O insulto

Margarida Botelho
Há meses atrás, no Parlamento, Sócrates afirmava que conhecia perfeitamente as caras dos comunistas que se dedicavam a esperá-lo com manifestações. Cobriu-se de ridículo e expôs o ódio que dedica, não apenas aos comunistas, mas a todos os que protestam, lutam e exercem os seus direitos.
Neste fim-de-semana, o primeiro-ministro voltou a acusar o PCP de orquestrar protestos contra si há mais de 30 anos (!) e a insistir na sua habitual deixa destas ocasiões: «o insulto é a arma dos fracos».
Referia-se a duas concentrações de trabalhadores e comissões de utentes, no Barreiro e no Seixal, que o esperavam à porta de duas iniciativas do Governo: a inauguração da electrificação da Linha do Sado e a distribuição de diplomas das Novas Oportunidades.
No Barreiro – lê-se no Público – a comitiva governamental «atravessava uma zona inóspita e enlameada para chegar à plataforma do comboio, cuja “sala de espera” se limitava a um contentor com dois bancos». Membros da Comissão de Utentes da Linha do Sado entregaram um comunicado saudando a electrificação, mas exigindo o fim das obras e condições dignas para os passageiros. Ingratos - deve ter pensado o primeiro-ministro.
No Seixal – lê-se no JN – Sócrates assinou «acordos de criação de seis novas empresas, com um total de 12 postos de trabalho». À porta, e incapazes de se alegrarem com a fartura de uma dúzia de empregos, ficaram representantes dos trabalhadores do Arsenal do Alfeite, que há pouco mais de uma semana souberam que 400 a 600 dos 1200 arsenalistas passarão à mobilidade especial, e trabalhadores da Lusosider, fábrica com a produção parada até Março, e que justamente temem a perda de cerca de 200 postos de trabalho. Caso para perguntar quem insulta quem: se os trabalhadores que gritam que sem emprego nada feito, ou o Governo, que assina uma dúzia de postos de trabalho ignorando as muitas centenas com o seu em causa?!
Sócrates bem pode repetir para si próprio que os protestos são «coisas» de comunistas. Arrisca-se é a confundir a realidade com a sua própria propaganda e a não compreender a dimensão e a amplitude da luta e do protesto…


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