3 e 4 de Janeiro, no Forte de Peniche

Fuga vitoriosa rumo a Abril

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En­cer­rando as co­me­mo­ra­ções do cen­te­nário do nas­ci­mento de Álvaro Cu­nhal e dando início às ce­le­bra­ções dos 40 anos da Re­vo­lução de Abril, tem lugar no Forte de Pe­niche, nos dias 3 e 4 de Ja­neiro, um con­junto de ini­ci­a­tivas evo­ca­tivas da his­tó­rica e he­róica fuga pro­ta­go­ni­zada por Álvaro Cu­nhal e ou­tros nove di­ri­gentes e qua­dros do PCP. Uma fuga que, pelas suas re­per­cus­sões ime­di­atas e de longo prazo – na or­ga­ni­zação e na linha po­lí­tica do Par­tido, por um lado, e na di­na­mi­zação e in­ten­si­fi­cação da luta de massas, por outro – é jus­ta­mente con­si­de­rada no pró­prio lema desta evo­cação como uma «fuga vi­to­riosa rumo a Abril».

No dia 3, pelas 16 horas, é inau­gu­rada no Salão Nobre do Forte de Pe­niche a ex­po­sição in­ti­tu­lada «Forte de Pe­niche, local de re­pressão, re­sis­tência e luta», e às 18h30, junto às mu­ra­lhas, tem lugar uma re­cri­ação his­tó­rica da fuga, pela As­so­ci­ação Es­pe­le­o­ló­gica de Óbidos e por um grupo de te­atro di­ri­gido por Fer­nanda Lapa. Ha­verá ainda um mo­mento de de­cla­mação de po­emas de João Monge, pela ac­triz Maria João Luís. Estas são ini­ci­a­tivas de âm­bito local às quais a Co­missão das Co­me­mo­ra­ções do Cen­te­nário de Álvaro Cu­nhal se as­so­ciou.

No sá­bado, 4, às 15 horas, re­a­liza-se um co­mício em que par­ti­cipa o Se­cre­tário-geral do PCP, Je­ró­nimo de Sousa.

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Forte de Pe­niche foi prisão po­lí­tica du­rante 30 anos
Local de re­pressão, de re­sis­tência e de luta

O Forte de Pe­niche foi uma das prin­ci­pais pri­sões po­lí­ticas do fas­cismo, tendo tido essa fi­na­li­dade entre 1934 e Abril de 1974. Aí es­ti­veram en­car­ce­rados cerca de 2500 presos, que no seu con­junto cum­priram de­zenas de mi­lhares de anos de prisão. Al­guns pas­saram quase 20 anos nesta ca­deia. O seu único crime foi lu­tarem por um Por­tugal li­berto da opressão, da ex­plo­ração e do obs­cu­ran­tismo fas­cistas.

Ge­rida pela PVDE/​PIDE, a prisão po­lí­tica do Forte de Pe­niche foi um sím­bolo par­ti­cu­lar­mente odioso da re­pressão fas­cista. O re­gime pri­si­onal ins­ta­lado foi mar­cado pela ar­bi­tra­ri­e­dade como norma, por um re­gime ali­mentar de­fi­ci­ente, por ser­viços de saúde quase ine­xis­tentes e pelas cons­tantes agres­sões fí­sicas e psi­co­ló­gicas. As res­tri­ções à lei­tura eram imensas e ab­surdas, a cor­res­pon­dência for­te­mente con­di­ci­o­nada (por vezes os cortes eram to­tais) e as vi­sitas das fa­mí­lias, quando au­to­ri­zadas, ti­nham lugar em par­la­tó­rios, de di­fícil au­dição e sempre sob aper­tada vi­gi­lância po­li­cial.

O pró­prio re­gu­la­mento da ca­deia es­ta­be­lecia como regra para a ac­tu­ação dos car­ce­reiros a vi­gi­lância cons­tante sobre os presos. Pior do que isto era a ac­tu­ação dos guardas que, com al­gumas ex­cep­ções, se com­por­tavam como ver­da­deiros fa­cí­noras. Aliás, os guardas que não se mos­trassem par­ti­cu­lar­mente ze­losos na exe­cução das or­dens eram de­nun­ci­ados e po­diam ser afas­tados do ser­viço.

A PIDE de­tinha não apenas um poder ab­so­luto sobre as ca­deias como pro­cu­rava con­trolar tudo o que se pas­sava em seu redor: por exemplo, vi­giava ri­go­ro­sa­mente as festas po­pu­lares, re­gis­tava o nome dos fa­mi­li­ares e de ou­tras pes­soas que vi­si­tavam os presos, bem como as ma­trí­culas dos carros em que se des­lo­cavam. Os lo­cais onde os vi­si­tantes per­noi­tavam e as pes­soas com quem con­ver­savam eram igual­mente pas­sados a pente fino. Em Pe­niche, foram muitos os ci­da­dãos su­jeitos a de­vassas e mesmo presos, par­ti­cu­lar­mente pes­ca­dores.

Romper muros e grades

Com este re­gime pri­si­onal, o fas­cismo vi­sava apenas um ob­jec­tivo: que­brar a von­tade dos presos, le­vando-os a ab­dicar das suas con­vic­ções e a per­derem a von­tade de re­gressar à luta. Se ti­veram, aqui e ali, su­cesso neste seu pro­pó­sito, esta não foi a norma: tal como nou­tras pri­sões, também o Forte de Pe­niche foi um local de cons­tante re­sis­tência e luta: contra a re­pressão e as ar­bi­tra­ri­e­dades dos car­ce­reiros; por me­lhores con­di­ções pri­si­o­nais; em de­fesa da dig­ni­dade e con­dição de preso po­lí­tico. Uma luta que, pelas con­di­ções em que se tra­vava, re­queria uma in­que­bran­tável co­ragem e ab­ne­gação.

Foram grandes marcos da re­sis­tência pri­si­onal, entre ou­tros, as greve de fome de 1950 e 1952, esta úl­tima apoiada por uma ma­ni­fes­tação das fa­mí­lias, a que se jun­taram po­pu­lares de Pe­niche; as lutas de 1960 e 1962, em apoio à cam­panha na­ci­onal e in­ter­na­ci­onal pela am­nistia aos presos po­lí­ticos; as lutas de 1963 e 1964, com le­van­ta­mento de rancho e gritos de todos os presos; a luta de 1970, por me­lhor ali­men­tação e as­sis­tência mé­dica – jor­nadas que, pela di­mensão que atin­giram, obri­garam o fas­cismo a me­lhorar o re­gime pri­si­onal e a re­frear as ar­bi­tra­ri­e­dades.

Estas e ou­tras lutas tra­vadas no in­te­rior das pri­sões só foram pos­sí­veis graças à or­ga­ni­zação dos presos co­mu­nistas. A sua pro­jecção para lá dos muros e das grades deveu-se também à or­ga­ni­zação e à im­prensa do Par­tido, que nunca dei­xaram de de­nun­ciar as con­di­ções pri­si­o­nais e de tes­te­mu­nhar as lutas dos presos. O apa­re­ci­mento da Co­missão Na­ci­onal de So­corro aos Presos Po­lí­ticos e as cam­pa­nhas que di­na­mizou con­tri­buíram de­ter­mi­nan­te­mente para o iso­la­mento in­terno e ex­terno da di­ta­dura.

A po­pu­lação de Pe­niche me­rece, nestas pá­ginas, uma re­fe­rência par­ti­cular. Tanto pelo aco­lhi­mento que deu a mu­lheres, mães e fi­lhos de presos quando estes vi­si­tavam os seus fa­mi­li­ares como pelo apoio e dis­crição com que apoi­aram as fugas. O re­púdio po­pular pelo fas­cismo e pela prisão ficou claro na grande ma­ni­fes­tação re­a­li­zada junto ao Forte nos pri­meiros dias de li­ber­dade, exi­gindo a li­ber­tação in­con­di­ci­onal de todos os presos.

Na pró­xima edição, abor­da­remos mais con­cre­ta­mente a fuga de Pe­niche, a sua pre­pa­ração e re­a­li­zação, bem como as suas con­sequên­cias na in­ten­si­fi­cação da luta de massas, rumo à vi­tória.



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