«Convergências» e unidade

Ângelo Alves

O «Con­gresso De­mo­crá­tico das Al­ter­na­tivas» con­firmou as dis­cor­dân­cias e dis­tan­ci­a­mentos as­su­midos pelo PCP aquando do seu anúncio. A sua pre­pa­ração, o que lá foi dito, e o que sobre ele dis­seram os seus or­ga­ni­za­dores, con­firmou uma visão sec­tária, tendo sido ten­tada, mais uma vez, e pelos mais va­ri­ados meios, a mar­gi­na­li­zação do PCP re­me­tendo-o para a trin­cheira do sec­ta­rismo e do imo­bi­lismo face à pro­cla­mada «uni­dade».

Mas, ta­ci­tismos à parte, im­porta ir ao que in­te­ressa: aos con­teúdos. Se nos dis­cursos das «es­trelas» foi pa­tente uma linha po­lí­tica que, apa­ren­te­mente er­rá­tica e in­de­fi­nida, é no fundo ca­rac­te­ri­zada, em as­pectos fun­da­men­tais, por uma ní­tida co­lagem à linha po­lí­tica do PS, a lei­tura da sua de­cla­ração final não deixa grandes dú­vidas de que uma real al­ter­na­tiva, pa­trió­tica, de es­querda, pro­gres­sista e de rup­tura com a po­lí­tica de di­reita não passa cer­ta­mente por uma ne­bu­losa de con­ceitos e equi­lí­brios que pouco ou nada trazem de novo à ne­ces­sária cons­trução de uma ampla frente so­cial que, por via da luta de massas e da al­te­ração da cor­re­lação de forças, possa impor uma al­ter­na­tiva po­lí­tica ver­da­dei­ra­mente digna desse nome. Total bran­que­a­mento do papel do PS ao longo dos úl­timos 36 anos; fuga à questão nodal da inequí­voca re­jeição do pacto de agressão; uma visão sobre a UE e sobre o euro que não ques­tiona o edi­fício ne­o­li­beral, mi­li­ta­rista e fe­de­ra­lista; uma visão de Por­tugal no Mundo que nada diz sobre a ne­ces­si­dade da dis­so­lução da NATO e da des­vin­cu­lação de Por­tugal das suas es­tru­turas; uma visão da eco­nomia que se li­mita a exigir a «sus­pensão dos pro­cessos de pri­va­ti­zação», são apenas al­guns dos exem­plos da «con­ver­gência» que por ali passou.

Neste con­gresso falou-se muito de ma­ni­fes­ta­ções, mas olhando para o seu con­teúdo e para os seus ob­jec­tivos – os pro­cla­mados e os efec­ti­va­mente al­can­çados – fica uma ideia clara: aquele não é o ca­minho da uni­dade que o povo nas ruas está a cons­truir. A uni­dade faz-se so­mando e não ex­cluindo, faz-se com cla­reza e não com in­de­fi­ni­ções. É bom que aqueles que ci­cli­ca­mente usam a «con­ver­gência» para a sua pró­pria pro­moção per­cebam, de uma vez por todas, que a uni­dade não se de­creta, cons­trói-se na luta (e não por cima dela) e é na luta que é cons­tan­te­mente tes­tada.



Mais artigos de: Opinião

O PS no sítio do costume

Seguro e o PS não resistiram à extenuante tarefa de, durante uma longa e interminável semana, fingirem-se de oposição ao rumo de desastre que pela mãos do Governo, e as suas próprias, desgraça a vida dos portugueses e afunda o País. Não fosse o diabo...

O desespero é perigoso

Do debate das moções de censura apresentadas na AR na semana passada há muita coisa interessante a reter. Mas o mais relevante é certamente o desespero e a cabeça perdida que o Governo e as bancadas que o apoiam manifestaram. Do cinismo salazarento com que Vítor Gaspar se...

Viva a Venezuela

A vitória de Hugo Chávez nas eleições presidenciais venezuelanas é uma excelente – mas não inesperada – notícia. Confirma o curso da revolução bolivariana. Dá novo ímpeto aos processos progressistas na América Latina, depois...

Privatização da <i>CGD</i><br>Um saque ao País

De­pois da de­cisão de avançar com a pri­va­ti­zação dos com­po­nentes do grupo li­gadas à ac­ti­vi­dade se­gu­ra­dora (34% da ac­ti­vi­dade se­gu­ra­dora em Por­tugal) e da saúde (HPP), di­nheiro que vai servir para a re­ca­pi­ta­li­zação do banco, o Go­verno do PSD/​CDS-PP vem agora ad­mitir, pela voz de um dos «ig­no­rantes» mais bem pagos do País, An­tónio Borges, a pri­va­ti­zação do único banco co­mer­cial que ainda está nas mãos do Es­tado.

É impossível

Este Governo não tem conserto. Desde Passos Coelho aos ministros, já ninguém se atreve a sair à rua sem estar tudo previamente esterilizado de cidadãos. E compreende-se: nos últimos tempos não houve local onde espreitasse um ministro, que não se transformasse numa...