Rasuras

Se­gundo os jor­nais, o pro­cesso Face Oculta, cuja ins­trução se inicia esta se­mana, chegou à Co­marca do Baixo Vouga e ao Tri­bunal Cen­tral de Ins­trução Cri­minal (os dois tri­bu­nais onde vai de­correr a ins­trução) com um as­pecto, no mí­nimo, ori­ginal: todas as pas­sa­gens re­la­tivas às con­versas entre Só­crates e Ar­mando Vara foram ra­su­radas ou sim­ples­mente eli­mi­nadas. Como? Cor­tadas à te­soura!

Re­corde-se que foi a Pro­cu­ra­doria-Geral da Re­pú­blica, di­ri­gida pelo pro­cu­rador-geral Pinto Mon­teiro, a en­ti­dade que en­viou o pro­cesso. Logo, só a Pro­cu­ra­doria-Geral da Re­pú­blica, e sob in­dis­pen­sável mando e im­pério do sr. Pro­cu­rador-Geral, é que po­deria(m) aplicar as ra­suras e os cortes com que o pro­cesso chegou aos tri­bu­nais com­pe­tentes, vi­o­lando gros­sei­ra­mente a de­li­be­ração to­mada ime­di­a­ta­mente antes, também em tri­bunal com­pe­tente, im­pondo a sus­pensão da des­truição das gra­va­ções agora ra­su­radas e eli­mi­nadas.

Que até ti­vesse sido feito à te­sou­rada, e a mando da Pro­cu­ra­doria, não deixa de ser iro­ni­ca­mente su­ges­tivo...

 

Cri­mi­na­li­dades

 

En­tre­tanto, saiu a pú­blico um re­la­tório do Ob­ser­va­tório de Se­gu­rança as­si­na­lando que a cri­mi­na­li­dade está mais vi­o­lenta e or­ga­ni­zada no nosso País. Em 2010 foi re­gis­tado não apenas um au­mento de as­saltos vi­o­lentos, como esses as­saltos foram exe­cu­tados com «grande pro­fis­si­o­na­lismo na pre­pa­ração e exe­cução de ac­ções». Foi des­ta­cada a vaga de as­saltos e roubos a ou­ri­ve­sa­rias, as­si­na­lando-se que jóias rou­badas em Por­tugal têm sido de­tec­tadas a cir­cular em Es­panha no dia se­guinte, o que re­vela também o grau de in­ter­na­ci­o­na­li­zação destas or­ga­ni­za­ções.

Pe­rante isto – que não é pouco -, o Go­verno con­tinua a de­sin­vestir na for­mação hu­mana e ma­te­rial das po­lí­cias e dos di­versos sis­temas de se­gu­rança, como está pa­tente nas rei­vin­di­ca­ções dos di­versos sin­di­catos do sector. Isto tudo com o ine­nar­rável mi­nistro Rui Pe­reira a ga­rantir dia sim, dia não, as me­lho­rias in­com­pa­rá­veis re­gis­tadas na se­gu­rança pú­blica, pela sua di­recta acção, evi­den­te­mente.

 

Vendas

 

A venda de au­to­mó­veis novos em Por­tugal en­trou na crise do cos­tume, à se­me­lhança da compra de ha­bi­tação nova, mer­gu­lhando de ano para ano num vór­tice de que­bras. No final deste ano, e no que res­peita a au­to­mó­veis novos, houve um pico re­pen­tino na su­bida de vendas pro­vo­cado pelo anun­ciado au­mento de preços e o fim do sub­sídio de abate dado pelo Go­verno. Ao que pa­rece, o me­lhor re­corde de vendas desde 2002. Nada que anime os co­mer­ci­antes do ramo, que já sabem – e por isso já o dizem – que logo que en­trar o ano de 2011 as vendas con­ti­nu­arão a descer ver­ti­gi­no­sa­mente.

Mas também houve um outro re­corde de vendas no sector au­to­móvel: as vá­rias marcas ce­le­bri­zadas pelos seus carros de topo de gama, ba­teram, aí, re­cordes em re­lação aos úl­timos nove anos, com vendas su­pe­ri­ores às re­gis­tadas pelo menos desde 2002. Para que conste, a venda dessas «pre­ci­o­si­dades» subiu, neste ano de 2010, qual­quer coisa como 50%.

Es­tamos, re­corde-se, a falar de vi­a­turas que, em regra, custam, cada uma, o su­fi­ci­ente para com­prar um apar­ta­mento ou uma casa de­centes...

Crise? O País está no bu­raco? Onde? Como se vê, o di­nheiro abunda – está é muito, muito mal dis­tri­buído...



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