Fim das emissões analógicas e início da TDT

Apagão vira negócio gigantesco

Coin­ci­dindo com o des­ligar da emissão ana­ló­gica na faixa li­toral, inicia-se hoje a pri­meira fase de in­tro­dução da Te­le­visão Di­gital Ter­restre (TDT). Cen­tenas de mi­lhares de pes­soas vão porém ficar pri­vadas de aceder e fruir o seu di­reito à te­le­visão.

Vastas áreas ficam sem emissão

Esta é desde logo a con­sequência ime­diata da re­cusa do Go­verno em re­ca­len­de­rizar o pro­cesso de des­li­ga­mento dos emis­sores e re­trans­mis­sores que as­se­guram o sinal ana­ló­gico. Por esse ob­jec­tivo ba­ta­lhou o Grupo Par­la­mentar do PCP, que apre­sentou não só um pro­jecto de re­so­lução nesse sen­tido (que a mai­oria de di­reita chumbou sexta-feira pas­sada) como pro­moveu faz hoje oito dias um de­bate de ur­gência no de­curso do qual expôs com de­talhe as ra­zões que jus­ti­fi­ca­riam com acerto um adi­a­mento no pre­sente caso. Assim o não en­tendeu o Go­verno que, pela voz do mi­nistro Mi­guel Relvas, as­se­gurou que as datas se­riam cum­pridas, não obs­tante re­co­nhecer que «há obs­tá­culos que têm de ser ul­tra­pas­sados» na im­plan­tação da TDT. Ad­mitiu mesmo que chegou a ser pon­de­rado o adi­a­mento do pro­cesso até 31 de De­zembro, mas que a «re­a­li­dade dos con­tratos as­si­nados pelos ope­ra­dores e as­su­midos com a PT», tal como as «cir­cuns­tân­cias», de­sa­con­se­lharam a efec­ti­vação de tal ce­nário.
O que sig­ni­fica, por ou­tras pa­la­vras, que a pesar de­ci­si­va­mente na po­sição do Exe­cu­tivo de Passos Co­elho e Paulo Portas es­ti­veram os in­te­resses dos ope­ra­dores, em par­ti­cular da PT, e não os das po­pu­la­ções que vêem des­li­gados nas suas re­giões os emis­sores e re­trans­mis­sores que até aqui as­se­gu­ravam com qua­li­dade as emis­sões te­le­vi­sivas.


Des­prezo pelas po­pu­la­ções


O que só con­firma, aliás, a ava­li­ação do PCP sobre todo este pro­cesso. Bruno Dias, no de­bate, não pou­pando crí­ticas, con­si­derou mesmo que esta ope­ração de des­li­ga­mento das emis­sões ana­ló­gicas fi­cará para a his­tória «como um dos ne­gó­cios mais ver­go­nhosos, mais de­sas­trosos, com im­pactos di­rectos para a vida das pes­soas».
«Tudo neste pro­cesso da TDT foi mo­ti­vado não pela de­fesa do bem comum pú­blico mas sim pela de­fesa de in­te­resses pri­vados de grandes grupos eco­nó­micos, no­me­a­da­mente das ope­ra­doras de te­le­co­mu­ni­ca­ções e em par­ti­cular da PT», acusou o de­pu­tado do PCP, para quem este é mais um caso elu­ci­da­tivo de «como o poder po­lí­tico está ao ser­viço do poder eco­nó­mico».
Com efeito, em­bora o mi­nistro Mi­guel Relvas diga que a «obri­gação as­su­mida pela PT» nos con­tratos «está cum­prida», e não obs­tante a ga­rantia da ANACOM de que a co­ber­tura ac­tual da TDT chega a 90 por cento da po­pu­lação (o que é muito abaixo dos ac­tuais 98% de co­ber­tura da RTP1), a re­a­li­dade é porém outra.
Dela deu conta no de­bate a ban­cada co­mu­nista, exem­pli­fi­cando com os tes­te­mu­nhos che­gados ao seu co­nhe­ci­mento de muitas áreas que à par­tida de­ve­riam estar co­bertas mas onde não é pos­sível captar a TDT.
O que não é alheio ao facto de a PT, em­presa con­ces­si­o­nária da rede TDT em Por­tugal, ter co­lo­cado um mí­nimo de emis­sores no ter­ri­tório, con­cen­trado-os nas áreas de maior den­si­dade po­pu­la­ci­onal por forma a «ma­xi­mizar com um mí­nimo de custos a quota de co­ber­tura a que es­tava obri­gada». O pro­blema é que deixou «vastas áreas ge­o­grá­ficas sem emissão ter­restre», como anotou Bruno Dias, que lem­brou que há con­ce­lhos in­teiros cuja única al­ter­na­tiva para aceder à te­le­visão é por sa­té­lite, «como se es­ti­vessem na Flo­resta Ama­zó­nica ou no de­serto do Saara».
O líder par­la­mentar co­mu­nista, Ber­nar­dino So­ares, não deixou de la­mentar, por outro lado, o facto de a in­tro­dução da nova pla­ta­forma não ser apro­vei­tada para alargar a oferta, livre e gra­tuita, para todos, de todos os ca­nais da Te­le­visão Pú­blica.
Re­cor­dada a este res­peito foi a cir­cuns­tância de Por­tugal ser o país eu­ropeu com o menor nú­mero de ca­nais por TDT, en­quanto todos os ou­tros, quando a in­tro­du­ziram, alar­garam a oferta te­le­vi­siva. Es­panha tem 29 ca­nais de acesso gra­tuito, o Reino Unido 38, Itália 27, França 29, Ale­manha 20, sendo que todos eles têm no mí­nimo 8 ca­nais de ser­viço pú­blico, à ex­cepção do país vi­zinho que tem cinco.

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Po­pu­lação a arder


Os custos acres­cidos para a po­pu­lação para aceder por TDT aos mesmos ca­nais que tem hoje em sinal aberto, quer por via da compra de con­ver­sores quer pela im­po­sição de con­tratos adi­ci­o­nais nas áreas sem co­ber­tura pre­vista pela rede di­gital, é outro dos as­pectos que sus­cita as mai­ores crí­ticas do PCP, com Ber­nar­dino So­ares a con­si­derar que esta é uma si­tu­ação «ina­cei­tável».
Custos para a po­pu­lação que estão na razão di­recta dos ga­nhos para os ope­ra­dores. «Este pro­cesso está a trans­formar-se num gi­gan­tesco me­ca­nismo de an­ga­ri­ação de cli­entes para o MEO do grupo PT, de venda de re­cep­tores de sa­té­lite for­ne­cidos pela PT, de venda e ins­ta­lação de pontos de emis­sões de micro co­ber­tura. E de li­ber­tação de frequên­cias para o ne­gócio das co­mu­ni­ca­ções mó­veis 4G, para a Vo­da­fone, a Ot­pimus/​So­na­ecom e, claro, a PT», de­clarou Bruno Dias. Foi re­fe­rido, a pro­pó­sito, que a ins­ta­lação por via sa­té­lite à po­pu­lação ex­cluída da TDT custa cerca de 116 euros por equi­pa­mento, para um único te­le­visor, sendo que é a PT que detém o ex­clu­sivo da venda da­queles re­cep­tores sa­té­lites.
A mesma PT que, quando há de­nún­cias por parte das au­tar­quias em re­lação ao aban­dono a que as suas po­pu­la­ções são vo­tadas neste pro­cesso, logo apa­rece, pres­ti­mosa, a ofe­recer às mesmas au­tar­quias os seus ser­viços. O mais re­cente caso che­gado ao co­nhe­ci­mento da ban­cada do PCP foi o da pro­posta à Câ­mara de Vou­zela, para a ins­ta­lação de três pontos emis­sores de micro co­ber­tura a po­vo­a­ções do con­celho, «pela mó­dica quantia de 90 mil euros».
«Chama-se a isto criar di­fi­cul­dades para vender so­lu­ções», con­cluiu Bruno Dias.

  
Ca­len­dário

Na pri­meira fase de in­tro­dução da TDT, com início pre­visto para hoje, são des­li­gados os emis­sores e re­trans­mis­sores que co­brem toda a faixa li­toral do con­ti­nente, in­cluindo a ca­pital.
Segue-se, a 22 de Março, o ar­ranque da se­gunda fase, com o fecho dos emis­sores e re­trans­mis­sores das re­giões au­tó­nomas dos Açores e da Ma­deira.
Para 26 de Abril, se­gundo a ANACOM – Au­to­ri­dade Na­ci­onal das Co­mu­ni­ca­ções, cumpre-se a der­ra­deira etapa, ces­sando as trans­mis­sões ana­ló­gicas em todo o ter­ri­tório na­ci­onal.

 



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