A invenção das armas nucleares
A possibilidade de libertar energia nuclear foi descoberta pouco antes dos inícios da Segunda Guerra Mundial por cientistas Europeus, sobretudo Alemães e Ingleses. Em 1942, foi concebido e decidido pela Administração norte-americana o projecto de invenção e fabrico de armas com combustíveis nucleares, cerca de um milhão de vezes mais potentes que os combustíveis e explosivos químicos tradicionais.
Esse projecto denominado Manhattan, dirigido pelo general Leslie Groves e o físico Robert Oppenheimer, foi realizado por uma equipa de dezenas de alguns dos melhores cientistas norte-americanos, vários deles Europeus emigrados nos EUA, em colaboração com cientistas Ingleses e Canadianos; os laços de cumplicidade político-militar entre os EUA e o RU seriam mantidos desde então até à actualidade. O projecto foi conduzido secretamente nos Laboratórios de Oak Ridge e de Los Álamos, e em Hanford e algumas outras instalações mais, mobilizando mais de cem mil trabalhadores que desconheciam os objectivos concretos de tal projecto militar e secreto.
O complexo responsável pelo programa nuclear alargou-se depois ainda mais. As principais variações ensaiadas na concepção das bombas foram a forma química/metalúrgica e a combinação proporção/geometria entre combustíveis físseis (plutónio e urânio) e fusíveis (deutério e trítio). A evolução procurou incrementar o poder explosivo; da primeira bomba operacional lançada em Hiroshima até às maiores super-bombas termonucleares ensaiadas, o poder destrutivo foi multiplicado mais de 1.000 vezes. A evolução procurava também incrementar a eficiência (poder explosivo por quantidade de carga combustível) e a compacticidade; entre o primeiro teste de Trinity e uma comparável bomba actual de 20 quilotoneladas TNT, vai a diferença de 5 toneladas para 100 kg, ou seja, de um bombardeiro para uma mala de viagem.
O programa nuclear norte-americano envolveria um longo rol de ensaios de armas. Desde 1945 até Setembro de 1992 (quando foram suspensos), realizaram-se o espantoso número de 1054 testes, a larga maioria num perímetro reservado no deserto do Nevada não muito longe de Las Vegas. Desde 1957 os testes são subterrâneos. Mas enquanto foram acima do solo, os testes foram minuciosamente examinados não só do ponto de vista da potência libertada por carga explosiva, como também do pontos de vista dos efeitos do choque das ondas de pressão e térmica sobre estruturas físicas, como edifícios e veículos, e das radiações ionizantes e substancias radioactivas sobre seres vivos, incluindo homens.
Não existem armas de destruição em massa como as nucleares.
A arma nuclear
no curso da Guerra Mundial
Inicialmente, a arma nuclear seria desenvolvida pelos EUA para antecipar o seu eventual desenvolvimento pela Alemanha. Porém, com a vitória dos aliados na Europa e a rendição da Alemanha a 8 de Maio de 1945, e perante a perspectiva iminente de a União Soviética avançar então na frente do Pacífico contra o Japão – de facto essa declaração de guerra ocorreria a 8 de Agosto, os EUA decidiram precipitar a rendição do Japão a todo o custo. Deu-se uma viragem dramática no curso da história: o que seria uma arma dissuasora frente à Alemanha tornou-se em arma táctica para derrotar o Japão e arma estratégia para «conter» a União Soviética na frente Oriental.
Para contextualizar essa viragem histórica, recordemos dois marcos importantes na preparação do termo da Segunda Guerra Mundial: as Conferências de Yalta e de Postdam. Na Conferência de Yalta, de 7 a 14 de Fevereiro de 1945, Joseph Staline e Franklin Roosvelt haviam acordado que a URSS entraria na guerra contra o Japão três meses após o término da guerra na Europa. Mas com a morte de Franklin Roosevelt, que fora o protagonista norte-americano na Conferência de Yalta, o vice-presidente Harry Truman assumiria a presidência dos EUA a 12 de Abril de 1945. A Alemanha capitularia a 8 de Maio e Truman seria o novo protagonista norte-americano na Conferência de Postdam, já em território Alemão, de 17 de Julho a 2 de Agosto. Aí seria duramente discutida a conclusão da guerra e equacionada a nova ordem internacional emergente. A arma nuclear (ainda secreta) não foi formalmente referida mas estava subentendida nas negociações diplomáticas; a sua próxima utilização seria um acto intencional para influenciar decisivamente a configuração dessa nova ordem internacional que estava para nascer.
Depois de um só teste de demonstração realizado no deserto da Alamogordo (Novo México) a 16 de Julho de 1945 (com um dispositivo denominado «Trinity») duas bombas foram pouco depois lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki no Japão, a 6 e 9 de Agosto - a primeira uma bomba de urânio enriquecido apelidada «Little Boy» a segunda uma bomba de plutónio apelidada «Fat Man». A Conferência de Postdam surge pois sinistramente entrelaçada com as decisões secretas de testar e lançar essas bombas sobre o Japão.
Os alvos então escolhidos foram cidades que não tinham especial valor militar e estavam relativamente intocadas por anteriores bombardeamentos. As muitas experiências que eram e continuariam a ser conduzidas sobre os efeitos biológicos das radiações ionizantes e das substancias radioactivas sobre cobaias humanas - populações prisionais, soldados e outras «amostras» desprevenidas, sugerem que os bombardeamentos daquelas cidades representaram também mais uma mas gigantesca «experiência» sobre tais efeitos biológicos. Esses bombardeamentos representaram também testes sobre a capacidade de destruição física «em condições reais». Sem esquecer que o grande objectivo militar imediato era então, de facto, forçar a rendição do Japão e evitar a entrada da União Soviética na Guerra na frente Oriental e Pacífico. Com efeito, o Japão rendeu-se aos EUA logo a 15 de Agosto.
A URSS não chegaria a entrar na guerra do Pacífico. Mas de acordo com a Conferência de Yalta, a URSS entraria na guerra contra o Japão três meses após o término da guerra na Europa. A declaração de guerra e o início dos combates tiveram lugar a 8 de Agosto - dois dias depois do bombardeamento de Hiroshima e um antes de Nasgazaki.
E de facto, já em Abril de 1945 a URSS notificara o Japão do cancelamento do tratado de neutralidade e, após o fim da guerra na frente Ocidental, as tropas soviéticas estacionadas na Manchúria foram reforçadas com um milhão e meio de soldados e 5.500 carros de combate, transportados a partir da frente Ocidental. Iniciado o ataque soviético na frente Oriental a 8 de Agosto de 1945, justamente três meses após o termo da guerra na frente Ocidental, em oito dias apenas as tropas soviéticas progrediram 400 km e a 16 de Agosto estabeleceram contacto com o Exército Vermelho Chinês, que resistia à invasão Japonesa. O Japão rendeu-se formalmente perante as tropas soviéticas a 2 de Setembro. O avanço fulgurante das tropas terrestres, com apoios aéreos e navais, assegurou a ocupação da Manchúria, parte Norte da Península da Coreia, Ilha de Sakalina e Ilhas Kurilas. Essa intervenção da URSS, tendo decorrido conforme os acordos de Yalta, conferiu à URSS o direito a reter os territórios da Ilha Sakalina e das Ilhas Kurilas, em disputa com o Japão, e ainda Porto Arthur.
A nova arma secreta deixara de o ser e, em lugar desse segredo, passariam a figurar dois actos de guerra inesquecíveis, duas colossais tragédias. Infelizmente, ficou provado da forma mais trágica que a finalidade militar da arma nuclear passa pelo genocídio de grandes populações civis. Fora inventada e utilizada a maior arma de destruição maciça.
As armas nucleares na Guerra Fria
Os EUA procuraram manter o segredo e o monopólio nuclear. Porém uma bomba nuclear soviética veio a ser testada a 29 de Agosto de 1949 no Cazaquistão. Perdido o monopólio, a reacção dos EUA foi a de preocupação e, mais sinistramente, a da caça às bruxas – o MacCartyismo - e a decisão de desenvolver rapidamente uma arma nuclear muito mais poderosa ainda – a bomba termonuclear ou bomba de hidrogénio. A caça às bruxas foi expressão extrema de campanha de propaganda e de agressão ideológica, em que foram imoladas as carreiras de dezenas de cientistas, de centenas de homens e mulheres progressistas e as vidas do casal Rosenberg. O primeiro teste do novo conceito termonuclear foi levado a cabo a 1 de Novembro de 1952, num atol das Ilhas Marshall que ficou apagado do mapa, e iria contaminar milhares de pessoas entre populações vizinhas e Japoneses. Todavia, menos de um ano depois, a União Soviética realizou um teste comparável (12 Agosto 1953). Estava em curso uma corrida a armas capazes de aniquilar não só cidades inteiras mas extensas áreas metropolitanas e causar mesmo impactos a nível planetário - «O Inverno Nuclear».
Em breve, outros países procuraram desenvolver armas nucleares. O RU, dada a sua íntima ligação aos EUA, realizou o seu primeiro teste logo em 1952, e a França em 1960. A R.P. China realizou o seu primeiro teste nuclear e termonuclear, em 1964 e 67. A Índia encenou um primeiro teste em 1974; tanto a Índia como o Paquistão ensaiaram bombas reais em 1998, quase em simultâneo. Os EUA acusam a R.I. Irão e a R. Coreia do Norte de estarem a dotar-se de capacidades para o desenvolvimento de armas nucleares. Mas sabe-se que Israel desenvolveu (desde 1957) e detém um arsenal de algumas centenas de tais armas, e que a R. África do Sul dispôs já delas, para posteriormente a elas renunciar (1991). Entretanto, estes vários países adquiriram já capacidade de lançamento (mísseis) ou estão a desenvolvê-la.
Na década de 1960, face à multiplicação de «novos actores», foram prosseguidos esforços diplomáticos e alcançados progressos significativos no sentido de disciplinar, conter e eventualmente fazer regredir a corrida às armas nucleares, e de facto foi acordado o importante Tratado de Não Proliferação – NTP.
No fim da década de 70, os EUA retomariam a iniciativa da corrida armamentista; rejeitaram o desarmamento, relançaram novas armas e lançaram o sistema anti-balístico baseado no espaço – Iniciativa de Defesa Estratégica, mais conhecido por «guerra das estrelas» (Março de 1983). A par da modernização de mísseis de alcance intermédio com ogivas múltiplas (SS-20), por parte da URSS, a NATO estacionou na Europa mais de meio milhar de ogivas nucleares tácticas, veiculadas por mísseis de cruzeiro (GLCM) e mísseis balísticos Pershing II. A inicio da década de 80 seria de grande tensão na Europa, que mobilizaria os esforços de movimentos pacifistas e anti-nucleares, tensão só atenuada pelo Tratado sobre Forças Nucleares de Alcance Intermédio (INF) que, após laboriosas negociações, em 1987 proibiu a instalação de mísseis terrestres balísticos e de cruzeiro com ogivas nucleares com alcance entre 500 e 5500 km.
No quadro de recessão económica mundial (que persiste até hoje) e pressionada por esta corrida armamentista, a URSS entrou em profunda crise político-económica, que contribuiria para o colapso do bloco socialista no início da década de 90.
Iria iniciar-se a ainda mais perigosa época do poderio capitalista unipolar – a Pax Americana.
A «nova» estratégia nuclear norte-americana
A Nuclear Posture Review – NPR (iniciado em Outubro 1993, e parcialmente revelado ao Congresso em Janeiro 2002) redefine com renovado entusiasmo o papel central das armas nucleares na defesa dos EUA, incluindo a intenção de desenvolver e mesmo testar novas armas com novas finalidades tácticas e estratégicas, e a assumpção do princípio de «first strike» (primeiro a utilizar), o que significa a adopção das armas nucleares como armas ofensivas e não mais como dissuasoras ou preventivas.
O NPR estabelece o quadro de referência para a estratégia nuclear dos EUA, nível de forças e infra-estruturas no horizonte de dez anos. Preconiza revisões substanciais quanto a dimensão e composição das forças nucleares no sentido do reforço da sua flexibilidade e prontidão, permitindo o Pentágono criar novos planos de ataque e tê-los rapidamente autorizados pelo Presidente em caso de «crise». Desde o ressurgimento da Guerra-Fria aquando da primeira administração Reagan, não havia comparável enfoque em armas nucleares na estratégia da «defesa» norte-americana. O NPR conduz a novas capacidades nucleares, ao possível recomeço dos testes nucleares, e admite a utilização da arma nuclear contra estados não nuclearizados na presunção da capacidade de fabricarem armas de destruição em massa. Mas que outra arma de destruição maciça se compara com a arma nuclear? Em escala de vítimas humanas, no imediato e em diferido (vítimas das radiações ionizantes e de contaminação radioactiva), e em escala de destruição física de infra-estruturas, tornando inabitáveis os seus alvos? Este plano de política nuclear não poderá deixar de desacreditar os esforços para persuadir outros estados a não prosseguirem os seus próprios esforços para obterem também armas nucleares e a aceitarem o tratado de Não Proliferação.
À luz desse documento de política nuclear, os EUA não respeitarão compromissos internacionais já assumidos nem tão pouco se sujeitarão a novos compromissos que possam limitar a sua «liberdade» de desenvolver e testar novos tipos de armamentos. Tudo indica, que sancionado pela Nuclear Posture Review e financiado pelo Congresso dos EUA, os laboratórios e demais infra-estruturas do complexo nuclear norte-americanas recomeçarão em breve a fabricar elementos de plutónio e trítio, para renovação do «velho» arsenal nuclear, e desenvolvimento de novos conceitos de armas nucleares tácticas e estratégicas, que implicarão e regresso aos testes nucleares.
Entretanto, já antes de o NPR ser presente ao Congresso norte-americano, a administração havia anunciado o abandono do Tratado sobre Mísseis Anti-Balísticos (ABM) e a recusa de ratificar o Tratado de Proibição Integral de Testes Nucleares (CTBT). Com o novo enunciado da política nuclear, a comunidade internacional já nem pode presumir que os EUA cumprirão os seus compromissos de desarmamento previsto no regime de não-proliferação. A credibilidade e viabilidade dos instrumentos jurídicos internacionais estão postas em causa. O perigo nuclear agravou-se em todo o mundo.
A «nova» NATO
Após o fim da «Guerra-Fria» a natureza da NATO não mudou. Criada em 1949, foi então acto de constituição formal do novo «império americano» que delineou as suas fronteiras; afirmava o objectivo de contenção estratégica da «ameaça» comunista, valendo-se da capacidade ofensiva conferida pelo monopólio da arma nuclear. A aliança à data reconhecia na URSS uma ameaça com grande vantagem em armamento convencional para a ela contrapor a «vantagem» da ameaça de armas nucleares. A disposição de a NATO tomar a iniciativa de utilização da arma nuclear em caso de conflito está patente desde os primórdios da aliança.
O Pacto de Varsóvia seria constituído só em 1955 e dissolver-se-ia em Julho de 1991. Pouco depois (Dezembro) a União Soviética desintegrou-se numa «comunidade de estados independentes». A NATO iria prosseguir, no novo contexto, o avanço político e militar a Leste, ainda que confrontando-se com a oposição de movimentos pacifistas e anti-militaristas e o questionamentos por parte dos governos de alguns estados membros (designadamente Alemanha e Itália). Dos países do anterior Pacto de Varsóvia, três foram assimilados na NATO em 1997 e seis outros em 2004. Mantém armas nucleares norte-americanas estacionadas na Alemanha, RU, Bélgica, Países Baixos, Itália, Grécia e Turquia, partilhando a responsabilidade de estacionamento e utilização, assim contrariando o TNP, mas sob o alto comando norte-americano. O alargamento a Leste, com a possibilidade de instalação de armas nucleares em territórios anteriormente não nuclearizados, só vem evidenciar e agravar o carácter agressivo da NATO e a impotência do quadro legal internacional.
A NATO prevaleceu e, de aliança alegadamente defensiva, assumiu-se como braço armado imperial e abertamente ofensivo. Em breve se envolveria em hostilidades em clara violação do seu estatuto fundador. Em 1994, inicia uma primeira intervenção na Bósnia e Herzegovina, visando a fragmentação da República Socialista Federal da Jugoslávia, a que se seguirá, em 1999, uma intervenção em larga escala na chamada guerra do Kosovo, visando a subjugação da República Federal da Jugoslávia.
Por ocasião da celebração do 50.º aniversário da sua fundação, em Abril 1999, a NATO reinventou-se num«“Novo Conceito Estratégico» e atribuiu-se o direito de intervir militarmente em qualquer parte do mundo. A velha aliança à procura de um novo inimigo reencontrou-o em 11 de Setembro de 2001. O artigo 5 do respectivo Tratado, redigido em 1949, ainda antes de a URSS dispor de arma nuclear, artigo que compromete os aliados a acorrer em defesa de qualquer estado membro em caso de agressão externa, só em 2001 seria invocado pelos EUA, significativamente logo no dia 12 de Setembro, a fim de mobilizar os vários estados e comprometê-los como súbditos em torno da renovada estratégia norte-americana. A subsequente intervenção dos EUA no Afeganistão seria sancionada pela NATO e, subserviente, esta assumiria a responsabilidade da «pacificação» e «administração» ulterior desse país.
As intervenções nos Balcãs e na Ásia Central demonstram que a NATO está preparada para actuar militarmente fora da sua área tradicional de influência (correspondente às duas áreas de comando em que estava estruturada). Os argumentos, inscritos no Novo Conceito Estratégico, são: a resolução e conflitos, a gestão de crises, a promoção da democracia, a defesa de princípios morais, a protecção de direitos humanos. A NATO afirma também que prossegue tais fins sem «arriscar» as suas tropas e minimizando efeitos colaterais sobre populações civis inocentes. Dir-se-ia a NATO transvertida em organização de governo supranacional, omniciente e omnipotente – mas sem qualquer mandato conferido para tal e representado, de facto, uma ameaça à Paz mundial.
Terminada, ao menos retoricamente, a «Guerra-Fria», começaria, de novo retoricamente, a «Guerra ao Terrorismo». Como o «terrorismo» não tem morada nem hora, qualquer hora é tempo de guerra em qualquer parte. O que está conforme com o quadro geográfico e político-militar do novo conceito estratégico da NATO.
E as armas nucleares prevalecem, como elemento central da estratégia de agressão imperialista, que aproveitou a alteração da correlação de forças para alargar os limites do seu império e mudar de nome ao seu «inimigo» universal.
A NATO nasce com as armas nucleares e suporta a sua «autoridade» no poder militar das armas nucleares que detém. É por ser assim que a luta pela Paz é sinónimo de luta contra o Imperialismo.
O complexo responsável pelo programa nuclear alargou-se depois ainda mais. As principais variações ensaiadas na concepção das bombas foram a forma química/metalúrgica e a combinação proporção/geometria entre combustíveis físseis (plutónio e urânio) e fusíveis (deutério e trítio). A evolução procurou incrementar o poder explosivo; da primeira bomba operacional lançada em Hiroshima até às maiores super-bombas termonucleares ensaiadas, o poder destrutivo foi multiplicado mais de 1.000 vezes. A evolução procurava também incrementar a eficiência (poder explosivo por quantidade de carga combustível) e a compacticidade; entre o primeiro teste de Trinity e uma comparável bomba actual de 20 quilotoneladas TNT, vai a diferença de 5 toneladas para 100 kg, ou seja, de um bombardeiro para uma mala de viagem.
O programa nuclear norte-americano envolveria um longo rol de ensaios de armas. Desde 1945 até Setembro de 1992 (quando foram suspensos), realizaram-se o espantoso número de 1054 testes, a larga maioria num perímetro reservado no deserto do Nevada não muito longe de Las Vegas. Desde 1957 os testes são subterrâneos. Mas enquanto foram acima do solo, os testes foram minuciosamente examinados não só do ponto de vista da potência libertada por carga explosiva, como também do pontos de vista dos efeitos do choque das ondas de pressão e térmica sobre estruturas físicas, como edifícios e veículos, e das radiações ionizantes e substancias radioactivas sobre seres vivos, incluindo homens.
Não existem armas de destruição em massa como as nucleares.
A arma nuclear
no curso da Guerra Mundial
Inicialmente, a arma nuclear seria desenvolvida pelos EUA para antecipar o seu eventual desenvolvimento pela Alemanha. Porém, com a vitória dos aliados na Europa e a rendição da Alemanha a 8 de Maio de 1945, e perante a perspectiva iminente de a União Soviética avançar então na frente do Pacífico contra o Japão – de facto essa declaração de guerra ocorreria a 8 de Agosto, os EUA decidiram precipitar a rendição do Japão a todo o custo. Deu-se uma viragem dramática no curso da história: o que seria uma arma dissuasora frente à Alemanha tornou-se em arma táctica para derrotar o Japão e arma estratégia para «conter» a União Soviética na frente Oriental.
Para contextualizar essa viragem histórica, recordemos dois marcos importantes na preparação do termo da Segunda Guerra Mundial: as Conferências de Yalta e de Postdam. Na Conferência de Yalta, de 7 a 14 de Fevereiro de 1945, Joseph Staline e Franklin Roosvelt haviam acordado que a URSS entraria na guerra contra o Japão três meses após o término da guerra na Europa. Mas com a morte de Franklin Roosevelt, que fora o protagonista norte-americano na Conferência de Yalta, o vice-presidente Harry Truman assumiria a presidência dos EUA a 12 de Abril de 1945. A Alemanha capitularia a 8 de Maio e Truman seria o novo protagonista norte-americano na Conferência de Postdam, já em território Alemão, de 17 de Julho a 2 de Agosto. Aí seria duramente discutida a conclusão da guerra e equacionada a nova ordem internacional emergente. A arma nuclear (ainda secreta) não foi formalmente referida mas estava subentendida nas negociações diplomáticas; a sua próxima utilização seria um acto intencional para influenciar decisivamente a configuração dessa nova ordem internacional que estava para nascer.
Depois de um só teste de demonstração realizado no deserto da Alamogordo (Novo México) a 16 de Julho de 1945 (com um dispositivo denominado «Trinity») duas bombas foram pouco depois lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki no Japão, a 6 e 9 de Agosto - a primeira uma bomba de urânio enriquecido apelidada «Little Boy» a segunda uma bomba de plutónio apelidada «Fat Man». A Conferência de Postdam surge pois sinistramente entrelaçada com as decisões secretas de testar e lançar essas bombas sobre o Japão.
Os alvos então escolhidos foram cidades que não tinham especial valor militar e estavam relativamente intocadas por anteriores bombardeamentos. As muitas experiências que eram e continuariam a ser conduzidas sobre os efeitos biológicos das radiações ionizantes e das substancias radioactivas sobre cobaias humanas - populações prisionais, soldados e outras «amostras» desprevenidas, sugerem que os bombardeamentos daquelas cidades representaram também mais uma mas gigantesca «experiência» sobre tais efeitos biológicos. Esses bombardeamentos representaram também testes sobre a capacidade de destruição física «em condições reais». Sem esquecer que o grande objectivo militar imediato era então, de facto, forçar a rendição do Japão e evitar a entrada da União Soviética na Guerra na frente Oriental e Pacífico. Com efeito, o Japão rendeu-se aos EUA logo a 15 de Agosto.
A URSS não chegaria a entrar na guerra do Pacífico. Mas de acordo com a Conferência de Yalta, a URSS entraria na guerra contra o Japão três meses após o término da guerra na Europa. A declaração de guerra e o início dos combates tiveram lugar a 8 de Agosto - dois dias depois do bombardeamento de Hiroshima e um antes de Nasgazaki.
E de facto, já em Abril de 1945 a URSS notificara o Japão do cancelamento do tratado de neutralidade e, após o fim da guerra na frente Ocidental, as tropas soviéticas estacionadas na Manchúria foram reforçadas com um milhão e meio de soldados e 5.500 carros de combate, transportados a partir da frente Ocidental. Iniciado o ataque soviético na frente Oriental a 8 de Agosto de 1945, justamente três meses após o termo da guerra na frente Ocidental, em oito dias apenas as tropas soviéticas progrediram 400 km e a 16 de Agosto estabeleceram contacto com o Exército Vermelho Chinês, que resistia à invasão Japonesa. O Japão rendeu-se formalmente perante as tropas soviéticas a 2 de Setembro. O avanço fulgurante das tropas terrestres, com apoios aéreos e navais, assegurou a ocupação da Manchúria, parte Norte da Península da Coreia, Ilha de Sakalina e Ilhas Kurilas. Essa intervenção da URSS, tendo decorrido conforme os acordos de Yalta, conferiu à URSS o direito a reter os territórios da Ilha Sakalina e das Ilhas Kurilas, em disputa com o Japão, e ainda Porto Arthur.
A nova arma secreta deixara de o ser e, em lugar desse segredo, passariam a figurar dois actos de guerra inesquecíveis, duas colossais tragédias. Infelizmente, ficou provado da forma mais trágica que a finalidade militar da arma nuclear passa pelo genocídio de grandes populações civis. Fora inventada e utilizada a maior arma de destruição maciça.
As armas nucleares na Guerra Fria
Os EUA procuraram manter o segredo e o monopólio nuclear. Porém uma bomba nuclear soviética veio a ser testada a 29 de Agosto de 1949 no Cazaquistão. Perdido o monopólio, a reacção dos EUA foi a de preocupação e, mais sinistramente, a da caça às bruxas – o MacCartyismo - e a decisão de desenvolver rapidamente uma arma nuclear muito mais poderosa ainda – a bomba termonuclear ou bomba de hidrogénio. A caça às bruxas foi expressão extrema de campanha de propaganda e de agressão ideológica, em que foram imoladas as carreiras de dezenas de cientistas, de centenas de homens e mulheres progressistas e as vidas do casal Rosenberg. O primeiro teste do novo conceito termonuclear foi levado a cabo a 1 de Novembro de 1952, num atol das Ilhas Marshall que ficou apagado do mapa, e iria contaminar milhares de pessoas entre populações vizinhas e Japoneses. Todavia, menos de um ano depois, a União Soviética realizou um teste comparável (12 Agosto 1953). Estava em curso uma corrida a armas capazes de aniquilar não só cidades inteiras mas extensas áreas metropolitanas e causar mesmo impactos a nível planetário - «O Inverno Nuclear».
Em breve, outros países procuraram desenvolver armas nucleares. O RU, dada a sua íntima ligação aos EUA, realizou o seu primeiro teste logo em 1952, e a França em 1960. A R.P. China realizou o seu primeiro teste nuclear e termonuclear, em 1964 e 67. A Índia encenou um primeiro teste em 1974; tanto a Índia como o Paquistão ensaiaram bombas reais em 1998, quase em simultâneo. Os EUA acusam a R.I. Irão e a R. Coreia do Norte de estarem a dotar-se de capacidades para o desenvolvimento de armas nucleares. Mas sabe-se que Israel desenvolveu (desde 1957) e detém um arsenal de algumas centenas de tais armas, e que a R. África do Sul dispôs já delas, para posteriormente a elas renunciar (1991). Entretanto, estes vários países adquiriram já capacidade de lançamento (mísseis) ou estão a desenvolvê-la.
Na década de 1960, face à multiplicação de «novos actores», foram prosseguidos esforços diplomáticos e alcançados progressos significativos no sentido de disciplinar, conter e eventualmente fazer regredir a corrida às armas nucleares, e de facto foi acordado o importante Tratado de Não Proliferação – NTP.
No fim da década de 70, os EUA retomariam a iniciativa da corrida armamentista; rejeitaram o desarmamento, relançaram novas armas e lançaram o sistema anti-balístico baseado no espaço – Iniciativa de Defesa Estratégica, mais conhecido por «guerra das estrelas» (Março de 1983). A par da modernização de mísseis de alcance intermédio com ogivas múltiplas (SS-20), por parte da URSS, a NATO estacionou na Europa mais de meio milhar de ogivas nucleares tácticas, veiculadas por mísseis de cruzeiro (GLCM) e mísseis balísticos Pershing II. A inicio da década de 80 seria de grande tensão na Europa, que mobilizaria os esforços de movimentos pacifistas e anti-nucleares, tensão só atenuada pelo Tratado sobre Forças Nucleares de Alcance Intermédio (INF) que, após laboriosas negociações, em 1987 proibiu a instalação de mísseis terrestres balísticos e de cruzeiro com ogivas nucleares com alcance entre 500 e 5500 km.
No quadro de recessão económica mundial (que persiste até hoje) e pressionada por esta corrida armamentista, a URSS entrou em profunda crise político-económica, que contribuiria para o colapso do bloco socialista no início da década de 90.
Iria iniciar-se a ainda mais perigosa época do poderio capitalista unipolar – a Pax Americana.
A «nova» estratégia nuclear norte-americana
A Nuclear Posture Review – NPR (iniciado em Outubro 1993, e parcialmente revelado ao Congresso em Janeiro 2002) redefine com renovado entusiasmo o papel central das armas nucleares na defesa dos EUA, incluindo a intenção de desenvolver e mesmo testar novas armas com novas finalidades tácticas e estratégicas, e a assumpção do princípio de «first strike» (primeiro a utilizar), o que significa a adopção das armas nucleares como armas ofensivas e não mais como dissuasoras ou preventivas.
O NPR estabelece o quadro de referência para a estratégia nuclear dos EUA, nível de forças e infra-estruturas no horizonte de dez anos. Preconiza revisões substanciais quanto a dimensão e composição das forças nucleares no sentido do reforço da sua flexibilidade e prontidão, permitindo o Pentágono criar novos planos de ataque e tê-los rapidamente autorizados pelo Presidente em caso de «crise». Desde o ressurgimento da Guerra-Fria aquando da primeira administração Reagan, não havia comparável enfoque em armas nucleares na estratégia da «defesa» norte-americana. O NPR conduz a novas capacidades nucleares, ao possível recomeço dos testes nucleares, e admite a utilização da arma nuclear contra estados não nuclearizados na presunção da capacidade de fabricarem armas de destruição em massa. Mas que outra arma de destruição maciça se compara com a arma nuclear? Em escala de vítimas humanas, no imediato e em diferido (vítimas das radiações ionizantes e de contaminação radioactiva), e em escala de destruição física de infra-estruturas, tornando inabitáveis os seus alvos? Este plano de política nuclear não poderá deixar de desacreditar os esforços para persuadir outros estados a não prosseguirem os seus próprios esforços para obterem também armas nucleares e a aceitarem o tratado de Não Proliferação.
À luz desse documento de política nuclear, os EUA não respeitarão compromissos internacionais já assumidos nem tão pouco se sujeitarão a novos compromissos que possam limitar a sua «liberdade» de desenvolver e testar novos tipos de armamentos. Tudo indica, que sancionado pela Nuclear Posture Review e financiado pelo Congresso dos EUA, os laboratórios e demais infra-estruturas do complexo nuclear norte-americanas recomeçarão em breve a fabricar elementos de plutónio e trítio, para renovação do «velho» arsenal nuclear, e desenvolvimento de novos conceitos de armas nucleares tácticas e estratégicas, que implicarão e regresso aos testes nucleares.
Entretanto, já antes de o NPR ser presente ao Congresso norte-americano, a administração havia anunciado o abandono do Tratado sobre Mísseis Anti-Balísticos (ABM) e a recusa de ratificar o Tratado de Proibição Integral de Testes Nucleares (CTBT). Com o novo enunciado da política nuclear, a comunidade internacional já nem pode presumir que os EUA cumprirão os seus compromissos de desarmamento previsto no regime de não-proliferação. A credibilidade e viabilidade dos instrumentos jurídicos internacionais estão postas em causa. O perigo nuclear agravou-se em todo o mundo.
A «nova» NATO
Após o fim da «Guerra-Fria» a natureza da NATO não mudou. Criada em 1949, foi então acto de constituição formal do novo «império americano» que delineou as suas fronteiras; afirmava o objectivo de contenção estratégica da «ameaça» comunista, valendo-se da capacidade ofensiva conferida pelo monopólio da arma nuclear. A aliança à data reconhecia na URSS uma ameaça com grande vantagem em armamento convencional para a ela contrapor a «vantagem» da ameaça de armas nucleares. A disposição de a NATO tomar a iniciativa de utilização da arma nuclear em caso de conflito está patente desde os primórdios da aliança.
O Pacto de Varsóvia seria constituído só em 1955 e dissolver-se-ia em Julho de 1991. Pouco depois (Dezembro) a União Soviética desintegrou-se numa «comunidade de estados independentes». A NATO iria prosseguir, no novo contexto, o avanço político e militar a Leste, ainda que confrontando-se com a oposição de movimentos pacifistas e anti-militaristas e o questionamentos por parte dos governos de alguns estados membros (designadamente Alemanha e Itália). Dos países do anterior Pacto de Varsóvia, três foram assimilados na NATO em 1997 e seis outros em 2004. Mantém armas nucleares norte-americanas estacionadas na Alemanha, RU, Bélgica, Países Baixos, Itália, Grécia e Turquia, partilhando a responsabilidade de estacionamento e utilização, assim contrariando o TNP, mas sob o alto comando norte-americano. O alargamento a Leste, com a possibilidade de instalação de armas nucleares em territórios anteriormente não nuclearizados, só vem evidenciar e agravar o carácter agressivo da NATO e a impotência do quadro legal internacional.
A NATO prevaleceu e, de aliança alegadamente defensiva, assumiu-se como braço armado imperial e abertamente ofensivo. Em breve se envolveria em hostilidades em clara violação do seu estatuto fundador. Em 1994, inicia uma primeira intervenção na Bósnia e Herzegovina, visando a fragmentação da República Socialista Federal da Jugoslávia, a que se seguirá, em 1999, uma intervenção em larga escala na chamada guerra do Kosovo, visando a subjugação da República Federal da Jugoslávia.
Por ocasião da celebração do 50.º aniversário da sua fundação, em Abril 1999, a NATO reinventou-se num«“Novo Conceito Estratégico» e atribuiu-se o direito de intervir militarmente em qualquer parte do mundo. A velha aliança à procura de um novo inimigo reencontrou-o em 11 de Setembro de 2001. O artigo 5 do respectivo Tratado, redigido em 1949, ainda antes de a URSS dispor de arma nuclear, artigo que compromete os aliados a acorrer em defesa de qualquer estado membro em caso de agressão externa, só em 2001 seria invocado pelos EUA, significativamente logo no dia 12 de Setembro, a fim de mobilizar os vários estados e comprometê-los como súbditos em torno da renovada estratégia norte-americana. A subsequente intervenção dos EUA no Afeganistão seria sancionada pela NATO e, subserviente, esta assumiria a responsabilidade da «pacificação» e «administração» ulterior desse país.
As intervenções nos Balcãs e na Ásia Central demonstram que a NATO está preparada para actuar militarmente fora da sua área tradicional de influência (correspondente às duas áreas de comando em que estava estruturada). Os argumentos, inscritos no Novo Conceito Estratégico, são: a resolução e conflitos, a gestão de crises, a promoção da democracia, a defesa de princípios morais, a protecção de direitos humanos. A NATO afirma também que prossegue tais fins sem «arriscar» as suas tropas e minimizando efeitos colaterais sobre populações civis inocentes. Dir-se-ia a NATO transvertida em organização de governo supranacional, omniciente e omnipotente – mas sem qualquer mandato conferido para tal e representado, de facto, uma ameaça à Paz mundial.
Terminada, ao menos retoricamente, a «Guerra-Fria», começaria, de novo retoricamente, a «Guerra ao Terrorismo». Como o «terrorismo» não tem morada nem hora, qualquer hora é tempo de guerra em qualquer parte. O que está conforme com o quadro geográfico e político-militar do novo conceito estratégico da NATO.
E as armas nucleares prevalecem, como elemento central da estratégia de agressão imperialista, que aproveitou a alteração da correlação de forças para alargar os limites do seu império e mudar de nome ao seu «inimigo» universal.
A NATO nasce com as armas nucleares e suporta a sua «autoridade» no poder militar das armas nucleares que detém. É por ser assim que a luta pela Paz é sinónimo de luta contra o Imperialismo.