Os drones não são transparentes!

João Frazão

O re­la­tório re­cente de um Re­lator Es­pe­cial das Na­ções Unidas para a Pro­moção dos Di­reitos Hu­manos na Luta Contra o Ter­ro­rismo, que con­clui que «o nú­mero de civis mortos em ata­ques com drones norte-ame­ri­canos é muito mais ele­vado do que as es­ti­ma­tivas ofi­ciais e de­verá ser muito su­pe­rior na re­a­li­dade, de­vido à falta de trans­pa­rência», tem tanto de cho­cante como de re­ve­lador.

Cho­cante, porque o ân­gulo de abor­dagem não é o das mortes de «pelo menos 400 civis, e ou­tras 200 pes­soas, pro­va­vel­mente não com­ba­tentes», apenas no Pa­quistão, mas o facto de não se saber, com toda a «trans­pa­rência», quantas são.

Cho­cante por não con­denar a acção cri­mi­nosa do im­pe­ri­a­lismo, e a su­ces­siva cri­ação e uso sem con­trolo de má­quinas de matar seres hu­manos, como se o facto de eles nos di­zerem, à pos­te­riori, que ma­taram mais uns mi­lhares de ino­centes, na vo­ragem de se apo­de­rarem de todas as ri­quezas do pla­neta, le­gi­ti­masse as mortes de mu­lheres, cri­anças, ho­mens, que apenas querem viver li­vre­mente as suas vidas.

Cho­cante ainda porque não se as­si­nala o atro­pelo ao di­reito in­ter­na­ci­onal, que os EUA, o Reino Unido e Is­rael pra­ticam di­a­ri­a­mente, neste caso com a uti­li­zação de aviões não tri­pu­lados, in­va­dindo o es­paço aéreo de países so­be­ranos para, sem qual­quer de­cisão ju­di­cial, as­sas­sinar mi­lhares de pes­soas.

Re­ve­lador porque, numa ati­tude de ina­cei­tável sub­missão ao poder do im­pe­ri­a­lismo, o Re­lator pede ao Go­verno dos EUA, que des­clas­si­fique, «na me­dida do pos­sível», as in­for­ma­ções sobre estas ope­ra­ções, acei­tando, na prá­tica, estas ac­ções com­ple­ta­mente ile­gí­timas, ad­vo­gando que devem ser os que as­sas­sinam a sangue frio a in­ves­tigar esses crimes.

Re­ve­lador ao de­fender que o uso de drones em con­flitos ar­mados pode «re­duzir o risco de ví­timas civis», con­si­de­ração que qual­quer um dos três países agra­dece e que per­mitiu à porta-voz dos EUA, afirmar que em qual­quer ataque pro­curam «ter quase a cer­teza ab­so­luta, de que ne­nhum civil será morto ou fe­rido», o que, na sua prá­tica ter­ro­rista, sig­ni­fica dis­parar pri­meiro e per­guntar de­pois.

Já se sabia que os drones são si­len­ci­osos, al­ta­mente efi­cazes e di­fi­cil­mente de­tec­tá­veis nos ra­dares. Só lhes falta mesmo ser trans­pa­rentes.




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