Sopros, auriculares e os donos dos média

O espaço mediático concentrou-se, nos dias antes da apresentação da proposta de Orçamento do Estado pelo Governo, nas palavras do primeiro-ministro sobre o trabalho dos jornalistas. Montenegro, numa convenção dos maiores grupos económicos do sector (que aproveitou para anunciar o plano do Governo para a destruição da RTP), perante uma plateia de administradores e responsáveis editoriais dos maiores meios de comunicação social privados, falou em jornalismo «teleguiado», com perguntas que são sopradas aos jornalistas por auriculares e via SMS.

Primeiro, registe-se a cobardia: não só escolheu aquele cenário para anunciar o plano de ataque à estação pública (em resumo, um corte de quase 10% no seu orçamento e de uma dimensão que pode superar esse valor na sua força de trabalho, com um programa de despedimentos encapotados), mas acrescentou a censura ao trabalho dos jornalistas sem uma palavra para os responsáveis que tinha à sua frente – supõe-se que aqueles que sopram do outro lado do auricular ou do telemóvel.

Dizem os mais versados em campanhas de desinformação que a polémica não surgiu de uma afirmação destemperada de Luís Montenegro, mas que constituiu uma cortina de fumo para não discutir a gravidade do que o Governo ali anunciou. Talvez seja injusto imputar a Montenegro ou aos cérebros da comunicação governamental tal génio maquiavélico, mas, a julgar pelo efeito, os mais cínicos terão razões para desconfiar.

Ao final do dia, a polémica agudizou-se, com o primeiro-ministro a ser entrevistado em horário nobre na SIC por Maria João Avilez, alguém que ficou sem carteira profissional de jornalista por violação do código deontológico da profissão. Mais uma vez, muito se discutiu sobre a sua condição de jornalista encartada e pouco ou nada sobre a sua sobejamente conhecida (e patente na entrevista) condição de partidária da direita e dos interesses do capital, com ou sem cartão.

A semana terminou com a inauguração do mural colectivo de azulejos, promovido pelo PCP, em Lisboa, no âmbito das comemorações do 50.º aniversário da Revolução de Abril. É um projecto único, uma oferta generosa às cidades de Lisboa e do Porto que, na sua concepção, revela a concepção da arte e da cultura pelo PCP, não como mero produto mercantil ao serviço da ideologia dominante, mas como parte integrante da democracia que propomos, em que a criação individual se torna obra colectiva e ocupa o espaço público. Mas nada disto teve espaço em nenhum jornal ou em qualquer estação de televisão. E isto aconteceu por opção editorial dos mesmos – contrastante até com o interesse visível em todos os que participaram na iniciativa (jornalistas incluídos).

Não terá sido pelo auricular e não se conhecem as SMS trocadas a este propósito, mas a verdade é que, enquanto nenhuma peça televisiva sobre o mural via a luz do dia, ao longo daquele domingo se multiplicavam “notícias” e painéis de comentário sobre os tweets de Montenegro. Tudo isto nos leva de volta ao cinismo: haverá mesmo quem sopre em auriculares, mas estes parecem estar pendurados nos ouvidos das direcções editoriais e, porventura, até em São Bento.

 



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