Os razoáveis

João Frazão

Rui Ma­chete foi en­tre­vis­tado pela An­tena 1, na pas­sada se­mana. Fa­lemos sobre isso. Talvez seja ne­ces­sário co­meçar por si­tuar o ca­va­lheiro e a si­tu­ação.

Quanto a Rui Ma­chete, é, sempre foi, um homem do ca­pital. Não por acaso, para além de di­versas pastas go­ver­na­men­tais acu­mulou a sua ac­ti­vi­dade de homem de leis com a ad­mi­nis­tração de em­presas (in­cluindo a Pre­si­dência do Con­selho Su­pe­rior do BPN) e com a Pre­si­dência da Fun­dação Luso-Ame­ri­cana para o De­sen­vol­vi­mento, não se que­rendo dis­correr aqui sobre esta ne­bu­losa es­tru­tura, sobre as suas ac­ti­vi­dades, sobre os seus ob­jec­tivos, sobre os fi­nan­ci­a­mentos que dis­tri­buiu.

Rui Ma­chete faz parte de uma ga­leria de no­tá­veis da di­reita por­tu­guesa que são cha­mados a pro­nun­ciar-se quando é pre­ciso fazer cir­cular certas ideias, quase sempre ti­radas de baús bo­lo­rentos, de que eles são guar­diões de pleno di­reito.

O que, com­pre­ende-se bem, ex­plica o facto de Rui Ma­chete ter sido con­vi­dado para a tal en­tre­vista na An­tena 1 a pro­pó­sito de coisa ne­nhuma. A esse pro­pó­sito, Rui Ma­chete en­car­regou-se de dar di­mensão à ideia de que a «força de­mo­crá­tica do PCP é in­fe­rior à sua força real», pre­su­mindo o atento ou­vinte que se a pri­meira é de­mo­crá­tica a se­gunda deve ser al­guma coisa di­fe­rente.

E, não con­tente, atira ainda que no PCP há «di­ri­gentes ra­zoá­veis» – su­pondo-se também que os há de ou­tros ma­tizes – que sabem que é pre­ciso conter a rua, acalmar os pro­testos e re­la­ti­vizar a luta.

Rui Ma­chete sabe que o PCP é al­ta­mente ra­zoável. E que, porque o é, co­locar-se-á sempre do lado da razão. Que nos diz que não é ra­zoável o au­mento da ex­plo­ração e o corte nos di­reitos, a pri­va­ti­zação de em­presas e a de­gra­dação dos ser­viços pú­blicos, o corte nos apoios so­ciais e os be­ne­fí­cios de mi­lhões para a banca. Que não é ra­zoável o de­sem­prego, a po­breza, a mi­séria que nos querem impor.

E que nos diz que não só é ra­zoável que o PCP es­teja na pri­meira linha da di­na­mi­zação da luta de massas, na mo­bi­li­zação dos tra­ba­lha­dores e das po­pu­la­ções para essa luta, como seria ab­so­lu­ta­mente es­tranho, pouco ra­zoável e com­ple­ta­mente inin­te­li­gível para as ví­timas desta po­lí­tica que o PCP, no ano em que as­si­nala o seu 90.º ani­ver­sário, re­ne­gasse agora o seu papel de sempre de van­guarda re­vo­lu­ci­o­nária e traísse os que estão na base da força de­mo­crá­tica e po­pular que fez dele o Par­tido pres­ti­giado e in­flu­ente que é hoje.



Mais artigos de: Opinião

Revelações

O XIX Governo constitucional de Passos Coelho estreou-se com o incumprimento de uma promessa e duas decisões algo reveladoras. A promessa consistiu em dar à posse um Executivo com 36 secretários de Estado, contra os 20 e poucos garantidos em campanha eleitoral, o que revela alguma agilidade a...

Inevitável, só a luta!

Na vés­pera e no dia das elei­ções, dando se­gui­mento a uma linha de iden­ti­fi­cação e de apoio com o rumo de de­clínio na­ci­onal im­posto ao País nas úl­timas dé­cadas e de in­cen­tivo aos par­tidos da po­lí­tica de di­reita para que as­su­missem em con­junto a sub­missão às im­po­si­ções da troika, o Pre­si­dente da Re­pú­blica exerceu uma ina­cei­tável chan­tagem sobre os elei­tores ao afirmar que quem não vo­tasse – sendo que o sr. Pre­si­dente não se coibiu de ex­pressar que esse voto es­tava como que li­mi­tado aos par­tidos da troika –, não po­deria, após as elei­ções, ter opi­nião ou até pro­testar face ao mais que certo agra­va­mento da si­tu­ação eco­nó­mica e so­cial do País.

Chantagem sobre a Grécia

O Conselho Europeu de 23/24 de Junho foi bem ilustrativo da natureza de classe da União Europeia e de como as suas instituições e políticas estão inteiramente ao serviço do grande capital e das grandes potências e, mais especificamente, ao serviço do grande capital...

Branco é...

A notícia de que uma conhecida jornalista, que deteve até há algum tempo responsabilidades de edição política num dos principais canais de televisão, assumiu funções na área da comunicação do governo não é...

O mundo dos ricos

As firmas Merryl Linch e Capgemini publicam anualmente o World Wealth Report (Relatório sobre a riqueza mundial). De facto, este relatório não é bem sobre a riqueza mundial. É sobre uns quantos que concentram essa riqueza nos seus bolsos. Dividem-se em duas categorias: os HNWI (high...