Gente que conta

Manuel Gouveia

Deixo aqui três breves notas sobre a luta nos portos por­tu­gueses, neste 29 de No­vembro que é o dia da pri­meira vo­tação na As­sem­bleia da Re­pú­blica da pro­posta de al­te­ração ao re­gime do tra­balho por­tuário e quando se re­a­liza a ma­ni­fes­tação in­ter­na­ci­onal con­vo­cada pela Frente Sin­dical Ma­rí­timo-Por­tuária contra essa mesma pro­posta.

Pri­meiro, para su­bli­nhar o que está em causa: o Go­verno pre­tende fazer re­gressar o tra­balho por­tuário ao tempo das praças de jorna, le­ga­li­zando re­gimes de pre­ca­ri­e­dade pi­ores do que os con­tidos no Có­digo de Tra­balho e dando carta aberta aos pa­trões para ins­ta­larem a sel­va­jaria la­boral. No es­sen­cial, a mo­der­ni­dade de que falam é fazer o sector re­gressar aos tempos em que os es­ti­va­dores se amon­to­avam à porta da «Casa do Conto» e men­di­gavam o di­reito a serem ex­plo­rados por um dia: «conte-me!», «conte-me!», «conte-me!»...

Se­gundo, para re­cordar que este sector, es­tra­té­gico para a eco­nomia na­ci­onal, até es­tava em contra-ciclo, ou seja, es­tava a crescer, com as em­presas pri­vadas do sector e as pú­blicas ad­mi­nis­tra­ções por­tuá­rias a re­gis­tarem lu­cros cres­centes. Até que as «troikas» de­ci­diram que era Por­tugal quem de­veria servir de pi­o­neiro no ataque aos di­reitos dos tra­ba­lha­dores por­tuá­rios na Eu­ropa, «cus­tasse o que cus­tasse... aos por­tu­gueses!». E claro, os pa­trões e o Go­verno, am­pli­fi­cados pela co­mu­ni­cação so­cial que do­minam, re­clamam há meses contra o facto de os tra­ba­lha­dores por­tuá­rios se re­cu­sarem à pa­trió­tica res­pon­sa­bi­li­dade de se ajo­e­lharem!

Ter­ceiro, para des­tacar que a luta nos portos, como a manif. de hoje, de­corre num quadro de uni­dade na acção e so­li­da­ri­e­dade de classe exem­plar. Desde 15 de Agosto, apesar da lei do tra­balho por­tuário apontar di­rec­ta­mente aos es­ti­va­dores por­tu­gueses, um vasto con­junto de ou­tros tra­ba­lha­dores do sector – pi­lotos da barra, con­trolo cos­teiro, ad­mi­nis­tra­ções por­tuá­rias, etc. – têm re­a­li­zado lutas e greves de so­li­da­ri­e­dade, tal como es­ti­va­dores de di­versos ou­tros países.

Três notas que po­de­ríamos re­sumir numa ideia final: os tra­ba­lha­dores por­tu­gueses não mais pe­dirão para ser con­tados – sabem que contam! E unidos e na luta, contam muito!



Mais artigos de: Opinião

Os estigmas

«É necessário olhar para o que esquecemos nas últimas décadas e ultrapassar os estigmas que nos afastaram do mar, da agricultura e até da indústria, com vista a produzirmos mais, em maior gama e quantidade, produtos e serviços que possam ser dirigidos aos mercados...

Tic-tac, tic-tac, tic-tac

Parafraseando um «spot» publicitário que esteve em voga há uns anos a uma marca de desodorizante, poder-se-á dizer: e se de repente alguém lhe oferecer um subsídio em duodécimos isso é... uma fraude. No caso vertente – e sem juízos de valor sobre o...

Dois apontamentos sobre uma grande<br> grande greve geral

A greve geral de 14 de No­vembro foi um passo adi­ante na evo­lução da si­tu­ação po­lí­tica e so­cial por­tu­guesa. Foi uma greve his­tó­rica, pela di­mensão que atingiu – e de que as duas úl­timas edi­ções do Avante! deram conta –, pelas con­di­ções em que se re­a­lizou e pelos ob­jec­tivos co­lo­cados.

Um su­cesso in­des­men­tível, apesar dos es­forços para a me­no­rizar. Uma grande greve geral, que teve con­ti­nui­dade na ma­ni­fes­tação de dia 27 na As­sem­bleia da Re­pú­blica e que se de­sen­vol­verá também nas ma­ni­fes­ta­ções con­vo­cadas pela CGTP-IN para 8 e 15 de De­zembro no Porto e em Lisboa, res­pec­ti­va­mente.

Idade Média

A nova guerra de Israel contra Gaza foi – como em 2009 – um massacre de civis. Por muito que a comunicação social fale dos «rockets sobre Israel», um tenebroso balanço não deixa margem para dúvidas sobre quem são as reais vítimas. De 163 mortos, 156...

A «conjuntura»

Em todas as línguas há palavras-chave. «Conjuntura» é uma delas, no léxico político nacional. Foi estreada por Mário Soares, quando em 1976 assumiu o I Governo Constitucional saído da Revolução de Abril de 1974 e nunca deixou de crescer. Ao...