Os salários, as reformas e as pensões não acompanham o vertiginoso aumento do custo de vida que se tem verificado nos últimos anos. Os parcos e pontuais aumentos nos rendimentos de quem trabalha ou trabalhou uma vida inteira não chegam para enfrentar a perda de poder de compra, particularmente sentida quando estão em causa bens e serviços essenciais. Enquanto isso, os lucros – acumulados por uns poucos – não param de crescer e atingem valores exorbitantes.
A habitação é um dos principais desafios. Não tanto pela falta de casas, mas sobretudo pela falta de casas que as pessoas possam pagar. São as rendas que, à mercê da desregulação do mercado e dos interesses privados, atingem níveis inéditos de especulação, ficando inacessíveis para as possibilidades de um grande número de pessoas. Nos casos de habitação própria, o cenário não é mais favorável, com as taxas de juro do crédito à habitação transformadas em verdadeiros garrotes à volta do pescoço das famílias – ao mesmo tempo que, juntamente com comissões e taxas, engordam os já elevados lucros da banca.
Viver para trabalhar e trabalhar para empobrecer
Pondo de lado a questão fundamental da habitação, são também as despesas com o gás, a água, a electricidade, as telecomunicações, a alimentação, os medicamentos, a saúde, a educação e outros serviços, que desregulam os orçamentos dos trabalhadores. Tudo isto aumentou acima, muito acima, das actualizações verificadas nos salários e nas pensões, que cada vez valem menos.
De acordo com o Inquérito Quinquenal às Despesas das Famílias realizado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), entre 2022 e 2023, 64 por cento da despesa média das famílias é gasto com habitação, água, electricidade, gás, combustíveis, alimentação e transportes: ou seja, por cada 100 euros de rendimentos destas famílias, pelo menos 64 são gastos nestas despesas fixas mensais. Sobram apenas 34... Mais: 29 por cento das famílias não têm capacidade financeira para assegurar o pagamento imediato de uma despesa inesperada próxima do valor mensal da linha de pobreza (cerca de 632 euros).
No caso das despesas com alimentação, verifica-se que o seu peso no total das despesas familiares diminui à medida que o rendimento aumenta: ou seja, as famílias de mais baixos rendimentos consomem grande parte do seu orçamento com alimentação…
Pagas todas as contas, a renda ou o empréstimo à habitação e todas as restantes despesas, o que sobra no final do mês para viver, para aceder à cultura, ao desporto e ao lazer? Muito pouco e é grave: de acordo com o mesmo inquérito, 1 milhão e 600 mil famílias (35,4 por cento do total) não têm, por exemplo, capacidade financeira para pagar uma semana de férias por ano, fora de casa, suportando a despesa de alojamento e viagem para todos os membros do agregado.
E se não houvesse SNS?
As famílias portuguesas gastam, em média, 919 euros anuais com saúde. A maior parcela destina-se à aquisição de medicamentos e produtos de saúde. No entanto, 12 por cento dos agregados (502 mil) têm despesas com saúde superiores a 10 por cento do seu rendimento monetário total. Este indicador é mais elevado nas famílias com idosos e, especialmente, com pessoas idosas a viver só (20,4 por cento), mas também nas famílias com dois ou mais adultos, em que pelo menos um é idoso (16,9 por cento).
Estes valores confirmam que o processo de desmantelamento do Serviço Nacional de Saúde, há muito em curso, leva muitas famílias a terem de recorrer ao sector privado e a gastar parte considerável do seu parco rendimento em despesas com saúde – medicamentos, consultas, exames, tratamentos. Também neste caso, quem menos tem sofre mais: 28,7 por cento das famílias com rendimentos anuais até 9310 euros e 20,4 por cento das que auferem entre 9310 e 18620 euros, gasta mais de um décimo do seu rendimento total em saúde. Nas famílias com maiores rendimentos, este valor é de apenas quatro por cento.
Ter filhos não pode ser um fardo
Uma análise detalhada à despesa anual média segundo a composição dos agregados familiares mostra por que razão Portugal enfrenta um sério problema de natalidade: ter filhos – financeiramente falando, claro – é muitas vezes um «fardo» incomportável para as jovens famílias.
Vejamos: os agregados com crianças dependentes suportam em média uma despesa anual 47% superior à despesa anual suportada pelos agregados familiares sem crianças dependentes. Em termos absolutos este comportamento verifica-se em todas as diferentes despesas familiares, sendo que é nas despesas com educação que se verifica a maior disparidade entre os dois tipos de agregados familiares em análise, com gastos quase 10 vezes superiores nos que incluem crianças dependentes.
Toda esta situação se soma à instabilidade laboral e habitacional e está directamente relacionada com os baixos salários praticados no País ou com a ausência de serviços de apoio, como a rede pública de creches gratuitas que o PCP propõe. Esta situação seria ainda mais grave se não fosse a gratuitidade dos manuais escolares ou dos passes intermodais para jovens, conquistada graças à proposta (e à persistência) dos comunistas.
Lucros escandalosos
A perda de rendimentos reais e de poder de compra não é a realidade de todos no País. Persiste uma pequena, mas muito influente e poderosa minoria que continua a encher os bolsos à custa de quem trabalha, põe o País a funcionar e produz toda a riqueza. Olhemos para o mais escandaloso dos casos: o da banca.
Em 2024, os grupos do Sistema Bancário Português acumularam, em resultados líquidos, cerca de 6323,3 mil milhões – resultados inéditos na história do País. Já nos últimos quatro anos, entre 2021 e 2024, as mesmas instituições arrecadaram (depois de pagos os impostos) 17,1 mil milhões de euros. Em 2024, os cinco maiores bancos a operar em Portugal (CGD, Santander, BCP, BPI e Novo Banco) acumularam, por dia, 13,6 milhões de euros.
Ainda que com valores diferentes, o mesmo sucedeu com outras grandes empresas e multinacionais: a Jerónimo Martins, com 599 milhões de euros; a Sonae, com 285 milhões; a EDP, com 825 milhões; a GALP, com 1169 milhões. Enquanto isso, e por causa disso, cada vez se pagava mais para comer, para as deslocações, para tomar banho, cozinhar ou aquecer a casa.
Os sacrifícios da maioria estão nos bolsos dos accionistas dos grupos económicos. É importante que nos lembremos disto quando nos disserem – como vão dizer, uma e outra vez – que «não há dinheiro» para aumentar salários e pensões e valorizar serviços públicos. E que não venham também com a conversa de que «as empresas» não aguentam aumentos salariais, pois a maioria das empresas portuguesas são micro, pequenas e médias empresas que vivem, fundamentalmente, do mercado interno – ou seja, dos salários e das pensões. Para além disso, a maior parte das suas despesas relaciona-se com energia, telecomunicações e transportes, pelo que é aí – precisamente nos interesses dos grupos económicos – que há que intervir para defender a maioria das empresas portuguesas.
O PCP propõe
• aumento do Salário Mínimo Nacional, já em Julho de 2025, para mil euros e o aumento geral dos salários em 15%, com 150 euros no mínimo para todos os trabalhadores.
• aumento extraordinário das reformas e pensões para todos os reformados e pensionistas, com efeitos ao início do ano, com 5% de aumento com o mínimo de 70 euros em todas as reformas e pensões.
• controlo do preço da botija de gás em 20 euros e dos bens alimentares essenciais e baixa para 6% da taxa de IVA na electricidade, gás e telecomunicações.
• reduzir os impostos indirectos, desde logo o IVA dos bens e serviços essenciais.
• eliminar os benefícios fiscais para os grupos económicos e revogar a baixa da taxa de IRC.