Falácias federalistas

Pedro Guerreiro

Ofen­siva contra os di­reitos tem na UE um dos seus prin­ci­pais ins­tru­mentos


Perante o au­mento da re­jeição e cons­ci­ência dos in­te­resses que a União Eu­ro­peia efec­ti­va­mente re­pre­senta, é in­ten­si­fi­cada a ofen­siva ide­o­ló­gica onde se «mar­tela» até à exaustão a falsa ideia da «ine­vi­ta­bi­li­dade» do pro­cesso de in­te­gração ca­pi­ta­lista eu­ropeu – a União Eu­ro­peia – e seu ainda maior apro­fun­da­mento.

Neste quadro, um dos as­pectos mais in­ten­sa­mente com­ba­tidos e ilu­didos é a im­por­tância da so­be­rania na­ci­onal, no­me­a­da­mente, como con­dição es­sen­cial para a rup­tura com a União Eu­ro­peia (da ex­plo­ração e da con­cen­tração da ri­queza, do de­sem­prego e da po­breza, das de­si­gual­dades, das dis­pa­ri­dades e da di­ver­gência, do do­mínio e da sub­ser­vi­ência, da in­ge­rência e da guerra) e para a cons­trução de uma al­ter­na­tiva de­mo­crá­tica, pro­gres­sista e de paz na Eu­ropa.

É cada vez mais evi­dente que a ofen­siva, le­vada a cabo em cada país, contra os di­reitos e as con­quistas la­bo­rais e so­ciais dos tra­ba­lha­dores e dos povos tem na União Eu­ro­peia um dos seus prin­ci­pais ins­tru­mentos, pro­ta­go­nistas e su­portes. Uma ofen­siva que, para se tornar efec­tiva, ne­ces­sa­ri­a­mente co­loca em causa a so­be­rania na­ci­onal, isto é, o exer­cício do di­reito de um povo de­cidir do seu pre­sente e fu­turo e re­sistir à in­ge­rência e à agressão.

 

Tra­tado após tra­tado – de Roma até ao «Tra­tado or­ça­mental» (e seus ime­di­atos pre­de­ces­sores, os ditos «me­mo­randos de en­ten­di­mento») –, o que está em causa é um dito «pro­cesso» ou «cons­trução» na Eu­ropa que visa a im­po­sição de ins­ti­tui­ções e normas su­pra­na­ci­o­nais que a partir do do­mínio po­lí­tico – da co­lo­cação em causa da so­be­rania na­ci­onal – pos­si­bi­litem o do­mínio eco­nó­mico de uns, isto é, das grandes po­tên­cias e dos grandes grupos fi­nan­ceiros e eco­nó­micos, sobre os ou­tros, ou seja, os tra­ba­lha­dores e os povos dos di­fe­rentes países da União Eu­ro­peia, no­me­a­da­mente os da sua «pe­ri­feria». Um maior apro­fun­da­mento desta «in­te­gração» sig­ni­fi­cará, ine­vi­ta­vel­mente, am­pliar os ins­tru­mentos para um maior do­mínio.

Aliás, como a evo­lução da in­te­gração ca­pi­ta­lista eu­ro­peia com­prova e a re­a­li­dade ac­tual de­monstra, é tanto maior a ten­ta­tiva de con­di­ci­o­na­mento e li­mi­tação do exer­cício da so­be­rania na­ci­onal (com o su­porte da União Eu­ro­peia), quanto mais longe se quer levar a agressão aos di­reitos e con­quistas so­ciais de um povo.

É por isso que a al­ter­na­tiva à União Eu­ro­peia das grandes po­tên­cias e dos grandes grupos fi­nan­ceiros e eco­nó­micos passa ne­ces­sa­ri­a­mente pela rup­tura com todos os eixos cen­trais onde esta se ali­cerça, ou seja, o fe­de­ra­lismo, o ne­o­li­be­ra­lismo e o mi­li­ta­rismo.

 

É uma fa­lácia in­vocar a re­jeição e apelar ao com­bate contra as po­lí­ticas ne­o­li­be­rais (e mi­li­ta­ristas) da União Eu­ro­peia sem co­locar em causa e romper com os ins­tru­mentos e pro­ce­di­mentos ins­ti­tu­ci­o­nais su­pra­na­ci­o­nais através dos quais estas têm vindo a ser im­ple­men­tadas e im­postas.

A afir­mação de um pro­jecto de­mo­crá­tico e de de­sen­vol­vi­mento que, pro­mo­vendo as po­ten­ci­a­li­dades de cada país, dê res­posta às ne­ces­si­dades e as­pi­ra­ções de cada povo, exige, ne­ces­sa­ri­a­mente, a plena afir­mação e exer­cício da so­be­rania na­ci­onal e, con­se­quen­te­mente, a re­jeição das po­lí­ticas fe­de­ra­listas, ne­o­li­be­rais e mi­li­ta­ristas da União Eu­ro­peia.

Uma Eu­ropa (um con­ti­nente) onde se res­peite a de­mo­cracia só será pos­sível no quadro da sal­va­guarda da so­be­rania e da in­de­pen­dência na­ci­onal dos seus di­fe­rentes es­tados, da sua co­o­pe­ração mu­tu­a­mente van­ta­josa e igual­dade de di­reitos. Esta outra Eu­ropa só será pos­sível a partir da rup­tura com o pro­cesso de in­te­gração fe­de­ra­lista, ne­o­li­beral e mi­li­ta­rista eu­ropeu – a União Eu­ro­peia.



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