob­jec­tivo Hi­tler con­vergia com as classes do­mi­nantes das cha­madas de­mo­cra­cias oci­den­tais: a esta luz ficam mais claras as ra­zões que le­varam à pas­si­vi­dade cúm­plice com que per­mi­tiram o re­ar­ma­mento alemão; as re­cusas das pro­postas so­vié­ticas para conter o nazi-fas­cismo; a po­lí­tica de neu­tra­li­dade face à Guerra Civil de Es­panha, que con­duziu ao aban­dono da Re­pú­blica; e a traição de Mu­nique, que des­man­telou a Che­cos­lo­vá­quia e a en­tregou à Ale­manha, como forma de tentar en­ca­mi­nhar para Leste a ter­rível má­quina de guerra nazi-fas­cista.

A His­tória re­gista com dra­ma­tismo o re­sul­tado desta con­ver­gência.

Ventos eman­ci­pa­dores

A União So­vié­tica foi a grande obreira da vi­tória: foi na Frente Leste que a Ale­manha nazi perdeu a grande mai­oria das suas forças e so­freu as der­rotas de­ci­sivas; foi o Exér­cito Ver­melho que li­bertou pra­ti­ca­mente toda a Eu­ropa Ori­ental e Cen­tral, en­trou em Berlim e forçou a ren­dição das forças nazi-fas­cistas; foi sob in­fluência dos êxitos mi­li­tares so­vié­ticos que se cons­ti­tuíram em di­versos países mo­vi­mentos de re­sis­tência po­pular em que os co­mu­nistas as­su­miam um des­ta­cado papel.

O des­fecho da guerra e a na­tu­reza das forças que de modo mais des­ta­cado con­cor­reram para ele di­taram o mundo que se lhe se­guiu. Ao con­trário do pós-Pri­meira Guerra Mun­dial, com as con­di­ções di­tadas por ban­didos em Ver­sa­lhes (a de­fi­nição é de Lé­nine) e uma nova par­tilha do mundo pelos ven­ce­dores, nos anos que se se­guiram a 1945 so­praram ventos eman­ci­pa­dores: foram con­quis­tados im­por­tantes di­reitos pelos tra­ba­lha­dores; os povos dos países co­lo­ni­zados e de­pen­dentes lan­çaram-se na luta pela cons­trução de Es­tados in­de­pen­dentes; novas re­vo­lu­ções apon­taram à cons­trução do so­ci­a­lismo.

A guerra fria foi a forma que o im­pe­ri­a­lismo norte-ame­ri­cano (o do­mi­nante desde então) en­con­trou para tentar travar este mo­vi­mento li­ber­tador: a NATO e a chan­tagem nu­clear foram dois dos seus ins­tru­mentos.

As «re­gras» e o le­gado a de­fender

A si­tu­ação in­ter­na­ci­onal é, hoje, bas­tante di­fe­rente da­quela que emanou da vi­tória sobre o nazi-fas­cismo. As der­rotas do so­ci­a­lismo no final do sé­culo XX de­se­qui­li­braram a cor­re­lação de forças em favor do im­pe­ri­a­lismo, que pro­curou es­tender o seu do­mínio: a he­ge­monia eco­nó­mica norte-ame­ri­cana alargou-se, ci­lin­drando as eco­no­mias na­ci­o­nais, com con­sequên­cias dra­má­ticas para os povos.

Este im­pe­tuoso avanço teve, na­tu­ral­mente, o seu braço mi­litar: a NATO re­forçou o seu ca­rácter agres­sivo e alargou o seu âm­bito ge­o­grá­fico; as agres­sões mi­li­tares à Ju­gos­lávia, ao Afe­ga­nistão, ao Iraque e à Líbia cons­ti­tuíram rudes golpes no di­reito in­ter­na­ci­onal saído do pós-Se­gunda Guerra Mun­dial; a re­ti­rada uni­la­teral dos EUA de im­por­tantes acordos de con­trolo ar­ma­men­tista con­duziu a uma nova cor­rida aos ar­ma­mentos.

Hoje, com a sua he­ge­monia a ser co­lo­cada em causa pelo de­sen­vol­vi­mento e afir­mação de ou­tros países, no­me­a­da­mente a Re­pú­blica Po­pular da China, os EUA res­pondem como sabem: com a agu­di­zação de ten­sões, a mi­li­ta­ri­zação e a guerra. A «ordem in­ter­na­ci­onal ba­seada em re­gras», de que tanto falam, não é mais do que a das suas re­gras – que já não con­se­guem impor.

Como há 79 anos, cabe aos povos e às forças da paz e do pro­gresso so­cial travar os ím­petos mais agres­sivos do im­pe­ri­a­lismo e de­fender aquele que é, ainda, um dos mais im­por­tantes le­gados da vi­tória sobre o nazi-fas­cismo: a ideia de um mundo de Es­tados so­be­ranos e iguais em di­reitos, in­de­pen­dente do po­derio eco­nó­mico e mi­litar.

 



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