Os que gerem a fome e produzem a guerra

Jorge Messias

«A partir de me­ados do sé­culo XX avançou a cha­mada 're­vo­lução verde'… O ou­trora agri­cultor livre tornou-se de­pen­dente dos cha­mados pa­cotes tec­no­ló­gicos e das exi­gên­cias dos mer­cados e en­trou em re­cessão... Or­ga­nizou-se o mer­cado da agro-ex­por­tação, con­tro­lada já por apenas 10 grandes mul­ti­na­ci­o­nais… De­pois, a des­re­gu­la­men­tação dos mer­cados de­ter­minou que os in­ves­ti­mentos na agri­cul­tura pro­du­tiva real dessem lugar aos in­ves­ti­mentos fi­nan­ceiros es­pe­cu­la­tivos… Os lu­cros desta nova ca­deia de pro­dutos agro-quí­micos estão con­cen­trados em meia dúzia de mãos...» (Lord Ra­ve­nous, “As en­gre­na­gens da fome mun­dial”, 2012).

«Fala-se muito das con­sequên­cias hu­ma­ni­tá­rias da fome. Mas quem de­nuncia aqueles que ga­nham com a fome?… Isto pre­cisa de ser dito com todas as le­tras: há quem be­ne­ficie da en­gre­nagem que produz a fome!» (Ute Sha­effer, “Deutsch Welle”, 2011).

«A ver­da­deira e prin­cipal an­te­câ­mara do so­ci­a­lismo con­siste na dis­tri­buição cor­recta dos ce­reais e do com­bus­tível, no au­mento da sua ob­tenção, no seu mais ri­go­roso re­gisto e con­trolo por parte dos ope­rá­rios e à es­cala na­ci­onal. Isto, já não é uma 'ta­refa re­vo­lu­ci­o­nária ge­ral' mas, pre­ci­sa­mente, uma ta­refa co­mu­nista, a ta­refa em que os tra­ba­lha­dores e os po­bres devem travar uma ba­talha de­ci­siva com o ca­pi­ta­lismo… Me­rece a pena con­sa­grar todas as forças a esta ba­talha; as suas di­fi­cul­dades são grandes mas grande é, também, a causa pela qual lu­tamos: a abolição da opressão e da ex­plo­ração!» (V.I. Le­nine, “Sobre a Fome, carta aos ope­rá­rios de Pe­tro­grado”, 1918).

Com al­gumas ex­cep­ções, o sis­tema po­lí­tico que ac­tu­al­mente do­mina o mundo é o ne­o­li­beral. O ci­lindro do ne­o­li­be­ra­lismo pa­rece der­rubar mon­ta­nhas e impor às massas a von­tade im­pe­rial dos mo­no­pó­lios. Mas não é assim e nunca assim será. O crime or­ga­ni­zado será der­ro­tado.

O que salta à vista é que o ne­o­ca­pi­ta­lismo nada tem de novo a não ser o re­quinte pós-mo­derno das suas es­tra­té­gias e das redes das suas in­trigas. Quanto ao mais, o novo ca­pi­ta­lismo tem por alvo os ob­jec­tivos que o velho ca­pi­ta­lismo sempre visou: a acu­mu­lação de ca­pi­tais e lu­cros; a con­quista dos po­deres do Es­tado; o alar­ga­mento con­tínuo dos mer­cados e a des­truição da pe­quena con­cor­rência.

Os teó­ricos da Nova Ordem (os il­lu­mi­nati) re­co­nhecem que só um ver­da­deiro ad­ver­sário lhes po­derá im­pedir o avanço e a vi­tória final: a uni­dade de classe entre os tra­ba­lha­dores e os grupos po­pu­lares es­po­li­ados pelo ca­pi­ta­lismo. Contas feitas, se a His­tória de re­pente pa­rasse neste mo­mento, a re­lação de forças seria, ni­ti­da­mente, fa­vo­rável aos im­pe­ri­a­listas. Estes, do­minam o poder po­lí­tico e con­trolam as tec­no­lo­gias, detêm o es­sen­cial da co­mu­ni­cação so­cial e do en­sino, im­põem a sua von­tade através de si­mu­la­ções da jus­tiça. Nunca o ca­pital es­teve tão perto de

fa­bricar o ci­dadão robot, ser­viçal e com­ple­ta­mente ali­e­nado, pronto a sa­cri­ficar-se pelo seu se­nhor. É o sonho an­ces­tral do tra­balho grátis. Para o ca­pi­ta­lista do cume da pi­râ­mide, o tra­balho serve para abas­tecer o ca­pital posto o que, todo o tra­ba­lhador des­ne­ces­sário deve ser des­truído.

Dez ou quinze anos atrás, o homem comum pa­recia viver num berço de oiro. A de­mo­cracia tinha sido uma es­colha ba­fe­jada pela Von­tade Di­vina. Deus e o Ca­pi­ta­lismo eram os grandes ven­ce­dores. Os go­vernos ben­ditos de­ti­nham va­ri­nhas de condão: tudo aquilo em que to­cavam se trans­for­mava em oiro. Pro­vava-se pois, afinal, que os mais ricos eram também os ben­fei­tores da hu­ma­ni­dade: davam aos po­bres aquilo que ti­nham e pe­nho­ravam por amor o que não ti­nham. Se fome ainda hou­vesse, logo as ins­ti­tui­ções ca­ri­ta­tivas da Igreja cor­riam em so­corro do fa­minto.

Em todo o seu es­plendor, a luz da fra­ter­ni­dade bri­lhava «ao fundo do túnel»...

De re­pente, tudo se des­mo­ronou.

Dia após dia, hora após hora, ex­plo­diam os nú­meros do de­sem­prego, das fa­lên­cias, da mi­séria e da fome. Os go­vernos de­mo­crá­ticos ras­gavam leis e cons­ti­tui­ções e im­pu­nham a ti­rania aos povos. Nu­vens de es­cân­dalos pú­blicos de­vo­ravam os mitos do bem-estar. Então, o povo per­cebeu que aquilo que tinha visto e ou­vido era men­tira. Os lu­cros eram dos ricos e os po­bres con­ti­nu­avam a pagar os custos. De­mo­cracia… nem vê-la! O go­verno era coito de so­ci­e­dades se­cretas e a Igreja um uni­verso de men­tiras e imo­ra­li­dades. A troika es­tran­geira man­dava no país.

Com todo este amon­toado de sur­presas, com­pre­ende-se a es­tu­pe­facção do povo por­tu­guês. Mas ele já está a des­pertar.

O poder tem de ser de­vol­vido às co­mu­ni­dades e a terra a quem a tra­balha!




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