Meses de lutas intensas até 12 de Fevereiro de 1982

Uma greve geral oportuna, legítima e eficaz

Para o patronato, os seus governos e os partidos que defendem os seus interesses, a greve até pode ser legítima... em abstracto. Mas, uma vez convocada, nunca é oportuna, perde legitimidade e não trará qualquer resultado. Esta conversa é velha e ficou bem desmentida na greve geral de 12 de Fevereiro de 1982 – fez no domingo trinta anos.

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A primeira greve geral realizada em Portugal desde o derrube do fascismo teve motivos profundos a justificá-la, mas sofreu uma feroz oposição, quer do Governo AD e da maioria PPD/CDS/PPM no Parlamento, quer do grande capital organizado na CIP, quer ainda da UGT e de Mário Soares, que foi muito para além da «neutralidade» formalmente declarada pela direcção do PS.

Se o antigo chefe da NATO e então secretário de Estado dos EUA, Alexander Haig, veio a Lisboa avisar que por cá subsistia a «ameaça totalitária» de um «movimento de influência lançado por Moscovo», já Ângelo Correia, que era ministro da Administração Interna, semeou a partir da televisão o fantasma de uma «insurreição». Torres Couto, na altura à frente da UGT, ganhou fama pelo combate activo contra a greve, e até teve direito ao rebentamento de uma bomba junto à sua casa.

Para revisitar a época, folheámos a colecção do Avante! e detivemo-nos no Alavanca, órgão da CGTP-IN, que em Março de 1982 iniciou uma nova série com um número dedicado à greve geral (a revista está disponível para consulta na Internet, no Centro de Arquivo e Documentação da central).

A greve geral de 24 horas foi convocada por unanimidade, num plenário nacional de sindicatos, que teve lugar a 15 de Janeiro, no Teatro Aberto, e onde começou por ser discutida uma proposta que apontava para 12 horas de paralisação. Os motivos da decisão foram alinhados em dois pontos, na histórica resolução que os participantes no plenário foram depois entregar à Assembleia da República, apesar de a Polícia ter tentado interromper essa «manifestação ilegal».

Primeiro, «a política da AD aprofunda a crise e é contra os interesses dos trabalhadores e do País» – e aqui se falava na redução dos salários (através da imposição de «tectos» para a sua actualização) e numa proposta de lei que visava facilitar os despedimentos, alargando os limites dos contratos a prazo. Por isto e muito mais, que aqui não cabe, o segundo ponto exigia a demissão do governo. No terceiro ponto defendia-se a «resolução da crise, com os trabalhadores e no respeito pelo 25 de Abril».

No número de 4 de Fevereiro, o Avante! publicava um comunicado do PCP, a declarar o apoio do Partido à greve geral, e dava nota de um balanço do trabalho realizado desde a convocação da luta, realçando que «Grande parte do êxito ganha-se na preparação». Esta preparação «foi uma das maiores acções de massas realizadas pelo movimento sindical unitário», afirmava-se no Alavanca, referindo a realização de cerca de 3500 plenários de empresa, com a participação de cerca de 250 mil trabalhadores. Facto curioso, também registado: o aumento da sindicalização e um movimento «sem precedentes – especialmente no sector de serviços – de mudança de filiação dos sindicatos divisionistas para os sindicatos filiados na CGTP-IN ou para sindicatos aderentes à greve».

As quatro semanas que decorreram desde a convocação da greve geral até à sua realização foram igualmente de muito intenso combate à luta dos trabalhadores, sobretudo por parte do Governo, «que liderou o conjunto das forças de direita» e usou «parte importante do aparelho de Estado, com destaque para os órgãos de comunicação social, hierarquias superiores da Administração Central, conselhos de gerência das empresas nacionalizadas e forças policiais – como se refere no artigo «Quem é contra e quem é a favor?», no Alavanca.

O plenário de sindicatos voltou a reunir uma semana depois da greve geral. Assinalando o êxito desta, avançou para a marcação de grandes manifestações, por todo o País, a 6 de Março. Intervindo na principal dessas manifestações, em Lisboa, o coordenador da CGTP-IN, Armando Teixeira da Silva, destacou a derrota que a greve geral infligiu ao governo e aos divisionistas, e apontou algumas alterações ocorridas após 12 de Fevereiro.

Foram desbloqueados importante processos de contratação colectiva e o «tecto salarial» foi rompido. Acentuaram-se as dificuldades do Governo em aplicar o seu «pacote da saúde». O «pacote laboral», que incluía a lei dos despedimentos, foi congelado. Tornou-se mais evidente a necessidade de demissão do Governo e ganhou maior urgência a necessidade de uma nova política.

A maioria parlamentar da AD durou até meados de Dezembro desse ano e foi desfeita, depois de os três partidos que a constituíam terem saído vencedores das eleições autárquicas realizadas nesse mês, mas com importantes perdas.

 

Duas condições

 

«Uma greve geral não se realiza somente porque é anunciada. A concretização de uma greve geral - acontecimento decisivo na história da classe trabalhadora - implica, por um lado, que os seus objectivos correspondam às necessidades dos trabalhadores e, por outro lado, um grande trabalho de organização, desde a central até às empresas, e uma estreita ligação às massas trabalhadoras.»

 

«Uma grande campanha de mobilização»,

Alavanca, Ano VII, N.º 1, Março de 1982

 

A primeira

há cem anos

 

A primeira greve geral que ganhou dimensão nacional ocorreu nos últimos dias de Janeiro de 1912. Primeiro, em Évora, trabalhadores rurais declararam uma «greve geral», porque os agrários estavam a recusar-se a pagar os salários acordados. A greve acabou por alastrar às outras classes profissionais.

Na feroz repressão contra os grevistas foi lançada a recentemente criada Guarda Nacional Republicana. Houve mortos entre os trabalhadores e as sedes dos sindicatos foram fechadas.

Em Lisboa, a Comissão Executiva da Conferência Sindical (embrião da futura central sindical), declara greve geral de solidariedade. A paralisação alarga-se à Margem Sul e na Moita foi morto o administrador do concelho.

O Governo republicano mandou encerrar a Casa Sindical em Lisboa, na Rua do Século. Aqui foram presos 700 dirigentes que, enquanto eram levados para o navio «Pêro de Alenquer», ancorado no Tejo, cantavam a Internacional.

 

(A partir de «Greves gerais na história de Portugal», em www.fiequimetal.pt)



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