Vergonha!? A hipocrisia anda à solta!

Armindo Miranda (Membro da Comissão Política)
O Instituto Nacional de Estatística (INE) deu a conhecer o que já se sabia e se vê à vista desarmada no País: a pobreza tem vindo a aumentar e os pobres já ultrapassam os dois milhões, quase 20% da população portuguesa, e destes 1,4 milhões, ou seja 13% da população, vivem com um rendimento abaixo dos 300 euros.

Foram os di­ri­gentes do PS, PSD e CDS que al­te­raram as leis la­bo­rais

Outros dados vieram a público e indicam a existência de mais de 200 mil portugueses, a grande maioria assalariados que não ganham o suficiente para sobreviver, passam fome. Estas notícias colocaram a hipocrisia à solta e deram-nos a conhecer as «profundíssimas preocupações» com esta terrível situação exactamente daqueles que são os principais responsáveis por o País ter chegado a este ponto. Mais, tais dados são igualmente denunciados por comentadores que há muitos anos apoiam – e para isso são pagos – a política de classe a favor do grande capital. Mais, Marcelo Rebelo de Sousa, na sua missa dominical, classificou-os mesmo como «uma vergonha para todos»! Que a culpa é das obras do metro no Terreiro do Paço e no túnel do Rossio, que custaram muito mais do que estava previsto.
Enfim, todos quiseram dar a conhecer a pena que sentem pelos coitados dos pobrezinhos! Até Cavaco Silva se mostrou profundamente envergonhado com tanta pobreza no nosso país, referindo de imediato que, sendo de tão grande tamanho, o Estado só por si não conseguiria resolver o problema, o que terá levado a sugerir que se pagasse a instituições de solidariedade social para o fazer.
Ora, só por grande hipocrisia é que Cavaco e outros tais podem falar da pobreza como falaram, uma vez que foram eles que entregaram ao capital nacional e estrangeiro sectores e empresas públicas, ferramentas estratégicas para o aumento da produção e da riqueza no nosso país e que faziam entrar nos cofres do Estado muitos milhões de euros que, bem utilizados, podiam ajudar a combater a pobreza. Hoje, porém, vão direitinhos para a conta bancária dos senhores do dinheiro.
Foram eles, dirigentes do PS, PSD e CDS, que alteraram as leis laborais, permitindo ao patronato despedir de forma fácil, em muitos casos quando e como quiser, colocando no desemprego, e em muitos casos na miséria e infelicidade, milhares de famílias cuja única riqueza é a sua força de trabalho. Foram os governos destes três partidos que, ao longo dos últimos trinta anos, consideraram o salário e o aumento do poder de compra dos trabalhadores e dos reformados como um inimigo do desenvolvimento económico.

Eles comem tudo!

Resultado: os salários estão cada vez mais desvalorizados, contam cada vez menos no Orçamento de Estado e dos tais 2 milhões de pobres, cerca de 800 mil são assalariados.
Esta situação levou recentemente a UE a considerar o nosso país como aquele onde a pobreza tem melhores condições para continuar a crescer, pois na sua origem estão causas estruturantes. Tudo isto devido à política levada à prática por estes homens de mão do grande capital, sendo por isso mesmo que, em chocante contraste com esta situação social, se assiste ao extraordinário enriquecimento de algumas famílias e aos lucros fabulosos do capital financeiro. Só o aumento da fortuna das 100 famílias mais ricas do nosso país – 34 milhões de euros, em 2006 – dava para pagar um salário de 500 euros a 1 milhão de portugueses durante um ano.
Assim sendo, como podem estes senhores, depois de todo o mal que fizeram aos trabalhadores, ao povo e ao País, sentir vergonha pelo resultado do que fizeram, se ainda hoje continuam a fazer e a praticar a mesma politica? Se sempre que passaram pelo poder deixaram um rasto de miséria e infelicidade para milhares de cidadãos? Como querem que, continuando a exercer a mesma política, alguém acredite nas lágrimas de crocodilo?
A solução para a pobreza está numa nova política e num novo rumo para Portugal, numa nova política que está a ser discutida em todo o Partido, com a preparação da nossa Conferência Nacional sobre Questões Económicas e Sociais. Desta, sairá seguramente a proposta de uma política alternativa e de classe que, tendo como suporte um forte e dinâmico sector público, seja colocada ao serviço dos trabalhadores, dos micro e pequenos empresários, dos reformados e da população em geral.


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