Intensificar a luta pelo aumento geral dos salários

Armando Farias

O aumento dos salários é determinante para combater a pobreza e dinamizar a procura

«A emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores»

(Karl Marx)

De dia para dia, agravam-se os problemas das famílias que não obtêm rendimentos suficientes para fazer face ao brutal aumento do custo de vida.

A afirmação do Partido de que o aumento geral dos salários constitui uma verdadeira emergência nacional funda-se no conhecimento da realidade: na dramática situação que atinge milhares de famílias, no aumento dos níveis de pobreza laboral, isto é, de milhares de trabalhadores que empobrecem mesmo a trabalhar, na profunda e crescente desigualdade entre capital e trabalho, ou seja, na crescente intensidade da exploração capitalista.

Os sucessivos governos do PS, PSD e CDS, além de decretarem medidas legislativas para conterem, ou mesmo cortarem nos salários nominais, como se verificou nos tempos da tróica, também usam e manipulam os indicadores da inflação e da produtividade para justificarem a desvalorização salarial. Foi com este pretexto, invocando a pandemia, a guerra e as sanções que o governo do PS impôs nos últimos anos, e mais uma vez, a redução real dos salários.

Porém, os lucros das grandes empresas e do sistema financeiro foram brutais em 2021, quando a inflação média desse ano se situou em 1,3%, e continuaram a aumentar em 2022, quando a inflação galopou para os 9,6% no final desse ano, a maior taxa de inflação dos últimos 30 anos.

No ano transacto, os seis maiores bancos a operar em Portugal lucraram mais de 11 milhões de euros por dia, enquanto as 16 empresas cotadas do PSI terão consolidado lucros de 5.513 milhões de euros, o valor mais elevado de sempre. Já este ano, só quatro bancos lucraram no 1.º trimestre 619,2 milhões de euros.

Constata-se, pois, que tem plena actualidade a tese de Karl Marx, segundo a qual esteja a inflação em queda ou em ascensão, o patrão não vai abdicar das elevadas taxas de lucro para seu proveito exclusivo e, por isso, impõe que sejam sacrificados os trabalhadores, seja na diminuição real dos salários, seja pela redução do emprego, seja pelo abaixamento das suas condições de trabalho.

Ao invés das opções dos sucessivos governos da política de direita, que invocam a inflação, a produtividade ou o défice de competitividade da economia portuguesa para atacar os direitos dos trabalhadores, desregular os horários de trabalho e manter o regime da caducidade da contratação colectiva, é o aumento dos salários que é determinante para combater a pobreza, dinamizar a procura e, em conjugação com o investimento tecnológico e o aumento da produção, constituir-se no factor essencial de melhoria da competitividade da economia.


Crescem as desigualdades salariais no quadro da política monetária europeia e do euro

Em vésperas de eleições para o Parlamento Europeu, importa ter presente que os trabalhadores portugueses também sofrem a exploração por via da posição que Portugal ocupa na divisão internacional do trabalho, particularmente no quadro da União Europeia.

Enterradas as ilusões sobre a mirífica terra do leite e do mel que adviria por um simples passo de mágica da adesão do nosso país à então CEE, o euro apareceu quinze anos mais tarde como um reforço vitamínico da propaganda neoliberal, mantendo o menu de ilusões, mas agora marcando a traço grosso a promessa de os trabalhadores portugueses passarem a ganhar salários e outras condições de trabalho iguais aos restantes trabalhadores da dita «Europa».

Contudo, todos sabemos o que aconteceu de lá para cá. Não só foi aprofundada a via federalista da UE, com brutal impacto na destruição de sectores básicos da economia nacional (indústria, agricultura, pescas), passando o País a importar o que antes produzia, como se acentuou a divergência salarial de Portugal, relativamente à média na UE.

«Em termos acumulados, os lucros brutos reais, corrigidos dos rendimentos dos trabalhadores por conta própria, aumentaram entre 2001 e 2022, cerca de 41% na União Europeia face aos 22,6% da compensação salarial real global, incluindo os encargos de segurança social.

(…) Em Portugal, a diferença é mais notória, com os lucros a crescerem 31,1% e os salários apenas 7,1%. Se tivermos em conta o mesmo período, a média de variação anual dos lucros líquidos, verificamos que o ritmo de crescimento foi bastante superior à dos salários reais por pessoa empregada. No caso de Portugal, o ritmo foi 33 vezes superior» (Pedro Carvalho, Inflação: um fenómeno do capitalismo e sua instrumentalização. Sessão Pública «Salário, Preço e Lucro – Uma Questão Actual». 23 Maio 2023, Lisboa).

Como se mostra, não é para impedir uma «espiral inflacionista», como referem o Governo e os grandes patrões, que os salários não aumentam, mas sim para garantir a espiral dos lucros dos grandes grupos económicos e financeiros.

Por mais que insistam na propaganda de uma nunca alcançada coesão social, ou sobre as falsas virtudes do Pilar Social Europeu, da Carta Social Europeia, das Cimeiras Sociais e outras balelas do género, a verdade impõe-se tal como ela é: dali não veio e nunca virá nada de bom para os trabalhadores, pelo contrário o que tem vindo são muitas directivas no sentido de impor em Portugal a desregulamentação do trabalho, a desregulação dos horários, a flexigurança traduzida em mais flexibilidade, polivalência, intensidade dos ritmos de trabalho e, claro, a desvalorização dos salários, ou seja, mais exploração.

Só há uma forma dos salários em Portugal convergirem com a média salarial da Zona Euro, que é aumentar significativamente quer o SMN quer o salário médio, aumentos que naturalmente têm de ser superiores aos aumentos do salário médio na Zona Euro até se alcançar uma real convergência.

Mas para que seja assim, só há um caminho. Lutar nas empresas e locais de trabalho, articulando a acção reivindicativa pelo aumento geral dos salários com a luta pela elevação do salário mínimo, a valorização dos salários e carreiras dos trabalhadores da Administração Pública, a revogação da caducidade da contratação colectiva e reposição do princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador, combater a precariedade.

Aumentar significativamente o salário médio

Em Portugal, os salários têm um peso reduzido nos custos totais das empresas, representando apenas 18,2% dos encargos. Apesar de serem os trabalhadores quem cria a riqueza, mantém-se uma tremenda injustiça na sua repartição. A expressão dessa injusta repartição do rendimento nacional, desfavorável ao trabalho, evidencia-se na perda de poder de compra do salário médio.

É preciso acabar com o modelo económico baseado em baixos salários, com a desregulação dos horários e o aumento da duração do tempo de trabalho. É preciso e urgente responder às necessidades dos trabalhadores e às suas famílias para enfrentarem o brutal aumento do custo de vida. É preciso garantir salários e condições de trabalho dignos a todos os que asseguram os serviços públicos aos mais variados níveis, assim como atrair e fixar profissionais em cuja formação qualificada e altamente qualificada o Estado investe.

O aumento geral dos salários, com o consequente aumento do salário médio e do salário mínimo, é uma medida justa, necessária, urgente e é possível. Além de contribuir para uma mais justa repartição da riqueza tem impactos positivos na produtividade, na dinamização do mercado interno, na criação de emprego e na obtenção de mais receitas para o Estado e a Segurança Social.

Conforme à norma constitucional, é função do SMN dar resposta às necessidades dos trabalhadores, garantir uma vida digna às famílias. Mas não é isso que tem acontecido. O inquérito do INE às Condições de Vida e Rendimento (INE/2023), regista um aumento da taxa de risco de pobreza, que se situou em 17% em 2022, sendo que o risco de pobreza da população empregada indicava 10%, numa clara demonstração que os baixos salários e em particular o baixo valor do SMN constitui uma das principais causas de pobreza.

Só com o aumento significativo dos salários, em particular do SMN, é possível: i) combater a pobreza, incluindo a pobreza infantil; ii) garantir a sustentabilidade da Segurança Social, para ter pensões mais elevadas no futuro; iii) dinamizar a economia; iv) garantir aos jovens condições de vida profissional, pessoal e familiar; combater a emigração de trabalhadores qualificados, em particular nos serviços públicos e nas funções sociais do Estado.

O aumento fixado pelo Governo para este ano é claramente insuficiente, não permitindo a reposição do poder de compra nem enfrentar o custo de vida, a agravar-se todos os dias na vida dos trabalhadores e das suas famílias.

Impõe-se a necessidade de avançar para o Salário Mínimo Nacional de 1000 euros em 2024, prosseguir a sua valorização nos próximos anos e concretizar uma trajectória de aproximação à média da Zona Euro.

 

No imediato, exige-se o aumento geral dos salários para todos os trabalhadores em 15% e um mínimo de 150 euros

 

Há 50 anos foi conquistado o primeiro Salário Mínimo Nacional

O Salário Mínimo Nacional (SMN) foi uma reivindicação do movimento sindical de antes do 25 de Abril, e uma das primeiras grandes conquistas após a Revolução, tendo sido consagrado como um direito fundamental inscrito na Constituição da República promulgada em 1976 (Art.º 59.º da CRP).

O valor do primeiro SMN foi fixado em 3300 escudos, em 27 de Maio de 1974, quando era ministro do Trabalho do primeiro Governo Provisório o membro do PCP Avelino Gonçalves. Mas se tivesse sido aumentado ao longo destes 50 anos, de acordo com o valor da inflação e com consideração do valor médio da produtividade na economia, e se não tivesse sido congelado entre 2011 e 2014, o seu valor seria hoje muito superior.

A conquista do Salário Mínimo Nacional representou uma significativa valorização do trabalho e repercutiu-se no aumento geral dos salários com consequências directas e imediatas na elevação das condições de vida dos trabalhadores.

 

No cinquentenário da Revolução de Abril, prosseguir a luta pela emancipação dos trabalhadores

É com o aumento dos salários que a vida melhora.

A vida tem mostrado que foi, é, e será sempre na luta reivindicativa, na unidade e mobilização dos trabalhadores, que se conquista melhores salários e se obtêm as respostas às suas justas reivindicações. A luta é justa porque há riqueza produzida pelos trabalhadores, mas está mal distribuída.

A vida também comprova que é na luta económica que os trabalhadores alargam o campo das suas reivindicações, reforçam a sua unidade e organização de classe, ganham consciência da importância da luta política contra a exploração.

Tendo presente as grandiosas manifestações do 25 de Abril e do 1.º de Maio, as centenas e centenas de milhares de manifestantes que inundaram as ruas, praças e avenidas de todo o país, os trabalhadores têm todas as razões para confiarem na força da unidade e da luta.

 



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