Voto útil? Mas útil para quem?

Sempre que o PS pediu votos à esquerda usou-os para a política de direita


1.
As eleições de 18 de Maio constituem uma oportunidade para afirmar um caminho para o País que o desamarre de um rumo imposto, ano após ano, por sucessivos governos que fazem da política de direita o eixo da sua orientação e opções. Uma oportunidade aberta com a interrupção da acção de um governo que, descredibilizado por sucessivos casos e acontecimentos, tem na natureza e objectivos da sua política a razão principal pela qual a sua demissão constitui por si um factor positivo, para a qual concorreu a luta dos trabalhadores e a determinação do PCP para se lhe opor e dar combate. É essa oportunidade que se impõe transformar em possibilidade contra a qual se jogará, a partir de quem suporta e beneficia da política dominante, todo o arsenal de meios para o tentar impedir.

2. O que está por diante neste combate que agora se enfrenta não é apenas um confronto estritamente eleitoral, em si mesmo importante, com implicações no que de mais imediato decidirá do rumo da vida política. É um confronto mais decisivo, ainda que com desfecho menos imediato, entre opções opostas e distintas sobre o futuro do País que queremos construir, um confronto que opõe os que, como o PCP e a CDU, inscrevem sem tibieza a ruptura com a política de direita e a construção de uma política alternativa enquanto condição para abrir perspectivas de construção de um Portugal soberano que garanta um futuro de bem-estar à maioria do seu povo e os que, por outro lado, sob diversas formas querem prosseguir e intensificar essa política ao serviço de uma minoria que se apropria da riqueza criada, semeia injustiças e desigualdades, reduz direitos, cerceia a vida melhor a que todos aspiram.

Um confronto que no plano mais imediato e no terreno em que se trava – o eleitoral – exige um escrutínio informado e livre, determinado a partir dos interesses do que a cada um importa para as suas vidas. Um escrutínio que exige por antecipada prevenção que as opções e escolhas que marcarão o futuro próximo se faça com a observação do que foram no passado as práticas e posicionamentos dos que agora não hesitarão em defender e prometer o que antes ou não assumiram ou o inverso fizeram. Um escrutínio indispensável a uma decisão consciente e esclarecida que obriga a afastar preconceitos, a não soçobrar à demagogia e a promessas fáceis, a resistir ao elenco de expressões de diversão que animam saídas ilusórias que só contribuem para desfocar e desviar do que é solução, a rejeitar pressões induzidas por sondagens e falsas disputas bipolarizadoras, a não se deixar arrastar por exercícios de sedução que em nome de suposta eficácia aritmética só somam para afastar das opções que verdadeiramente contam para dar solução aos problemas. Um escrutínio esclarecido que o poder instalado procura turvar não apenas pelo que dele pode resultar no tempo próximo mas, sobretudo, pelo que daí decorrerá com mais largo alcance de descoberta da política e das opções necessárias à construção de um rumo diferente. Um escrutínio que encontrará, resistindo e ultrapassando obstáculos e manobras diversas, na intervenção do PCP e na clareza e coerência das suas opções e projecto a contribuição necessária a uma decisão aferida a partir das aspirações de quem tem na sua mão e no seu voto a força de decisão e não a partir do ruído dispersivo para o afastar do que realmente importa para as suas vidas.

3. Num quadro em que proliferarão elementos de diversão, não deixemos desfocar o que é essencial: dia 18 de Maio não basta derrotar a direita, é indispensável derrotar a política de direita. Uma afirmação que incorpora um objectivo e uma prevenção. Tão mais necessária quando por aí se anima essa dimensão de eleição reduzida a uma disputa bipartida, a fabricados vaticínios sobre quem ganha ou fica à frente, à recorrente adulteração do objectivo eleitoral em torno de um putativo primeiro-ministro, de verbalizações mais ou menos descaradas sobre inutilidade de voto em função da dimensão do círculo eleitoral. A que se acrescenta a exercitada argumentação introduzida por quem, à boleia dessa redutora e falsa disputa a dois – supostamente representando “esquerda” e “direita” –, se arma em procurador de um posicionamento cuja prática, opções política e programa não autoriza.

Dia 18, derrotar PSD e CDS – e com estes os que partilham dessa agenda reaccionária e de retrocesso – é um objectivo necessário, objectivo para o qual os votos na CDU contarão por inteiro. Mas as respostas e soluções de que o País precisa exige que a essa derrota não corresponda a recuperação pelas mãos do PS dessa mesma política de direita. Objectivo este só possível com o reforço do PCP, com a fixação de todos quantos aspiram a uma ruptura com as opções e rumo do governo do PSD/CDS e dos governos do PS, no apoio à CDU, a força que com clareza e coragem afirma uma política alternativa, dá combate às forças reacionárias, não pactua com a direita, dá garantias de que os seus votos e a sua força não acabem ao serviço da direita, da sua agenda e objectivos.

4. Dia 18, mais força à CDU: é essa a opção de todos quantos aspiram a uma política patriótica e de esquerda. Uma opção assumida pelo valor e coerência das suas propostas, pelo inabalável compromisso com os trabalhadores e o povo, pela garantia de que essa força conta sempre e sem vacilações para soluções e política de esquerda.

O PCP, e a luta dos trabalhadores e do povo, deu combate decisivo ao governo PSD/CDS, à sua política e aos seus projectos. Fê-lo desde o primeiro momento e sem hesitações. Deu uma contribuição decisiva para a clarificação da situação política com a sua moção de censura. Uma contribuição para derrotar um governo não só pelo que tinha em curso contra direitos e condições de vida da maioria do povo como, sobretudo, pelos projectos já anunciados de novos ataques ao direito à saúde, de assalto ao sistema de segurança social, de restrição de direitos dos trabalhadores, de mais privatizações. A direita combate-se com clareza e coerência, não com quem, em palavras, afirma ser esse o seu objectivo, mas que na prática compartilha muito do que de essencial é a sua agenda política e em momentos decisivos opta pela cumplicidade com os que diz combater. Enfrentar a direita – o que ela representa, a política que a acompanha, os projectos reaccionários e antidemocráticos que no seu seio assomam – exige coragem, coerência e clareza. Exige que se lhe não dê espaço e credibilidade. A direita combate-se enfrentando-a, não estendo-lhe a mão para antecipados acordos, seja em nome de estabilidade ou reformas de regime.

5. A derrota da direita e da sua política não se faz desviando votos da CDU em nome de uma qualquer armadilha aritmética em que, somadas as partes, no resultado apurado a parcela sobrante seria a da política de direita. Essa são as contas que podem interessar ao PS, que lhe darão a base para prosseguir no essencial a mesma política de PSD e CDS, com ou sem “acordo de cavalheiros”, mas que não servem todos quanto aspiram a uma política alternativa, patriótica e de esquerda.

Antecipemos, à cautela, a acusação recorrente de que se faz do PS o adversário principal, rejeitando-a. O PCP dá combate como nenhum outro à direita, à sua política e projectos. Não confundimos adversários, não perdemos de vista o que combatemos, não hesitamos de lado nesse confronto de classe que opõe Trabalho e Capital, não amalgamos o que não é exactamente igual. Mas isso não significa que ignoremos o que a cada um deve ser assacado a partir da sua prática e projecto. E, sobretudo, que se assista calado a esta tentativa de em nome de uma disputa eleitoral para combater a direita apelar a votos que em vez de dar força a uma política de esquerda acabarão no apoio a soluções de direita.

6. Não é de hoje nem de ontem este exercício de procurar atrair apoios à esquerda para suportar opções de direita. Sempre que o PS pediu votos à esquerda usou-os para a política de direita. Hoje como no futuro, o voto no PS não dá garantias de uma política de esquerda, desde logo porque o PS não assume essa opção. O que a vida mostra é, pelo contrário, quanto mais força tiver, mais livre ficará para promover a política que diz combater.

Não são acusações infundadas. É a vida e a prática do PS que o testemunham. Em vários planos. No plano da identidade de opções políticas como as que PSD e CDS assumem. Foi assim com o seus mais recentes governos, em particular o de maioria absoluta. Um governo que favoreceu a acumulação pelos grupos económicos, que atacou serviços públicos e acentuou o desmantelamento do SNS, que negou a valorização de salários e carreiras, que recusou repor direitos laborais, que não deu resposta aos problemas da habitação. Um governo PS que moldou um Orçamento do Estado deixado por herança ao governo PSD/CDS que lhe sucedeu e o assumiu, identificando nele estrutura e critérios sobe os quais prosseguiu as opções aí inseridos.

No plano da inconsequência no enfrentamento da direita, como se pode comprovar o voto no PS nem sequer é um voto que conte para combater a direita. Não é preciso recuar no tempo para se perceber com o que se conta com o PS para esse objectivo. Registe-se o seu posicionamento face ao governo da AD e de Montenegro. Não fosse o caso da empresa familiar do primeiro-ministro e o governo do PSD/CDS contaria com o suporte do PS até ao fim da legislatura. Como aliás o próprio PS não se cansou de lembrar – viabilização do programa do governo opondo-se à moção de rejeição apresentada pelo PCP, viabilização do Orçamento do Estado para 2025, incluindo com nova e intolerável benesse aos grupos económicos com redução do IRC, aprovação de uma Lei de Solos com o que abre de portas a uma ainda maior especulação, rejeição de duas moções de censura ao governo, impedimento de criação de uma comissão de inquérito ao escândalo que a privatização da ANA representa -, não foi por falta de apoio que encontrou dificuldades para governar. Como se prova não era o prosseguimento da política de Montenegro e da AD, as suas opções e consequências que tiravam o sono ao PS.

E assim é no plano da total falta de garantias futuras. Se assim foi no passado, assim se perfila para diante. O PS pede hoje votos em nome de valores e opções de esquerda, mas acena já junto do PSD com apelos à “reciprocidade” para garantir, em nome de uma suposta estabilidade, a viabilização de governos. Não se trata de um formalismo. A proposta encerra uma concepção e destapa uma confissão: a de que o PS está disponível para dar espaço e condições a um futuro governo PSD/CDS e às suas políticas; e o implícito reconhecimento que PSD e CDS não terão razões para ver na governação do PS algo de muito diferente do que se propõe realizar. Uma reciprocidade que tem uma dimensão política baseada em comprometimento e cumplicidade que fica assinalada.

7. Não mimetizando posições, nem desconsiderando diferenças, não se pode deixar de assinalar a convergência significativa em matérias essenciais entre o que PS e AD apresentam nos seus programas. Em matéria salarial, e remetido por ambos para 2029 um valor para o salário mínimo nacional separados por 10 euros (1.100 e 1.110 euros) quando em Espanha já hoje está fixado em quase 1.200 euros (1.184 euros); em matéria laboral e de direitos dos trabalhadores a opção do PS em colocar na mão da concertação social (ou seja, na mão das confederações patronais) a reposição de direitos essenciais, como o da contratação colectiva e tratamento mais favorável que continuam a ser usados para comprimir direitos e pressionar salários; a assumpção das PPP e do que elas constituem no caminho de privatização da saúde e da destruição e desmantelamento do SNS; a recusa de opções claras no plano da defesa do direito à habitação seja na protecção ao arrendamento, seja na imputação à banca e aos seus lucros na aquisição de habitação.

O voto e o poder que ele dá a cada um para o exercer tem de ser medido por aqueles que são os seus interesses, a avaliação informada do que cada um propõe aferido não apenas pelo que agora se promete, mas pelo que antes fez. Soa a falso propor-se agora o alargamento dos direitos de maternidade e paternidade quando ainda há pouco não se aprovou o projecto do PCP nesse sentido; não é credível tomar como séria a proposta de redução do IVA na energia ou nas telecomunicações quando antes se a recusou; não se pode tomar como bons compromissos sobre condições de trabalho quando se acabou por rejeitar o combate a desregulação de horários, a protecção face ao trabalho por turnos ou nocturno.

8. A invocação, agora para fins distintos do que representou, do período da legislatura de 2015 a 2019 exige, para evitar instrumentalizações indevidas, esclarecimento e precisão. Até porque a avaliação séria do que representou, e não do que se lhe atribui, confirma tudo o que agora se afirmou .Se há algo a reter desse período, sinalizemos o que deve ser retido: Primeiro, o que ele confirmou da coragem e determinação do PCP em se opor ao prosseguimento do projecto de destruição que Governo PSD/CDS e Troika tinham em curso, num quadro em que o PS, lembre-se, já se havia rendido e conformado com a sua continuação; segundo, o que esse período confirmou da clara postura de resistência do governo minoritário PS a uma real mudança de política que rompesse com a política de direita e abrisse um caminho alternativo, postura que logo que as circunstâncias lhe permitiram o reconduziu em pleno à essência das suas opções de classe; terceiro, a inequívoca e comprovada relação entre as possibilidades de fazer a vida da maioria andar para a frente com reposta e soluções distintas daquelas que nos querem vender como inevitáveis, e aquela que é a força e influência do PCP e do seu peso na vida política.

9. Como de início se referiu, as eleições de 18 de Maio são um momento de escolhas sobre resposta e soluções para os problemas, uma oportunidade para abrir perspectivas de uma política diferente, uma expressão de confronto de opções que têm e terão presença nesse combate mais amplo por esse caminho alternativo que se impõe construir no nosso País. Um caminho que não dispensando a resposta a todas e cada uma das batalhas que enfrentamos, sejam as eleitorais seja a luta dos trabalhadores e do povo, exige a afirmação do projecto de sociedade do Partido e do que ele incorpora de transformação social e económica, de desenvolvimento, progresso e justiça social, de soberania e de paz, de cumprimento integral dos direitos inscritos na Constituição.

 



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