Agenda de quem?

João Frazão

Na sequência da operação policial no Martim Moniz, diversos dirigentes partidários vieram acusar o Governo de ceder à agenda do Chega. Politólogos diversos alinharam pelo mesmo diapasão e o Público escreveu mesmo que «a Aliança Democrática (AD) tem governado e legislado com especial enfoque nas áreas da segurança e da imigração, duas bandeiras do Chega».

Tal teoria, não correspondendo à verdade, enferma de um perigo para o qual é preciso alertar os mais incautos.

Em primeiro lugar, sublinhemos que tal teoria é falsa porque não se trata aqui de ir à procura de temas, agendas ou bandeiras – como se queira –, de tal ou tal força política, contrários, ou pelo menos distintos, das suas próprias opções.

No projecto reaccionário que norteia o PSD e o CDS, e o governo que juntos protagonizam, os interesses do grande capital estão em primeiro lugar e esses precisam não apenas de trabalhadores migrantes («os novos portugueses») para servir de mão-de-obra barata e disponível para os seus negócios, como de estimular a divisão e o ódio para (virando-os aleatoriamente contra a parede em rusgas montadas para o efeito) distrair as atenções da exploração que procura intensificar a cada dia que passa. Por isso é que o projecto da direita e da política de direita inclui, seja directamente em Portugal seja de forma indirecta a partir da União Europeia, barreiras inaceitáveis com consequências como as que diariamente vemos, por exemplo, no Mediterrâneo.

O projecto reaccionário da direita precisou foi de tempo para trazer à luz do dia, por exemplo, medidas que promovem a ilegalidade dos imigrantes, com o fim da chamada manifestação de interesse ou que estigmatizam os cidadãos estrangeiros que usam o Serviço Nacional de Saúde, sem apresentar os dados que comprovem as situações de abuso que diz serem generalizadas. E é exactamente por isso que é perigoso dizer que o Governo da AD está a tomar bandeiras do Chega.

Porque, na verdade, o Governo não está a fazer o que o Chega gostaria que se fizesse, para agradar aos eleitores deste sucedâneo de PSD e CDS. O Governo está a aproveitar-se desse pretexto para fazer exactamente aquilo que está na sua opção de fundo.

Porque o que o Governo devia fazer, e não faz, era assegurar a digna integração de todos os imigrantes que Portugal consiga receber, ou garantir, em todos os lugares, o policiamento de proximidade, articulado e em diálogo com as populações.



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