Orçamento, para que te quero

João Frazão

A gi­gan­tesca ope­ração mon­tada em volta do Or­ça­mento do Es­tado de 2025 pa­rece saída dos com­pên­dios de como as­se­gurar que se mantém tudo na mesma, pa­re­cendo que vem aí uma au­tên­tica re­vo­lução.

O ca­pital de­cide, a co­mu­ni­cação so­cial toca os trom­petes e os per­so­na­gens prin­ci­pais e os fi­gu­rantes dançam a moda que me­lhor convém aos pri­meiros.

O ca­pital de­cide que é pre­ciso as­se­gurar a ma­nu­tenção da po­lí­tica de di­reita. É isto que está em causa. Mas per­gunta-se se, para isso, é pre­ciso mudar muito os con­teúdos do Or­ça­mento de 2024, cujas li­nhas es­sen­ciais – de­gra­dação do poder de compra dos sa­lá­rios e pen­sões, ataque aos ser­viços pú­blicos e às fun­ções so­ciais do Es­tado, be­nesses e novas áreas de ne­gócio para o grande ca­pital, agra­va­mento da in­jus­tiça na dis­tri­buição da ri­queza, as­se­gu­rando mi­lhares de mi­lhões em lu­cros, com im­posto mí­nimo – não di­ferem do OE de 2023 e do de 2022. Claro que não, como se prova pelo facto do Go­verno PSD/​CDS estar a tomar me­didas, umas atrás das ou­tras, sem mexer no Or­ça­mento apro­vado apenas com os votos do PS, mas que servem na per­feição a tais ob­jec­tivos.

Cum­prindo o seu papel, a Co­mu­ni­cação So­cial dis­para per­guntas atrás de per­guntas, «vai votar contra?», «vai votar a favor?», «vai vi­a­bi­lizar?», «mas essa po­sição não é in­fle­xível?», «vai res­ponder ao apelo?», «vai par­ti­cipar na reu­nião?»... Não sa­tis­feitos, ac­ci­onam todos os co­men­ta­dores do cos­tume para fazer a aná­lise da im­por­tância da apro­vação do Or­ça­mento e da ca­tás­trofe que sig­ni­fi­caria um des­fecho con­trário. Ca­tás­trofe para quem, não dizem. Um or­ça­mento para quê e com que con­teúdos, nem querem falar disso.

Neste en­tretém, en­quanto os pro­ta­go­nistas se des­fazem em apelos “porque sim” e “porque a Eu­ropa, isto” e “porque a guerra, aquilo”, os fi­gu­rantes metem-se em bicos de pés para apa­recer, mesmo que seja à boca de cena, a fingir que têm al­guma im­por­tância.

Como sempre, cá es­ta­remos para lhes lem­brar, e para propor, que o OE só ser­virá se ga­rantir que se va­lo­rizam os sa­lá­rios, se me­lhora o SNS, se ga­rantem os pro­fes­sores para todos os jo­vens, se avança no di­reito à ha­bi­tação, se as­se­gura o in­ves­ti­mento, se res­ponde aos pro­blemas da flo­resta. Mas isso, para quem manda, não im­porta para nada.

 



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