Brevíssima nota de ira e combate

O km 27

Gisela da Conceição

Apresento-me: sou uma contribuinte. Não tenho nome, nem idade, nem história, nem substância, nem espessura, nem passado, nem futuro. Sou uma contribuinte. Não sei se este estatuto me confere identidade ou se também já a perdi. Mas não, ah não, o sentido crítico e a determinação para a luta não enfraqueceram, ah não. Antes se ampliaram, ministro Gaspar.

Fui informada, através de uma pseudo-metáfora de inaudita e requintada crueldade, que resido no km 27 de uma maratona/tortura, sem fim à vista, sem carro de apoio, sem, ao menos, um aguadeiro caridoso. Km 27. Noves fora nada. Nada. O vácuo de um pensamento débil e insensível (fruto de esmerada e caríssima educação) que se dedica a flores de retórica e a espinhos de estilo, enquanto os contribuintes, em trabalhos forçados na fantástica criação da maratona, tentam, no km 27, aliviar as chagas dos pés.

Basta!

Em tempo: a RTP 1 está de parabéns. Não só transmitiu, sem sombra de crítica ou ironia, um simulacro iníquo de pensamento, como traçou, a régua e esquadro, com rigor subserviente, o km 27.

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Gaspar dixit

«Nós em Portugal temos uma maravilhosa tradição de maratona e por isso sabemos o que significa correr e triunfar na maratona. Ora quando estamos a 2/3 da maratona estamos por volta do 27 km. E como sabem, os corredores de maratona em geral não desistem no 27km. Desistem entre o 30 e o 35km».

«Uma maratona torna-se cada vez mais difícil e os atletas têm os seus maiores desafios já na fase final da maratona. É isso que acontece com um programa de ajustamento. A parte final é particularmente difícil e como numa maratona é preciso ter treino, disciplinam persistência, força de vontade, vontade de vencer. A maratona é um desforço individual, o ajustamento é um processo colectivo. Precisamos de fazer isto todos juntos».

«O nosso grande desafio é mostrar em Portugal o que é possível, quais são as funções do Estado que são prioritárias, quais as funções do Estado financiáveis, qual o custo que está associado a essas funções do Estado».

«O sistema político português não foi capaz até hoje de apresentar uma associação entre as funções sociais que são fundamentais (educação, saúde, protecção social) e os respectivos custos».

«É preciso adequar as funções àquilo que a sociedade portuguesa e o sistema político português são capazes de forma sustentável financiar».

«A verdadeira carga fiscal é determinada pela despesa pública. A despesa pública significa impostos hoje ou impostos amanhã. Se achamos que hoje, em 2013, têm um nível excessivo então importa trabalhar com afinco para reduzir de forma permanente e estrutural a despesa pública de modo a que no médio prazo a carga fiscal possa ser substancialmente menor».

(Declarações de Vítor Gaspar nas jornadas parlamentares PSD/CDS, a 26 de Outubro)

 



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