Comentário

O pacto, o tratado e a luta

João Ferreira

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A aplicação do pacto de agressão FMI-UE/PS-PSD-CDS vem agravando todos os problemas nacionais, inclusivamente aquele que, alegadamente, o teria justificado: o insustentável peso da dívida externa e os juros insuportáveis exigidos pelos «mercados» para financiamento do Estado.

Não é novidade. Apenas se comprova o que, desde há nove meses a esta parte, vimos dizendo.

As políticas do pacto não travam o crescimento da dívida. Pelo contrário, agravam o problema.

De acordo com as previsões da própria Comissão Europeia, a dívida pública portuguesa ultrapassará os 110 por cento do PIB em 2012 (há um ano rondava os 100%).

Nas emissões de dívida realizadas no início deste ano, os juros atingiram os níveis mais elevados de sempre, desde a entrada no euro (apesar da vigência do pacto de agressão, o Estado português continua a emitir dívida pública, a curto prazo, para assegurar parte das suas necessidades de financiamento). O spread dos títulos a dez anos (ou seja, a distância face aos juros cobrados à Alemanha, pela emissão de títulos com idêntica maturidade) ronda os 16 por cento, no que apenas somos ultrapassados pela Grécia.

Intensifica-se, assim, o processo de extorsão de recursos nacionais, a que o País se encontra submetido. Os juros da dívida pública são uma das vias pelas quais essa extorsão se pratica, mas não a única – veja-se o caso das privatizações.

A Grécia, onde a agressão leva um ano de avanço, demonstra à evidência as consequências do caminho traçado pelo FMI e a UE. A recessão aprofunda-se, o desemprego e a dívida disparam; a devastação social e económica atinge proporções dramáticas.

O dobrar de cerviz do ministro Gaspar ante o ministro das Finanças alemão, transmitido pelas televisões na passada semana, durante o último ECOFIN, deita definitivamente por terra as juras de que a Grécia seria um caso único. Por cá, com um cinismo a toda a prova, alguns dos que há nove meses negociaram a venda do País invocam agora uma alteração dos pressupostos deste primeiro pacto de agressão para, tal como sucede na Grécia, abrir caminho a um segundo, lá para 2013.

No fundo, todos admitem agora o que já todos há muito perceberam (a começar pelos «mercados»): nas condições dos pactos de agressão FMI-UE, a dívida é impagável.

Neste contexto, confirmam-se duas teses essenciais:

A primeira: que as medidas do actual Governo, longe de serem temporárias ou excepcionais, visam na verdade uma subversão e reconfiguração profunda e duradoura do regime democrático-constitucional.

A segunda: que a derrota deste pacto de agressão constitui a mais premente tarefa que se coloca aos trabalhadores e ao povo português. A luta, previsivelmente prolongada, contra a sua aplicação, constituirá um factor decisivo na determinação do rumo da vida nacional nos próximos anos, ou mesmo décadas.

 

Um novo tratado europeu

 

A aplicação, no plano interno, das medidas do pacto de agressão FMI-UE/PS-PSD-CDS, decorre no contexto de inquietantes e perigosos saltos no processo de integração capitalista europeia.

Depois da «governação económica» e do «pacto para o euro mais», surge agora o chamado «pacto orçamental e fiscal», inscrito no Tratado sobre a Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária.

A intenção é forçar a inscrição nas constituições nacionais ou em «lei equivalente» (com carácter «permanente») dos critérios do Pacto de Estabilidade, na sua versão revista e reforçada, ou seja, a imposição de orçamentos sem défice, ou seja, perpetuar as políticas ditas de austeridade – as políticas dos pactos de agressão FMI-UE.

Em caso de incumprimento por parte de um Estado, é despoletado «automaticamente» um «mecanismo de correcção», que obrigará esse Estado a implementar medidas, definidas pela Comissão Europeia, que corrijam os «desvios». E de ora em diante, será adoptado o princípio da «maioria invertida» para a aplicação de sanções. Ou seja, as sanções – que poderão ir até 0,1 por cento do PIB (cerca de 170 milhões de euros, aos valores actuais) – passarão a ser automáticas, só podendo ser impedidas por uma maioria qualificada de estados-membros.

Agrava-se a escalada no ataque à soberania dos povos e à democracia, através de um tratado que foi feito à margem das regras da própria UE, e que se quer assinar à pressa e à força, nas costas dos povos, ainda no primeiro trimestre de 2012.

A luta, em Portugal, contra o pacto de agressão é indissociável da luta contra este tratado, que o quer eternizar. Uma luta que se vai ampliando pela Europa fora, e que é semente de esperança para um futuro melhor.



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