BES bom, BES mau

Manuel Rodrigues

Perante a es­pe­cu­lação e gestão da­nosa do grupo fi­nan­ceiro que cavou o bu­raco mo­nu­mental do BES, «ali­men­tadas ao longo de anos com a co­ni­vência dos go­vernos e dos su­postos re­gu­la­dores», como re­fere o PCP, de­cidiu o Go­verno, através do Banco de Por­tugal, criar um novo banco a que foi dado, com pompa e cir­cuns­tância, o elu­ci­da­tivo nome de Novo Banco, logo clas­si­fi­cado por ana­listas e co­men­ta­dores ao ser­viço do Go­verno e do ca­pital fi­nan­ceiro de BES bom.

BES bom, dizem eles, porque nele ficam ex­clu­si­va­mente os cré­ditos e os de­pó­sitos, já que os an­tigos ac­ci­o­nistas do BES (o tal que era muito só­lido e sus­ten­tável, como ga­ran­tiam, a pés juntos, ainda há pouco, Go­verno, BdP e PR) com os cor­res­pon­dentes ac­tivos tó­xicos.

De­cidiu o Go­verno, ao mesmo tempo, in­jectar 4,9 mil mi­lhões de euros de fundos pú­blicos no BES bom, ou seja, no Novo Banco, re­cor­rendo ao Fundo de Re­so­lução. Mas como o Fundo de Re­so­lução dispõe de es­cassas cen­tenas de mi­lhões de euros, a res­tante verba (mais de quatro mil mi­lhões), vai o Go­verno buscá-la ao Fundo de Re­ca­pi­ta­li­zação que faz parte do pa­cote da troika, que tão caro tem saído ao bolso dos por­tu­gueses e do País (de­sem­prego, cortes nos sa­lá­rios e pen­sões, na saúde e na edu­cação, au­mento de im­postos, etc.).

Diz o Go­verno que o BES bom não trará custos para o Es­tado, porque a sua venda no fu­turo per­mi­tirá re­a­lizar o di­nheiro pú­blico agora in­ves­tido. Mas não diz que, se a venda não per­mitir re­a­lizar o mon­tante pú­blico agora in­ves­tido (e im­porta não es­quecer que o BPN, onde o Es­tado in­vestiu mais de sete mil mi­lhões de euros, foi ven­dido por es­cassos 40 mi­lhões), lá es­tará a Caixa Geral de De­pó­sitos, ou seja, o erário pú­blico, face à res­pon­sa­bi­li­dade que este banco tem no Fundo de Re­so­lução, para ga­rantir a perda dos pre­ci­osos re­cursos do País.

É ver­dade que, nesta ló­gica ma­ni­queísta do grande ca­pital, há dois BES: o BES bom e o BES mau. Só que, ao con­trário da pro­pa­ganda en­ga­nosa do Go­verno, o BES bom con­ti­nuará a ser o Banco, que, com a mag­nâ­nima ajuda do Es­tado, o grande ca­pital fi­nan­ceiro con­ti­nuará a usar nas suas prá­ticas es­pe­cu­la­tivas e cor­ruptas. E O BES mau, em muitos casos, po­derá sig­ni­ficar a ex­tinção de mi­lhares de postos de tra­balho, a perda de de­pó­sitos e pou­panças de mi­lhares de de­po­si­tantes, a li­qui­dação dos pe­quenos ac­ci­o­nistas (ali­ci­ados e lu­di­bri­ados pela pro­pa­ganda en­ga­nosa), a falta de apoio às pe­quenas e mé­dias em­presas e ao in­ves­ti­mento pú­blico.

Razão tem o PCP ao de­fender a re­cu­pe­ração para o Es­tado do sector fi­nan­ceiro e de ou­tras em­presas e sec­tores es­tra­té­gicos. Este sim, um banco bom.

 



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