Luta contra a pobreza

Ilda Figueiredo

As­si­nalou-se, na se­mana pas­sada, o Dia In­ter­na­ci­onal para a Er­ra­di­cação da po­breza – 17 de Ou­tubro. Vive-se o maior agra­va­mento da po­breza após a re­vo­lução de Abril de 1974, mar­cado pela exis­tência de mi­lhões de por­tu­gueses e suas fa­mí­lias em risco de po­breza e de cres­ci­mento do nú­mero dos que se en­con­tram em si­tu­ação de po­breza ab­so­luta, en­quanto se mantêm ele­vados lu­cros de grupos eco­nó­micos e fi­nan­ceiros.

O au­mento da po­breza e ex­clusão so­cial está di­rec­ta­mente li­gado ao agra­va­mento do de­sem­prego, ao tra­balho pre­cário e mal pago, aos baixos sa­lá­rios e pen­sões, aos bru­tais cortes em im­por­tantes pres­ta­ções e apoios so­ciais, ao ataque às fun­ções so­ciais do Es­tado pre­vistas na Cons­ti­tuição da Re­pú­blica Por­tu­guesa, a que querem juntar uma nova agressão fiscal, so­bre­tudo através do IRS.

As graves con­sequên­cias das po­lí­ticas eco­nó­micas e fi­nan­ceiras estão a afectar for­te­mente a frágil eco­nomia do País, o que as­sume as­pectos ainda mais dra­má­ticos nal­gumas re­giões, como acon­tece no dis­trito do Porto, com au­mento do de­sem­prego para ní­veis in­su­por­tá­veis, com taxas su­pe­ri­ores a cerca de cinco pontos per­cen­tuais da média na­ci­onal, ul­tra­pas­sando os 20%.

Com as enormes re­du­ções nas pres­ta­ções e apoios so­ciais na Se­gu­rança So­cial, na saúde e no en­sino, está-se a tornar in­su­por­tável a vida de mi­lhares de fa­mí­lias de mais baixos ren­di­mentos, con­fron­tadas com a falta de meios mí­nimos de sub­sis­tência, e que, ex­cluídas de aceder a apoios so­ciais, vão en­gros­sando as filas de pe­didos de ajuda so­cial (ali­men­tação, roupa, li­vros) a ins­ti­tui­ções que, por sua vez, já ul­tra­pas­saram os seus li­mites.

São par­ti­cu­lar­mente in­justos os ata­ques bru­tais a pres­ta­ções so­ciais, como o abono de fa­mília, o sub­sídio de de­sem­prego e sub­sídio so­cial de de­sem­prego, o sub­sídio so­cial de ma­ter­ni­dade e pa­ter­ni­dade, o sub­sídio de do­ença e, re­cen­te­mente, a re­dução e al­te­ração das con­di­ções de atri­buição do ren­di­mento so­cial de in­serção (RSI), a que se pode adi­ci­onar, a curto prazo, um corte brutal nos sa­lá­rios, nas pen­sões e re­formas, no sub­sídio de de­sem­prego e no sub­sídio de do­ença, se for por di­ante a pro­posta do Or­ça­mento do Es­tado para 2013.

Agravam-se os dramas so­ciais e cresce ex­po­nen­ci­al­mente a po­breza, com os cortes de água, de luz, or­dens de des­pejo, o que pode au­mentar as­sus­ta­do­ra­mente o nú­mero dos «sem abrigo», a di­fi­cul­dade de ali­men­tação, o aban­dono de cri­anças do sis­tema edu­ca­tivo e cre­ches, e de idosos de equi­pa­mentos so­ciais, por falta de di­nheiro das fa­mí­lias para pagar a sua con­tri­buição e por re­cusa da Se­gu­rança So­cial em con­ti­nuar a dar apoios. Acresce a falta de me­di­cação e de apoio mé­dico por não existir di­nheiro para com­prar me­di­ca­mentos ou para trans­portes, onde também os preços e as taxas e ta­rifas su­biram, como ou­vimos re­pe­tidas vezes no Man­dato Aberto que re­a­li­zámos no dis­trito do Porto ou no Fórum das pes­soas em si­tu­ação de po­breza e/​ou ex­clusão so­cial que a Rede Eu­ro­peia de Luta Contra a Po­breza em Por­tugal re­a­lizou em Aveiro, onde par­ti­cipei em re­pre­sen­tação do PCP.

Até as can­tinas so­ciais, apon­tadas pelo Go­verno como a al­ter­na­tiva aos cortes em di­reitos so­ciais e à gestão das si­tu­a­ções ex­tremas de po­breza, re­gistam listas enormes de pe­didos de pes­soas que já não con­se­guem apoio por ca­rência dos equi­pa­mentos e do res­pec­tivo apoio so­cial. Como já foi de­nun­ciado pelo PCP, esta é uma si­tu­ação que é ainda agra­vada pelo atraso no pa­ga­mento às IPSS que as­se­guram este ser­viço no âm­bito do pro­pa­gan­deado Pro­grama de Emer­gência Ali­mentar, da Rede So­li­dária de Can­tinas So­ciais.

Re­giste-se que, com a nova le­gis­lação sobre o RSI, não só o valor da pres­tação so­cial baixou, che­gando a atingir cerca de 35% de quebra de ren­di­mentos de al­gumas fa­mí­lias, como tornou o pro­cesso muito bu­ro­cra­ti­zado e dis­pen­dioso, in­cen­ti­vando a de­sis­tência.

Com a ge­ne­ra­li­zada di­mi­nuição de ren­di­mentos dos agre­gados fa­mi­li­ares e o au­mento do nú­mero de ca­sais de­sem­pre­gados, este ce­nário ten­derá a agravar-se, se não houver um plano de emer­gência para lhe fazer frente, como re­cen­te­mente propôs o PCP no Porto, dis­trito onde se situa cerca de um terço dos be­ne­fi­ciá­rios de RSI.

Além de se re­clamar a ne­ces­si­dade de uma rup­tura com este ca­minho de de­sastre e ruína, que impõe a re­jeição do pacto de agressão e das po­lí­ticas de di­reita, exige-se me­didas de emer­gência face à si­tu­ação de ex­plosão so­cial imi­nente, como se afirma na Re­so­lução sobre o com­bate à po­breza, que o PCP apre­sentou re­cen­te­mente na As­sem­bleia da Re­pú­blica, para que se pro­ceda, de forma ur­gente, ao re­cen­se­a­mento de toda esta dra­má­tica si­tu­ação, para atender de ime­diato aos casos mais ur­gentes e evitar uma au­tên­tica tra­gédia so­cial.



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