No 50.º aniversário da morte de Estaline

Nostalgia russa pelos tempos do socialismo

Manoel de Lencastre
O 50º aniversário da morte de Estaline (05.03.1953) foi comemorado sem indiferença e com respeito na antiga URSS, mas noutros países com o habitual «grande espectáculo» que os «media» ocidentais costumam dedicar a todos os acontecimentos em que Estaline se distingue. Uma vez mais, vieram à baila os muitos milhões que teria mandado executar e, enfim, toda uma série de horrores a que a História, a verdadeira, não consente aval. O nome do escritor Alexandr Solzhenitsyn oferece constante fonte de apoio a todos os especuladores na matéria. A sua afirmação de que os «excessos» de Estaline teriam conduzido milhões de pessoas à morte, serve-lhes às mil maravilhas. Mas parece que as coisas não foram bem assim...
Apesar de uma intensa barragem de comentários duvidosos, Moscovo abriu num dos museus da cidade uma exposição dedicada à vida e obra de Josef Vissarionovitch Djiugashvili. Tirando partido da crescente nostalgia do povo russo pelos dias em que o socialismo parecia afirmar-se e Estaline lhe dava credibilidade, os organizadores da exibição abriram ao público moscovita que acorreu ao Museu da História Contemporânea Russa (antigamente, o Museu da Revolução), diversas salas onde se apresentaram fotografias, cartas, documentação diversa e objectos que pertenceram ao antigo governante soviético. Este, através da agitadíssima carreira que se conhece, esteve no poder durante mais de três décadas. A sua morte foi profundamente sentida pelo povo das repúblicas soviéticas. A sua memória não se apagou do espírito daqueles que lhe conheceram a trajectória. É por isso que tantos milhares de pessoas, apesar da campanha imperialista que aponta as fomes, as guerras, as repressões, as purgas, os «gulags», como características chave da carreira de Estaline, acorreu à exposição demonstrando firme certeza nos ideais do comunismo e lastimando o rumo que os acontecimentos tomaram, entretanto.

A acção de Estaline fez tremer os imperialistas (e ainda faz ...)

Estaline fez parte, inevitavelmente, do primeiro governo de comissários do povo saído da Revolução de Outubro, sobraçando a pasta das Nacionalidades. Nesse governo, a que Lenine presidia, entraram, também, Rykov (Interior), Milyutin (Agricultura), Schlyapnikov (Trabalho), Nogin (Comércio e Indústria), Lunacharsky (Educação), Stepanov (Finanças), Trotsky (Negócios Estrangeiros), Lomov (Justiça), Teodorovitch (Produtos Alimentares), Glebov (Correios e Telégrafos). Os assuntos militares eram dirigidos por uma comissão formada por Antonov-Ovseyenko, Krylenko e Dybenko.
O papel de Estaline durante a guerra civil provocada pelas intrigas e pelas invasões dos países imperialistas que pretendiam sufocar o Estado socialista logo à nascença, é objecto de muitas, sempre controversas considerações. O mesmo tem de dizer-se quanto à chefia exercida durante a 2.ª Guerra Mundial. Mas existem poucas dúvidas de que Estaline se elevou ao mais alto nível de dirigente militar e político numa época cruel e rude em que liderou o país dos sovietes até à vitória final e à entrada do Exército Vermelho no Reichstag. Basta que notemos as principais revelações dos marechais soviéticos, Jukov e Rokossovsky, só para citar estes dois nomes históricos.
Outro capítulo da trajectória de Estaline em que os dirigentes e os propagandistas do capitalismo mundial se mostram extremamente intransigentes e vorazes (compreende-se porquê...) é o da campanha da colectivização das terras. Mas a intransigência de Estaline era, igualmente, compreensível. Assim, a 6 de Fevereiro de 1928, dizia ele: «Os camponeses pobres e uma proporção considerável dos de nível médio, venderam e já entregaram ao Estado toda a sua produção de trigo. O governo pagou-lhes, segundo os preços acordados. Mas pode admitir-se que o nosso mesmo governo pague aos “kulaks” (grandes proprietários) duas vezes mais por iguais quantidades de trigo?». Os «kulaks», obviamente, foram liquidados como classe social. Mais tarde, em 1935, Estaline tinha, ainda, esta famosa conclusão para nos dar: «Deve compreender-se que de todas as preciosas formas de capital que existem no mundo, a mais decisiva é formada pelos homens e, entre estes, a mais preciosa são os quadros partidários».

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A voz da História


Para Lenine, o fim aproximava-se. Mas com relutante ordem dos médicos, escreveu, ainda, o seu testamento político cujas primeiras notas começou a ditar a 24 de Dezembro de 1922. Dias depois, a 4 de Janeiro de 1923, incluiu uma adição que ficaria para a História e que transcrevemos:
«Estaline é demasiado rude e este defeito, ainda que tolerável entre nós no tratamento de assuntos entre comunistas, torna-se inaceitável num Secretário-Geral do Partido. É por isso que sugiro que os camaradas pensem na maneira de o fazer sair desse lugar nomeando alguém que em todos os aspectos seja diferente do camarada Estaline e que, acima de tudo, seja mais tolerante, mais leal, mais educado, menos caprichoso e demonstre mais consideração pelos outros camaradas. Penso, ainda, que de um ponto de vista da salvaguarda dos interesses do nosso Partido contra eventuais divisões e partindo daquilo que já escrevi sobre as relações entre Estaline e Trotsky, isto não é um simples pormenor mas, se o fosse, tratar-se-ia, na verdade, de um pormenor que poderia assumir decisiva importância».
O 13.º Congresso do Partido Comunista, agindo segundo as recomendações de Lenine e tendo presente o documento que acima citamos, decidiu alargar para 53 o número de membros do Comité Central, apesar da oposição de Trotsky. Mas, depois de discutido o documento preparado por Lenine, o Congresso decidiu manter Estaline no lugar de Secretário-Geral do Partido devido à sua luta consequente contra o trotskismo. Os delegados temiam, não injustificadamente, que a substituição de Estaline, nas condições do momento, só desse vantagens aos que haviam entrado na estrada do divisionismo. Entretanto, o próprio Secretário-Geral garantia estar preparado para corrigir os defeitos por Lenine descritos na sua carta.
Mas os desenvolvimentos seguintes e a passagem do tempo indicam que Estaline não cumpriu a garantia prestada. Abusando do poder, promoveu o culto da sua própria personalidade acabando por cometer graves erros (mas não todos os que se lhe apontam), tanto em assuntos de política interna como noutros da área internacional. Por outro lado, note-se que a melhor homenagem que pode prestar-se ao chefe soviético, são os próprios imperialistas que a realizam ao continuarem, 50 anos após a sua morte, a massacrarem-nos com o que têm por enormidades e erros do Partido e de Estaline, mas que se revelaram vitórias de carácter histórico inegável - a construção do socialismo num só país; a electrificação de toda a URSS; a industrialização em massa; as grandes obras nacionais e o espectacular cumprimento dos Planos Quinquenais; a inolvidável e épica vitória do povo soviético, do Partido e do Exército Vermelho na 2.ª Guerra Mundial; o acesso à arma atómica para que se aquietassem os maníacos americanos.
Quando apareceu Solzhenitsyn a glorificar as «vítimas» do estalinismo, e fazendo, portanto, «esclarecer» o mundo quanto ao que se passara, tanto o escritor como a máquina da propaganda imperialista que o fez e apoiou se esqueceram de notar que essas «vítimas» tinham vestido a farda do inimigo nazi e que a ele se tinham acolhido na expectativa de que a URSS perdesse a guerra. Mas essas expectativas saíram goradas, como todos sabemos.

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Cronologia

21.12. 1879 – Nascimento de Josef Estaline;
Julho de 1903 – Condenado a 3 anos de exílio na Sibéria por ter apoiado uma greve;
Junho de 1906 – Casou com Ekaterina Svanize, filha de um ferroviário, que também se interessava por assuntos políticos. Ekaterina morreu em 1907, depois do nascimento de um filho, Vassily. Em 1918, Estaline casou com Nadezda Allilueva que lhe deu um filho, Yakov, em 1921, e uma filha, Svetlana, em 1925; Nadezda suicidou-se em 1932 e Yakov sucumbiria num campo de concentração nazi, em 1943; Svetlana transferiu-se para os Estados Unidos em 1966;
1907 - Organizador de campanhas de fundos a favor do Partido bolchevique; encontrou-se com Lenine, secretamente, em Berlim;
Outubro de 1917 - Revolução e tomada de todo o poder pelos sovietes;
Abril de 1922 - Secretário-Geral do Partido Comunista;
Janeiro de 1924 – Morte de Lenine;
1929-1935 - Colectivização da agricultura;
1937-1938 – Reorganização do sistema de quadros partidários através de purgas que atingiram altas personalidades da época consideradas figuras anti-Partido;
Junho de 1941 – Invasão hitleriana da URSS;
Novembro-Dezembro de 1941 - Derrota dos nazis às portas de Moscovo;
Fevereiro de 1943 - Derrota dos nazis em Estalinegrado;
Fevereiro de 1945 - Estaline discute o futuro de mundo em Yalta, com Churchill e Roosevelt;
Abril de 1945 - O Exército Vermelho entra em Berlim e derrota Hitler;
Maio de 1945 - Estaline preside à Parada da Vitória em Moscovo;
Agosto de 1949 - Explosão de um engenho nuclear soviético;
05.03.1953 - Morte de Estaline;


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