Evocação de Bento de Jesus Caraça

Homenagem ao intelectual que não desertou

O salão do Centro de Tra­balho Vi­tória, em Lisboa, en­cheu-se para ho­me­na­gear Bento de Jesus Ca­raça, «fi­gura ímpar da nossa his­tória re­cente como ci­en­tista, pen­sador mar­xista e homem de cul­tura, como in­te­lec­tual com­pro­me­tido com as as­pi­ra­ções e as lutas do seu povo, como mi­li­tante co­mu­nista, como co­ra­joso com­ba­tente pela uni­dade de­mo­crá­tica e an­ti­fas­cista», des­tacou Je­ró­nimo de Sousa no en­cer­ra­mento da ini­ci­a­tiva, re­a­li­zada an­te­ontem.

«O exemplo de Bento de Jesus Ca­raça é vivo e ac­tual»

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De­pois da lei­tura de dois textos de Bento de Jesus Ca­raça e de um mo­mento mu­sical, coube ao Se­cre­tário-geral do PCP lem­brar que «no ano em que co­me­mo­ramos o 90.º ani­ver­sário do nosso Par­tido e re­a­vi­vamos a imagem da in­com­pa­rável cons­trução co­lec­tiva que o PCP é, gos­ta­ríamos de poder enu­merar um a um os nomes dos seus cons­tru­tores».

Mas tal não é ma­te­ri­al­mente pos­sível, sa­li­entou Je­ró­nimo de Sousa pe­rante a pla­teia en­vol­vida pela ex­po­sição do Par­tido que evoca o 110.º ani­ver­sário de Bento de Jesus Ca­raça. Mas «quando fa­lamos da­queles nomes que a nossa me­mória co­lec­tiva mais des­taca, ve­ri­fi­camos que entre todos existe uma coisa em comum: sendo per­so­na­li­dades in­di­vi­duais de ca­rac­te­rís­ticas ex­cep­ci­o­nais, todos agiram com a pro­funda cons­ci­ência de que das suas in­vul­gares ca­pa­ci­dades apenas de­corria uma acres­cida res­pon­sa­bi­li­dade pe­rante o seu povo. De que é no con­tri­buto para a luta pelo de­sen­vol­vi­mento e eman­ci­pação das massas po­pu­lares – nas múl­ti­plas di­men­sões que esta luta as­sume – que os grandes ta­lentos in­di­vi­duais en­con­tram a sua mais alta re­a­li­zação», acres­centou antes de frisar que «é esse o exemplo de Bento de Jesus Ca­raça».

 

Fiel às raízes

 

Filho de tra­ba­lha­dores ru­rais, Bento de Jesus Ca­raça não foi con­de­nado ao cer­ce­a­mento in­te­lec­tual que a sua origem mo­desta in­di­cava, e aos 22 anos era já do­cente uni­ver­si­tário. «Mas essa im­pres­si­o­nante tra­jec­tória não mo­di­ficou nem o seu ca­rácter nem a fi­de­li­dade às suas raízes. Saído "do fundo das massas" – na sua pró­pria ex­pressão – elevou-se a uma alta si­tu­ação so­cial e cul­tural», con­ser­vando-se fiel «à sua pró­pria classe e aos seus ideais de eman­ci­pação hu­mana» e não de­ser­tando para o «campo con­trário», disse ainda Je­ró­nimo de Sousa lem­brando as pa­la­vras do pró­prio ho­me­na­geado.

«A fi­de­li­dade ao sen­tido de per­tença ao povo nor­teou toda a vida e toda a ac­ti­vi­dade cul­tural, cí­vica e po­lí­tica de Bento de Jesus Ca­raça», con­ti­nuou o Se­cre­tário-geral do PCP para frisar que «Bento de Jesus Ca­raça via na sua tra­jec­tória pes­soal a tra­jec­tória de en­ri­que­ci­mento cul­tural e in­te­lec­tual ne­ces­sária ao “des­pertar co­lec­tivo das massas”», por isso «todo o seu imenso tra­balho de di­vul­gação e pro­moção da cul­tura as­senta nesse en­ten­di­mento, numa con­cepção pro­fun­da­mente de­mo­crá­tica e anti-eli­tista da cul­tura», ex­pressa na in­ter­venção cul­tural, nos cursos que ori­en­tava nos sin­di­catos de classe, na Uni­ver­si­dade Po­pular e na Bi­bli­o­teca Cosmos ou nas con­fe­rên­cias, ac­ti­vi­dades através das quais pro­cu­rava con­tri­buir para a luta contra o «”mo­no­pólio da cul­tura” que iden­ti­fi­cava como uma das faces do mo­no­pólio da ri­queza e do poder pelas classes do­mi­nantes».

 

Con­fi­ança

 

«O pen­sa­mento de Bento de Jesus Ca­raça sobre a cul­tura marca pro­fun­da­mente toda a re­flexão de­mo­crá­tica desde então. Tornou-se parte in­te­grante, não apenas do pa­tri­mónio teó­rico e ide­o­ló­gico do nosso Par­tido, mas das suas ori­en­ta­ções pro­gra­má­ticas es­pe­cí­ficas, e ex­pres­sa­mente da con­cepção de de­mo­cracia cul­tural, uma das quatro ver­tentes da de­mo­cracia avan­çada por que nos ba­temos», con­si­derou ainda o Se­cre­tário-geral do PCP, para quem «a di­mensão cí­vica e po­lí­tica de Bento de Jesus Ca­raça vai muito para além da sua ad­mi­rável acção no plano da cul­tura», dado que teve des­ta­cado papel no com­bate à ameaça fas­cista e, pos­te­ri­or­mente no mo­vi­mento de uni­dade an­ti­fas­cista em re­pre­sen­tação do PCP, facto que lhe valeu o afas­ta­mento da uni­ver­si­dade, mas deixou-lhe in­tacto o «exemplo de dig­ni­dade, co­ragem e su­pe­ri­o­ri­dade moral», a «co­e­rência e fir­meza de prin­cí­pios», a «fi­de­li­dade aos in­te­resses e as­pi­ra­ções do seu povo», o «exemplo de con­fi­ança no ser hu­mano» e no so­ci­a­lismo como fu­turo da hu­ma­ni­dade.

Para Je­ró­nimo de Sousa, «o exemplo in­te­lec­tual de Bento de Jesus Ca­raça é vivo e ac­tual em múl­ti­plos as­pectos. E um da­queles em que é mais ac­tual é o do rigor ci­en­tí­fico na in­ves­ti­gação e no co­nhe­ci­mento do real, do res­peito pela au­to­nomia do tra­balho in­te­lec­tual e ci­en­tí­fico, pela con­tro­vérsia e o de­bate. Um dos as­pectos mais cho­cantes da ac­tual crise global do ca­pi­ta­lismo é a ten­ta­tiva de im­po­sição, sem es­cru­tínio, sem con­tro­vérsia e sem crí­tica, de um re­cei­tuário eco­nó­mico des­pro­vido de base ci­en­tí­fica e de uma car­tilha ide­o­ló­gica em per­ma­nente con­flito e con­tra­dição com a re­a­li­dade, ao mesmo tempo que são si­len­ci­adas, ocul­tadas, ex­cluídas do de­bate e até pros­critas cor­rentes de pen­sa­mento que pre­viram e ca­rac­te­rizam com rigor a si­tu­ação exis­tente e apontam as pers­pec­tivas reais de a ul­tra­passar».

«E é neste tempo car­re­gado de pe­rigos e com­ple­xi­dades, neste tempo con­creto – com o exemplo de Bento de Jesus Ca­raça, com a pre­sença tão viva entre nós deste homem nas­cido há 110 anos, com a sua con­fi­ança no fu­turo cons­truído pela acção das massas po­pu­lares –, que nós pros­se­guimos o com­bate pela eman­ci­pação do ser hu­mano em re­lação a todas as formas de ex­plo­ração e opressão, pela li­ber­dade, pelo so­ci­a­lismo. Com a cer­teza, que era também a sua, de que ven­ce­remos», con­cluiu o Se­cre­tário-geral co­mu­nista.


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