Propostas de revisão constitucional do PCP

Aprofundar sentido de progresso

O re­forço do di­reito à con­tra­tação co­lec­tiva e proi­bição da ca­du­ci­dade au­to­má­tica das con­ven­ções, a va­lo­ri­zação do sa­lário mí­nimo e a re­dução pro­gres­siva do ho­rário de tra­balho sem perda de di­reitos cons­ti­tuem al­gumas das al­te­ra­ções em ma­téria de di­reitos dos tra­ba­lha­dores e das as­so­ci­a­ções sin­di­cais que in­te­gram o pro­jecto de re­visão cons­ti­tu­ci­onal do PCP.

PCP vai à luta em de­fesa da Cons­ti­tuição

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En­tregue há duas se­manas no Par­la­mento, ini­ciado que foi este pro­cesso pela mão do PSD, o texto ela­bo­rado pela ban­cada co­mu­nista tem como ob­jec­tivos es­sen­ciais, por um lado, for­ta­lecer e aper­fei­çoar o texto cons­ti­tu­ci­onal (por via de pro­postas ino­va­doras e re­cu­pe­rando dis­po­si­ções en­tre­tanto eli­mi­nadas em an­te­ri­ores re­vi­sões) e, por outro lado, com­bater as ten­ta­tivas já em marcha no sen­tido de a voltar a gol­pear e em­po­brecer, como acon­teceu em an­te­ri­ores re­vi­sões.

Ataque à Cons­ti­tuição pro­ta­go­ni­zado por aqueles que «nunca se con­for­maram com o seu con­teúdo», como sa­li­enta a ban­cada co­mu­nista no preâm­bulo da sua pro­posta, os mesmos que exe­cutam as po­lí­ticas de di­reita em des­res­peito pelos seus prin­cí­pios e dis­po­si­ções fun­da­men­tais.

Sem des­curar a frente de ba­talha que é a aber­tura deste novo pro­cesso de re­visão cons­ti­tu­ci­onal, a ban­cada do PCP já fez saber, to­davia, que não se des­viará da­quilo que para si no pre­sente é ful­cral, ou seja, a agu­di­zação da crise eco­nó­mica e so­cial e as novas e bru­tais me­didas contra os di­reitos dos tra­ba­lha­dores e do povo e contra os in­te­resses do País.

Foi essa a po­sição su­bli­nhada de forma clara por Ber­nar­dino So­ares, pre­si­dente do Grupo Par­la­mentar do PCP, na con­fe­rência de im­prensa onde deu a co­nhecer con­jun­ta­mente com o de­pu­tado An­tónio Fi­lipe as li­nhas ge­rais do di­ploma co­mu­nista. Nela rei­terou, como o Avante! no­ti­ciou na pas­sada se­mana, a ga­rantia de que a sua ban­cada con­ti­nuará a «dar pri­mazia ao com­bate às me­didas e po­lí­ticas em curso e à apre­sen­tação de al­ter­na­tivas de es­querda à po­lí­tica de di­reita».

 

Acesso à Jus­tiça


Sobre as prin­ci­pais al­te­ra­ções cons­tantes do pro­jecto de re­visão cons­ti­tu­ci­onal do PCP, de que fa­lámos há oito dias com a pro­messa de a elas voltar esta se­mana, re­giste-se a que con­fere dig­ni­dade cons­ti­tu­ci­onal ao Con­selho Con­sul­tivo das Co­mu­ni­dades Por­tu­guesas, al­te­ração in­se­rida no ar­tigo sobre os Por­tu­gueses no es­tran­geiro (art. 14.º), en­quanto, por outro lado, no ar­tigo de­di­cado a Es­tran­geiros, apá­tridas, ci­da­dãos eu­ro­peus (art. 15.º), é ga­ran­tido o di­reito de voto dos ci­da­dãos es­tran­geiros em elei­ções au­tár­quicas, eli­mi­nando a ac­tual exi­gência de re­ci­pro­ci­dade.

A ga­rantia de que o acesso à jus­tiça e aos tri­bu­nais não possa ser con­di­ci­o­nado ou de­ne­gado pela sua one­ro­si­dade ou por in­su­fi­ci­ência de meios eco­nó­micos surge como a prin­cipal pro­posta de al­te­ração no que se re­fere ao acesso ao di­reito, en­quanto - já noutro plano - os man­datos do Pro­cu­rador Geral da Re­pú­blica, do Pro­vedor de Jus­tiça e do Pre­si­dente do Tri­bunal de Contas são fi­xados em seis anos, não re­no­vá­veis, vi­sando a sua es­ta­bi­li­zação.

No que res­peita ao Di­reito à li­ber­dade e se­gu­rança (art. 27.º), re­levo para a pro­posta que eli­mina a pos­si­bi­li­dade de apli­cação de prisão dis­ci­plinar aos mi­li­tares em tempo de paz e fora de mis­sões mi­li­tares.

Já sobre a Ex­pulsão, ex­tra­dição e di­reito de asilo (art. 33.º), os de­pu­tados co­mu­nistas querem ver re­to­mada a proi­bição da ex­tra­dição de ci­da­dãos na­ci­o­nais, bem como de ci­da­dãos es­tran­geiros nos casos em que se apli­quem nos países de des­tino penas de prisão per­pétua ou de du­ração in­de­ter­mi­nada.

Pro­posta ino­va­dora, en­qua­drável nos cha­mados «di­reito de ter­ceira ge­ração», é a que con­sagra o di­reito de todos os ci­da­dãos à água e ao sa­ne­a­mento bá­sico (Di­reito à Água, art. 66.º), como ino­vador é também o ar­tigo in­te­gral­mente de­di­cado à Po­lí­tica de pescas e do mar (art. 100.º).

 

Po­deres pre­si­den­ciais

 

A atri­buição ao Pre­si­dente da Re­pú­blica de com­pe­tên­cias na área dos ser­viços de in­for­ma­ções (art. 133.º) está igual­mente con­tem­plada no ar­ti­cu­lado do pro­jecto de re­visão do PCP. Neste caso, como ex­plicou An­tónio Fi­lipe, o ob­jec­tivo é pôr fim à «go­ver­na­men­ta­li­zação total da tu­tela dos ser­viços de in­for­ma­ções», pro­pondo que o PR tenha com­pe­tên­cias nessa ma­téria.

Ainda no do­mínio da Com­pe­tência Po­lí­tica (art. 197.º), pre­vista é a in­ter­venção obri­ga­tória do Go­verno, da As­sem­bleia da Re­pú­blica e do Pre­si­dente da Re­pú­blica na de­cisão de envio de forças mi­li­tares para o es­tran­geiro. Trata-se, aqui, de re­forçar os po­deres destes dois úl­timos ór­gãos de so­be­rania.

Jus­ti­fi­cado re­alce me­rece também a pro­posta que visa eli­minar a pos­si­bi­li­dade de di­mi­nuição do nú­mero de de­pu­tados da As­sem­bleia da Re­pú­blica – fi­xando o seu nú­mero em 230 - , bem como a que veda a pos­si­bi­li­dade de exis­tência de cír­culos uni­no­mi­nais, sendo ainda de su­bli­nhar a que prevê o au­mento das ma­té­rias in­cluídas na re­serva de com­pe­tência da As­sem­bleia da Re­pú­blica.

A con­sa­gração da pos­si­bi­li­dade de este órgão de so­be­rania sus­pender a apli­cação de de­cretos-lei do Go­verno quando sub­me­tidos a apre­ci­ação par­la­mentar (art. 169.º) é também de­fen­dida pela ban­cada co­mu­nista.

«O que pro­pomos é que, sendo sus­ci­tada a apre­ci­ação par­la­mentar de de­cretos-lei, a As­sem­bleia da Re­pú­blica possa de­ter­minar a sua sus­pensão de vi­gência até que haja uma de­cisão final re­la­tiva à apre­ci­ação par­la­mentar», pre­cisou An­tónio Fi­lipe.

Se­gundo as pro­postas do PCP, as leis de fi­nanças re­gi­o­nais e as leis de fi­nanças lo­cais devem ser ele­vadas à ca­te­goria de leis or­gâ­nicas, o que im­plica a sua apro­vação por mai­oria ab­so­luta de de­pu­tados em efec­ti­vi­dade de fun­ções.

 

Re­forçar com­pe­tên­cias

 

No que se re­fere ao Tri­bunal de Contas (art. 214.º), im­porta re­forçar as suas com­pe­tên­cias de fis­ca­li­zação, na pers­pec­tiva do PCP, que, fa­lando do Mi­nis­tério Pú­blico (art. 219.º), aponta para o re­forço da sua au­to­nomia, de­sig­na­da­mente com a cons­ti­tu­ci­o­na­li­zação do Con­selho Su­pe­rior do Mi­nis­tério Pú­blico, o au­mento das suas com­pe­tên­cias e a al­te­ração da sua com­po­sição.

Quanto ao Re­pre­sen­tante da Re­pú­blica (art. 230.º), o PCP pugna pela au­dição dos par­tidos re­pre­sen­tados nas As­sem­bleias Le­gis­la­tivas das re­giões au­tó­nomas para a no­me­ação e exo­ne­ração da­quele cargo, de­fen­dendo, por outro lado, a apli­cação do re­gime de in­com­pa­ti­bi­li­dades e im­pe­di­mentos da As­sem­bleia da Re­pú­blica e do Go­verno às as­sem­bleias das re­giões au­tó­nomas e aos go­vernos re­gi­o­nais, no que diz res­peito ao Órgão de Go­verno Pró­prio das Re­giões Au­tó­nomas (art. 231.º).

 

Re­gi­o­na­li­zação

 

Os de­pu­tados co­mu­nistas querem ainda que seja con­sa­grada a ga­rantia de eleição di­recta das câ­maras mu­ni­ci­pais (art. 252.º), en­ten­dendo, si­mul­ta­ne­a­mente, que deve ser eli­mi­nada a exi­gência de re­fe­rendo para a cri­ação de re­giões ad­mi­nis­tra­tivas, no ar­tigo sobre a sua Ins­ti­tuição em con­creto (art. 256.º).

A con­sa­gração da na­tu­reza civil de todas as forças de se­gu­rança e a eli­mi­nação das res­tri­ções cons­ti­tu­ci­o­nais ao di­reito à greve dos seus pro­fis­si­o­nais, no ar­tigo de­di­cado às Res­tri­ções ao exer­cício de di­reitos (art. 270.º), avultam entre as pro­postas que dão corpo ao pro­jecto de re­visão cons­ti­tu­ci­onal do PCP, que acolhe a con­sa­gração de uma acção cons­ti­tu­ci­onal de de­fesa dos ci­da­dãos contra vi­o­la­ções de di­reitos, li­ber­dades e ga­ran­tias por parte dos po­deres pú­blicos, a exercer di­rec­ta­mente junto do Tri­bunal Cons­ti­tu­ci­onal, no ar­tigo re­la­tivo à In­cons­ti­tu­ci­o­na­li­dade dos actos po­lí­ticos (art. 283.º).

 

So­be­rania e dig­ni­dade


Às ques­tões re­la­ci­o­nadas com a de­fesa da so­be­rania e in­de­pen­dência na­ci­onal de­dica o PCP uma par­ti­cular atenção pro­pondo, no­me­a­da­mente, a eli­mi­nação das normas que per­mitem a sis­te­má­tica trans­fe­rência da so­be­rania na­ci­onal para as ins­ti­tui­ções da União Eu­ro­peia e que ad­mitem a pre­va­lência das normas ema­nadas da União Eu­ro­peia sobre o Di­reito in­terno, in­cluindo a pró­pria Cons­ti­tuição.

A exi­gência de pa­recer vin­cu­la­tivo da As­sem­bleia da Re­pú­blica para que o Es­tado por­tu­guês se vin­cule na União Eu­ro­peia em ma­té­rias da sua com­pe­tência é outra das al­te­ra­ções pre­co­ni­zada pelo PCP no quadro da Com­pe­tência po­lí­tica e le­gis­la­tiva (art. 161.º).

No plano do Di­reito in­ter­na­ci­onal (art. 8.º), re­levo ainda para a eli­mi­nação da su­bor­di­nação da Cons­ti­tuição Por­tu­guesa à ju­ris­dição do Tri­bunal Penal In­ter­na­ci­onal, ga­ran­tindo a plena com­pe­tência dos tri­bu­nais por­tu­gueses para o jul­ga­mento de crimes contra a Hu­ma­ni­dade.

 

Apro­fundar di­reitos

 

Ma­téria a que o PCP dá uma es­pe­cial re­le­vância é ainda a da Se­gu­rança So­cial e So­li­da­ri­e­dade (art. 63.º). São vá­rias as pro­postas neste do­mínio, vi­sando, no­me­a­da­mente, a ga­rantia do ca­rácter pú­blico, uni­versal e so­li­dário da se­gu­rança so­cial, bem como a va­lo­ri­zação das pen­sões e re­formas e a pro­tecção dos di­reitos ad­qui­ridos em ma­téria de se­gu­rança so­cial.

Des­taque, ainda, para a cons­ti­tu­ci­o­na­li­zação de um ren­di­mento mí­nimo de sub­sis­tência a todos os ci­da­dãos.

Trata-se da de­fi­nição de um «ren­di­mento abaixo do qual o Es­tado não per­mite que nin­guém viva», es­cla­receu Ber­nar­dino So­ares.

A gra­tui­ti­dade dos cui­dados de saúde, através de um Ser­viço Na­ci­onal de Saúde uni­versal, geral e gra­tuito é outro prin­cípio que o PCP quer ver con­sa­grado na Cons­ti­tuição (art. 64.º), tal como não ab­dica da gra­tui­ti­dade de acesso a todos os graus de en­sino (art. 74.º).

 

O valor do tra­balho

 

A ga­rantia de vín­culo pú­blico de no­me­ação dos tra­ba­lha­dores da Ad­mi­nis­tração Pú­blica (art. 269.º re­la­tivo ao Re­gime da Função Pú­blica) é uma das me­didas cons­tantes no pro­jecto do PCP, que, por outro lado, de­tendo-se no ca­pí­tulo dos Di­reitos dos tra­ba­lha­dores (art. 59.º), con­si­dera es­sen­cial a es­pe­ci­fi­cação de ga­ran­tias es­pe­ciais da re­tri­buição dos tra­ba­lha­dores, além de vá­rias ou­tras dis­po­si­ções re­la­tivas a ma­té­rias como sa­lário mí­nimo, con­tra­tação co­lec­tiva e ho­rário de tra­balho (ver peça prin­cipal).

Os de­pu­tados co­mu­nistas querem igual­mente ver con­sa­grado na Lei Fun­da­mental o di­reito dos jor­na­listas a não pra­ticar actos pro­fis­si­o­nais con­trá­rios à sua cons­ci­ência, pro­posta que for­ma­lizam no ar­tigo sobre Li­ber­dade de im­prensa e meios de co­mu­ni­cação so­cial (art. 38.º).



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